Você, caro leitor ou prezada leitora, está confiante na economia? Essa resposta, que certamente será influenciada por indicadores objetivos da atualidade e por percepções subjetivas quanto ao futuro, é uma das variáveis mais importantes para os economistas traçarem seus cenários positivos ou negativos. Neste exato momento, a maioria dos empresários brasileiros está dizendo “sim” a essa pergunta, num movimento que não acontecia desde 2013. Não se trata de mágica nem de euforia exagerada. Está em curso uma virtuosa combinação de inflação baixa, juros em queda e geração de empregos, que tem turbinado o consumo. Muito além de manchetes alvissareiras, os recentes indicadores representam, finalmente, a retomada do crescimento, após quase três anos da maior recessão da história.

Na quinta-feira 23, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou o Índice de Confiança do Empresário Industrial (ICEI), que alcançou 56,5 pontos em outubro, numa escala de zero a cem. É a maior pontuação desde abril de 2013, quando a crise econômica não passava de uma miragem. A pesquisa da CNI mostra que o setor produtivo está mais confiante no futuro (58,9 pontos) do que animado com o presente (51,5 pontos), embora os dois indicadores estejam no patamar positivo (acima de 50 pontos). “Sou sempre otimista”, diz Sonia Hess, empresária e fundadora da marca Dudalina. “Ainda mais quando observo que a economia está voltando aos trilhos.” Para se ter uma visão mais clara do quão forte está sendo o resgate da confiança, basta olhar a série histórica e constatar que o fundo do poço (35 pontos) foi atingido há exatos 24 meses, no auge do desastre econômico durante o governo Dilma Rousseff.

Colhendo os frutos: o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (à esq.) e o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, conseguiram criar as condições para a recuperação da economia (Crédito:Antônio Cruz/EBC/FotosPúblicas)

As notícias animadoras da economia começam a despertar o ânimo dos consumidores, que foram muito castigados pela crise. Na sexta-feira 24, a Black Friday atraiu milhões de mentes e bolsos com descontos agressivos, numa prévia do que deve ser o Natal. A Boa Vista SCPC prevê um crescimento de 4% nas vendas natalinas, a primeira alta após dois anos seguidos de retração. O desempenho do varejo nas principais datas comemorativas do ano comprova que o pior já passou (leia quadro “Recuperação do consumo”). “No começo de 2017, os comerciantes diziam que um ‘zero a zero’ já seria vitória”, diz Flávio Calife, economista da Boa Vista SCPC. “Agora, já preveem um crescimento de 2% neste ano e ainda mais em 2018.” Um fator que impulsionou a renda das famílias foi a queda acentuada da inflação, em especial dos alimentos e do setor de serviços. A inflação oficial (IPCA) acumulada em 12 meses, que vem rodando abaixo de 3% desde julho, ajuda a explicar por que o setor de supermercados registrou expansão de 6% nas vendas em setembro, na comparação com o ano anterior.

Outro exemplo é o da indústria de brinquedos, que recebeu com alívio a alta de 2,7% nas vendas no Dia das Crianças, após dois anos seguidos de queda. “Tivemos um pequeno crescimento, mas já melhoraram as expectativas para o Natal”, diz Carlos Tilkian, presidente da Brinquedos Estrela. “As duas datas representam 75% do nosso faturamento anual.” Neste fim de ano e ao longo de 2018, os setores dependentes do crédito também devem brilhar, como o automotivo e o eletroeletrônico. “O crédito à pessoa física já está crescendo e o papel da queda dos juros é fundamental”, afirma Hilgo Gonçalves, presidente da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi). Desde setembro do ano passado, o presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn, e seus diretores vêm promovendo sucessivos cortes na taxa básica de juros (Selic). Trata-se de um ingrediente importante para o varejo de materiais de construção, que vem crescendo 5% neste ano apesar da crise na construção civil. “Quando fica entusiasmado, o proprietário decide reformar a sua casa”, diz Waldir Abreu, diretor de Assuntos Econômicos da Associação Nacional dos Comerciantes de Materiais de Construção (Anamaco).

