Pronto, vamos imaginar aquele dia mágico no qual a comunidade médico-científica, com a classe política, decidiram que é possível voltar a trabalhar. Fogos! Festa! Comemorações! A vida corporativa vai voltar ao normal. Eba!

Só que não. O desenho da nossa jornada cotidiana de casa-transporte-trabalho-almoço-trabalho-transporte-casa foi desenhado pré-Covid.

E, acredite, tudo indica que voltaremos a trabalhar num futuro próximo (me recuso a escrever a expressão “novo futuro”), no qual nem todos estarão vacinados e, portanto, passíveis de contrair o vírus.

E agora? Vamos mudar essa jornada, ok. A casa, a gente agora conhece bem mais. O transporte, a gente controla até a página 3 (dependemos do Estado para ampliação de ciclovias etc.). Mas uma coisa a gente pode, deve e precisa mudar: o nosso conceito de escritório. Na vida “AC” (antes da Covid-19), as tendências eram os escritórios do Vale do Silício, com muitas áreas comuns, cada um senta onde quer (hotdesking), ambientes polivalentes e áreas abertas de convívio e de circulação.

É, não vai dar. A guinada é para o outro lado. Não vou entrar também no debate óbvio da tendência do home office – é um caminho sem volta. A provocação que faço aqui é sobre o escritório “antigo”.

O que fazer com ele? Como reorganizar aquela fila depois do almoço pra subir no elevador lindo, de pé-direito duplo, em que cabiam 18 pessoas e agora vão caber seis, cada um no seu quadrado, com um caminho de saída marcado no chão dando no meio da porta? E como reimplantar um andar cheio de baias coletivas em prédios de vidro (sem janelas para abrir)? E o almoço? E se um colega tossir? E se um voltou de NY agora? E se alguém aparecer no dia seguinte ao qual faltou reclamando de febre?

Voltar já mexe com o emocional das pessoas. A gente vê nos nossos conhecidos, uns mais radicais com cuidados e outros mais relaxados. Como juntar esse povo todo com um viés colaborativo de performance sob um mesmo teto? O ser humano sofre com o home office, mas ele se acostuma, ele se adapta e se vira. Grande parte não vai querer voltar. E muitos com razão. Como fazer um protocolo de retorno às atividades e uma campanha interna motivacional tão boa que faça com que o funcionário queira, de verdade, voltar à jornada “AC”? Nos países cuja abertura gradual começou, as taxas de retorno são baixíssimas (os ambientes fabris puxam a média pra cima, mas ambientes corporativos vêm tendo dificuldades reais).

Será que esse modelo acabou? A arquitetura, o design de interiores e, principalmente, as campanhas de endomarketing vão ter que andar juntos de maneira inédita. Essa é uma oportunidade única de construir um ambiente de trabalho novo, uma empresa com um espaço físico que ouça mais e dite menos, uma preocupação nova com essa jornada de cada um, um modelo mais atento às necessidades reais das pessoas – que talvez um dia evolua para uma nova forma do trabalhar.

Os times terão que aprender a jogar juntos sob novas regras de impedimento que serão escritas por um juiz (ciência), que as mudará com a partida rolando. O campo nunca mais será o mesmo: quando se troca o campo, muda-se o jogo pra sempre.

Nesta altura do campeonato, no jogo corporativo, quem der o pontapé inicial da mudança logo e fizer uma boa preleção do retorno pro segundo tempo estará marcando um golaço.

Só não vai dar pra correr pro abraço, pelo menos por enquanto.

* Leonardo Martinez é sócio da V3A Comunicação