O maior teste de um líder empresarial é conduzir sua empresa em tempos de crise. Neste ano de 2002, repetindo o que já ocorrera em 2001, a indústria hoteleira do Brasil viveu um período sombrio. Houve o atentado de 11 de setembro, que reduziu o ímpeto dos viajantes internacionais. Houve a desaceleração da economia internacional e a drástica redução dos gastos de viagem corporativos. Houve, ao mesmo tempo, uma explosão de oferta de novos quartos que fez cair a taxa de ocupação e causou queda de preços. Nesse cenário, poucas foram as empresas do setor que conseguiram crescer e obter bons resultados. A Blue Tree foi uma dessas felizes exceções. A empresa criada em 1998 pela empresária Chieko Aoki arrostou os maus ventos e tornou-se a maior administradora nacional de hotéis ? com 20 hotéis, 3.200 funcionários e faturamento projetado em R$ 100 milhões, 19% superior ao de 2001.

 

Enquanto o mercado perdia receita e encolhia, a primeira-dama da hotelaria brasileira ergueu dois novos hotéis e duplicou seu número de hóspedes, atingindo 590 mil. E seus hotéis já existentes firmaram-se como centros de recreação ou convenções de padrão internacional. ?Este ano para nós foi de consolidação?, diz ela. ?Em 2001 abrimos 11 hotéis e tínhamos de fazer com que eles funcionassem de forma adequada.? Em 2003 a empresa tem planos de abrir novas unidades em Londrina, Caxias do Sul e Fortaleza, embora a previsão de tempo para a hotelaria continue cinza.

Bonita e delicada, a presidente da Blue Tree Hotels guarda pouca semelhança com as executivas tradicionais. Dizem que ela pode ser dura e exigente e seu currículo sugere que ela deve ser bastante competitiva. Mas ninguém adivinharia isso quando ela se senta com as mãos pousadas sobre os joelhos e fala modestamente sobre seu trabalho. ?Não acho que sou dona. Eu só tenho a oportunidade de administrar?, afirma com um sorriso. Que ninguém se iluda: embora seja um poço de gentileza, essa senhora elegante controla cada detalhe do seu negócio, é grandemente admirada em seu meio e triunfou num ambiente totalmente masculino (para não dizer numa empresa de origem japonesa…) com talento e determinação. Sozinhos, os belos olhos e as maneiras suaves não a teriam levado tão longe. Nascida no Japão, Chieko veio para o Brasil aos 6 anos e sua família radicou-se em Bastos, no interior de São Paulo, onde havia uma larga comunidade de japoneses. A garota imigrante de 1,50 m de altura formou-se em Direito pela USP, fez pós-graduação em Administração no Japão e especialização em hotelaria nos Estados Unidos. Estudou inglês, japonês e espanhol e fala os três idiomas fluentemente. Mas sua vida só mudou radicalmente na década de 70, quando trabalhava como secretária-bilingue na Ford e conheceu o empresário japonês John Aoki. Eles se casaram e ele a
introduziu no ramo da hotelaria em 1982, como diretora do Caesar Park de São Paulo.

Aprendizado. Em quatro anos Chieko galgou a presidência da companhia e passou a acumular em 1986 também a direção de outro investimento da família Aoki ? a tradicional companhia hoteleira Wedstin Hotels & Resorts, dos Estados Unidos, dona de uma rede de mais de 70 hotéis em todo o mundo. Nessa posição Chieki atravessou uma década de muitas viagens e intenso aprendizado. Ela culminou em 1998, depois da venda da marca Caesar Park para o grupo mexicano Posadas, na criação da Blue Tree Hotels. Além de ser um nome simples e de apelo internacional, Blue Tree é também a tradução para o inglês da palavra Aoki — árvore azul, em japonês.

 

?Chieko Aoki é uma grande empreendedora. Sua empresa está se tornando uma referência brasileira em hotéis sofisticados?, afirma Alberto Ribeiro, diretor de desenvolvimento da Accor, a multinacional que lidera o ranking das administradoras hoteleiras no País. Outro fortíssimo empresário do ramo ? Gregory Ryan, da administradora Atlântica, dona de uma rede de 31 hotéis no Brasil ? também não esconde a admiração pela concorrente. ?Ela é excelente operadora e seus hotéis têm muita identidade?, diz Ryan. Embora as jornadas diárias de 16 horas a levem a participar ativamente de todas as etapas da gestão do seu negócio, Chieko tem visível predileção pelos detalhes da hotelaria prática, sobretudo o atendimento. Hotelaria é gente, não prédio?, diz ela. ?Quero que os nossos hotéis se destaquem pela hospitalidade e atenção.? Isso significa, por exemplo, renovar o chá na xícara do hóspede antes que esfrie ou levar uma aspirina ao quarto do recém-chegado que se queixou de dor de cabeça na portaria. Para firmar esse tipo de conceito entre seus funcionários a presidente do Blue Tree participa pessoalmente dos treinamentos de pessoal, em todos os níveis. ?Se for preciso eu ensino a arrumadeira a fazer a cama?, garante, embora seja difícil imaginá-la estendendo lençóis num tailler cor-de-rosa da Chanel como os que usa diariamente.

 

Para entender a obsessão dessa empresária pela qualidade dos serviços, é preciso ter em mente a peculiaridade do seu negócio. Chieko não é dona dos hotéis, mas simplesmente os administra para investidores privados que se cotizam para erguer os edifícios. É uma relação de confiança baseada na eficiência, na taxa de retorno e no cuidado com o patrimônio físico dos investidores. Um hotel como o Blue Tree de Brasília, por exemplo, projetado pelo arquiteto Ruy Otake, começa a ser modelado como negócio quatro anos antes de o primeiro hóspede fazer o check-in. Chieko não pode garantir aos investidores as condições gerais do mercado quando isso ocorrer, mas precisa assegurar que um ambiente elegante e acolhedor, aliado ao serviço impecável, tragam o hóspede de volta na próxima viagem. Como opera na faixa de cima do mercado, oferecendo hotéis e resorts de quatro e cinco estrelas para executivos e suas famílias, a Blue Tree tem de ser especialmente cuidadosa ? essa é a porção do mercado turístico mais atingida pela crise econômica, com dramáticas reduções nas taxas de ocupação e no valor das diárias. Chieko conta que sua ocupação média manteve-se em torno de 60% e suas diárias foram reduzidas em 10%, metade da redução do mercado. ?Nós estamos ocupando o espaço de quem não se atualizou?, diz ela.

Dias atrás, ao descer do heliponto do Blue Tree Park, em São Paulo, onde estivera posando para a foto que abre esta reportagem, a presidente do Blue Tree foi surpreendida no elevador por uma jovem que fez questão de elogiá-la. ?A senhora para mim é um exemplo de empresária?, disse a moça. A senhora Aoki, como a ela se referem seus funcionários, agradeceu timidamente e esquivou-se rápido. Mais tarde, usou o exemplo para justificar seu constrangimento em usar os serviços dos hotéis que administra. ?Eu acabo atrapalhando os funcionários?, diz ela. Poucas pessoas na sua posição diriam o mesmo. Por outro lado, poucas pessoas nessa posição ainda consideram a ?humildade e a gentileza? como as principais virtudes do seu próprio negócio. Chikeo Aoki considera. Talvez por isso a sua árvore azul tenha crescido e dado bons frutos este ano.