De olho num cenário promissor, os lojistas de shoppings centers também esfregam as mãos, após dois anos de penúria. “Estamos há cinco meses com tendências positivas”, diz Luís Augusto Ildefonso, diretor de relações institucionais da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop). “Não é nenhum jato subindo verticalmente para o céu, mas a empregabilidade vem melhorando e isso é fundamental.” O mercado de trabalho, a propósito, será o principal pilar para sustentar o consumo em 2018. Embora o País ainda tenha 13 milhões de desempregados – um quadro social dramático –, a recuperação vem surpreendendo os analistas. Na segunda-feira 20, o Ministério do Trabalho divulgou que, em outubro, foram geradas 76,6 mil vagas formais. Foi o sétimo mês consecutivo em que a criação de postos com carteira assinada superou o fechamento. Enquanto indústria, comércio e serviços contrataram em outubro, o destaque negativo ficou com a construção civil, que demitiu quase cinco mil pessoas. “Nós acreditamos que a construção civil também, já no primeiro semestre de 2018, começará a dar resultados positivos”, afirmou o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira.

O olhar otimista não é uma exclusividade do governo, que elevou de 2% para 2,5% a previsão de crescimento econômico para o ano que vem. O boletim Focus, que colhe a previsão de cerca de cem instituições financeiras também projeta o mesmo percentual. Há, no entanto, quem preveja um cenário ainda melhor. “O crescimento que estamos vendo no 2º semestre está mais forte de que se imaginava”, diz Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, que já estava na ponta otimista do mercado há muito tempo, com alta de 1% do PIB neste ano e de 3% em 2018. “Pode ser até mais de 3% no ano que vem.” Na segunda-feira 20, o BC divulgou uma alta de 0,40% no IBC-Br de setembro, que é o seu indicador de PIB mensal. Com isso, a expansão no trimestre foi de 0,58%, a terceira consecutiva.

A equipe econômica do Itaú Unibanco, liderada pelo ex-diretor do Banco Central Mário Mesquita, também projeta uma expansão econômica de 0,8% neste ano e de 3% em 2018, puxada pelo consumo. O passo seguinte – e o mais importante – será a recuperação dos investimentos, que vão garantir o crescimento sustentável ao longo de vários anos. “A virada do investimento já ocorrerá neste terceiro trimestre”, afirma Felipe Salles, economista do Itaú. O IBGE divulgará, no dia 1º de dezembro, o PIB oficial do período de julho a setembro. “A queda dos juros ajuda a reduzir a alavancagem das empresas, que foi a grande trava dos investimentos”, diz Salles. Se depender do presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, o banco estatal terá uma atuação maior em 2018, levando o PIB a crescer “quase 4%”. “Os desembolsos do BNDES passarão de R$ 75 bilhões neste ano para R$ 100 bilhões no ano que vem, uma alta de 33%”, diz Castro.

POPULISMO A aceleração econômica do Brasil tem como pressuposto básico a busca por um equilibro fiscal ano após ano. Para isso, é fundamental que o governo Michel Temer não perca o seu ímpeto reformista, cuja principal bandeira é a reforma da Previdência (leia reportagem na pág. 36). Além disso, os economistas salientam que os prognósticos positivos, a partir de 2019, dependerão do resultado das eleições presidenciais. “O nosso cenário contempla a manutenção da atual política econômica no próximo governo”, diz Mesquita, economista-chefe do Itaú. Imagina-se que os efeitos benéficos da melhora atual da economia e os efeitos maléficos da tragédia gerada pela política econômica do governo Dilma levem os eleitores a votar em políticos compromissados com as reformas e com o ajuste fiscal, dois pilares da gestão do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, potencial candidato à Presidência da República.

