Quando decidiu abrir sua primeira padaria na capital paulista, no início da década de 1990, o francês Olivier Anquier, filho e neto de padeiros, reproduziu as receitas com as quais estava familiarizado desde o berço. Logo percebeu que precisaria de paciência para educar o consumidor local. Ainda não havia acesso à variedade de ingredientes e de técnicas que se difundiram desde então, do trigo sarraceno à fermentação natural, au levain. As vitrines das padarias exibiam variações do mesmo tema. A hiperinflação limitava as viagens da classe média ao exterior e, por tabela, pouca gente conhecia as maravilhas das boulangeries da França. Por isso, as primeiras experiências de Anquier como padeiro em São Paulo foram frustrantes. “Antes de inaugurar a Pain de France, testei vários fornecedores de farinha para avaliar a qualidade”, afirmou. “A cada saco que eu recebia, preparava uma fornada de pão e distribuía entre os vizinhos do meu prédio. Muitos vinham reclamar, dizendo que o pão estava estragado, que a casca era dura e que não dava para comer.”

Apesar das críticas, ele persistiu com a ideia de abrir a cabeça e o paladar do brasileiro. Começava ali uma história de sucesso empresarial que se desdobrou em diferentes áreas de negócio: fornecimento para a rede de supermercados Pão de Açúcar, apresentação de programas de TV, restaurantes, consultoria e o e-commerce Olivier Anquier Boulangerie e Delivery. Alguns deram certo, outros ficaram pelo caminho. Agora, o padeiro, empreendedor e chef está tirando do forno duas novas receitas. Uma é a minipadaria Mundo Pão do Olivier, concebida para funcionar em formato de licenciamento e cuja primeira unidade foi inaugurada em junho no Conjunto Nacional, na Avenida Paulista. Outra está prevista para abrir ainda este mês sob o nome Esther Eventos, com capacidade para até 200 pessoas em pé e espaço para atividades com mesas. Será vizinho ao restaurante Esther Rooftop, na Praça da República, instalado na cobertura em que Olivier e a mulher, Adriana, viveram por anos.

ROOFTOP Vista da cobertura do Edifício Esther, na Praça da República, onde Anquier mantém um restaurante que agora será complementado por um salão de eventos. (Crédito:Divulgação)

MARCO MODERNISTA Construído na década de 1930 e considerado primeiro prédio da arquitetura moderna em São Paulo, o Edifício Esther estava em avançado estágio de decadência quando Anquier comprou uma das coberturas, há 16 anos. Dois meses depois, recebeu a informação de que o edifício seria desapropriado. “O quê? Peguei meu megafone, chamei a mídia e fiz um barulho para salvar o prédio”, disse Anquier. Ele já era bem conhecido por suas passagens como apresentador de programas na Globo (com boletins gravados antes e durante a Copa de 1998, na França), e no canal pago GNT, que por duas décadas exibiu o Diário do Olivier.

A estratégia deu certo e a desapropriação foi revogada. Seguiu-se uma valorização acelerada dos imóveis, com artistas e arquitetos querendo morar ou abrir escritórios ali. Há seis anos, Anquier decidiu fazer da cobertura em que vivia um restaurante. E, agora, dobra a aposta no endereço. “O Esther sempre foi muito solicitado para sediar eventos. Mas eu nunca quis fechar a casa e barrar o cliente que vem de longe”, afirmou. Quando os proprietários da cobertura vizinha decidiram se mudar de lá, ele viu a oportunidade de abrir um salão para celebrações corporativas e sociais. A inauguração está prevista para os próximos dias.

MINIPADARIA Produtos servidos no Mundo Pão, desenhado para funcionar sob licenciamento de marca e cuja primeira unidade foi inaugurada em junho no Conjunto Nacional. (Crédito:Divulgação)

“Paralelamente a isso apareceu o Conjunto Nacional”, disse Anquier, referindo-se e outro edifício tradicional de São Paulo, inaugurado na década de 1950 na Avenida Paulista e também de uso misto. Segundo ele, a administradora o procurou com um convite para que montasse um café com seus pães e doces no corredor que dá acesso aos elevadores do condomínio. “Fiz uma interpretação do espaço para abrigar o Mundo Pão do Olivier.” O nome já havia sido usado em outro empreendimento, no centro da cidade, que fechou durante a pandemia. A nova unidade serve produtos preparados no ateliê de panificação que Anquier mantém no bairro do Cambuci tanto para atender pedidos on-line quanto as lojas da rede de supermercados Oba, que revendem seus produtos. A operação, porém, é terceirizada.

No comando do Mundo Pão estão Marcone Moraes e Glauber Souza, sócios do bistrô, do café e da loja do Farol Santander, no centro da capital, além de Rafael Ribeiro, que será responsável pela expansão da rede. “Eu decidi nunca mais ter uma padaria cuja operação dependa da minha presença”, afirmou. “Com o Mundo Pão, construímos um conceito que possa ser reproduzido. Eles são os máster licenciados e serão os responsáveis pela expansão da rede.” Segundo Anquier, a procura pela marca tem sido grande, sobretudo em aeroportos. “É preciso escolher bem cada ponto. Não queremos abrir 50 de uma vez e sim ir aos poucos”, disse, relevando a mesma paciência de seus primeiros anos como padeiro.