Confiança: a oferta de vagas (na foto à esq.) aumenta a renda das famílias,que voltam a consumir. As vendas crescerão no Natal após dois anos (Crédito:Aloisio Mauricio e Rafael Arbex)

Na terça-feira 21, durante o 12º Seminário Internacional da Acrefi, em São Paulo, o vice-presidente de créditos soberanos da agência de classificação de risco Moody’s para a América Latina, Mauro Leos, foi enfático ao condicionar uma elevação da nota do Brasil a uma melhora fiscal. “Temos de lidar com reformas e aumentar a confiança”, afirmou Leos, que, sem citar nomes de candidatos, mencionou o risco que as eleições podem gerar. “A política impacta a confiança dos investidores.” No mesmo evento, o ex-presidente do BC Affonso Celso Pastore disse à DINHEIRO que “a vitória de uma agenda populista reverteria tudo” (leia entrevista ao final da reportagem).

O maior temor dos analistas é que se repita o cenário de fragmentação partidária ocorrido em 1989. Naquela corrida eleitoral, os candidatos de centro se dividiram e o resultado foi uma disputa entre a direita [Collor] e a esquerda [Lula]. “É exatamente o que aconteceria hoje com Lula e Jair Bolsonaro, cuja vitória de qualquer um significaria a volta da recessão econômica”, diz Vale, da MB Associados. “A elite brasileira está desesperada atrás desse elemento de centro, que era o prefeito João Doria e agora virou o Luciano Huck.” Uma pesquisa do instituto Ipsos, divulgada na quinta-feira 23, mostra que Huck é o nome com melhor avaliação (60% de aprovação) entre 23 possíveis candidatos à Presidência da República. O empresário e apresentador da TV Globo nega a intenção. Porém, o fato de ter o apoio do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga torna a sua candidatura bem vista tanto pelo mercado financeiro quanto pelo setor produtivo.


“A vitória de uma agenda populista reverteria tudo”

Um dos mais renomados analistas do País, o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore prevê uma aceleração do PIB em 2018. Porém, o economista alerta para os riscos eleitorais caso “as pessoas não tenham juízo”

Os recentes indicadores de PIB e de mercado de trabalho já servem para constatar uma retomada consistente da economia?
A recuperação consistente já vem há algum tempo. Durante toda a primeira parte do ano, a economia já vinha crescendo. A última queda de PIB foi no quarto trimestre do ano passado. Daí para frente, só vem crescendo, com melhora importante do mercado de trabalho. É um crescimento puxado pelo consumo das famílias, que está sólido. A economia entrou numa rota de recuperação. É uma recuperação lenta, mas sólida, sem dúvida nenhuma.

O crescimento puxado pelo consumo, sem a força do investimento, não preocupa?
Tinha de começar pelo consumo mesmo, pois foi o primeiro que respondeu à queda da taxa de juros, ao crédito e ao mercado de trabalho. O crédito às empresas e ao investimento ainda está caindo em termos reais.

Por que o setor produtivo não está buscando crédito?
As empresas saíram muito machucadas desta recessão. Elas estão com um nível de capacidade ociosa muito alto e com um grau de endividamento muito grande. E você não tira isso de uma hora para outra. Precisamos ressaltar que foi a recessão mais profunda e mais longa da história.

Quando o investimento voltará a crescer?
O investimento demora um pouco. Está começando lentamente. Já há um pequeno aumento no consumo aparente de capital. A construção civil ainda está parada, mas, aos poucos, terá sinais de reação.

Dá pra imaginar que o 2018 será melhor que 2017?
Sem dúvida. Em 2018 cresceremos mais que em 2017.

A vitória de uma agenda populista, nas eleições presidenciais, pode reverter as expectativas positivas?
Eu espero que não aconteça. A vitória de uma agenda populista reverteria tudo. Não tenha dúvida. O que se espera é que as pessoas tenham juízo e, no fundo, escolham um governo com uma visão reformista, que faça o ajuste de que o Brasil precisa. O risco de um governo populista existe.

Há candidatos fortes com a bandeira econômica correta?
Espero que apareça alguém com capacidade de aglutinação política para prosseguir com as reformas.

O ex-presidente Lula e o deputado federal Jair Bolsonaro preocupam?
Preocupam muito, mas é provável que nenhum dos dois esteja no segundo turno.