Em meados de novembro, um grupo de artistas formados pelos músicos MV Bill, Nega Gizza, Dudu Nobre e pelo ex-BBB Ronan Oliveira se reuniu na Favela da Rocinha, zona Sul do Rio de janeiro, para distribuir panfletos de uma agência de viagens. Os famosos chamavam atenção do público local. Eles estavam divulgando a abertura de uma loja da Favela Vai Voando (FVV), rede de agências de turismo especializada no mercado da periferia. Fundada em 2013, a empresa inaugurava sua 178ª unidade, o que representa uma média de quase 45 lojas abertas por ano. A título de comparação, a CVC, maior rede de turismo do País, com mais de 1 mil pontos de venda exclusivos, abriu, em média, 60 lojas por ano, no mesmo período. “É muito importante que tenha uma agência de viagens que olhe para o público da favela”, afirmou Bill. “A FVV está fazendo isso da melhor forma, tornando mais fácil para essas pessoas conhecerem novos lugares.”

Há um claro benefício social no negócio, como aponta o rapper Bill. A FVV favorece o morador das favelas ao propiciar acesso a um serviço, antes restrito às classes mais altas, e também ao permitir a compra parcelada, em até 12 vezes no carnê, sem consulta ao SPC ou Serasa e sem a necessidade de comprovação de renda – algo impensável em grandes agências de viagem, como a CVC, por exemplo. Mas a velocidade com que a rede avança mostra que, além do seu aspecto social, a FVV representa uma grande oportunidade de negócio. O ensejo de explorar esse nicho periférico do mercado sempre esteve fora do radar das grandes corporações, mais atentas aos públicos A e B. Essa chance não passou despercebida pelo olhar atento de um empreendedor diferenciado, cujo histórico desafia todas as lógicas socioeconômicas brasileiras. Seu nome: Celso Athayde. Por sua trajetória e atuais realizações, Athayde recebe da DINHEIRO o prêmio de EMPREENDEDOR DO ANO EM IMPACTO SOCIAL.

Nascido e criado em favelas do Rio de Janeiro e ex-morador de rua, o empreendedor contraria qualquer prognóstico baseado em condição social. Há duas décadas, ele criou, juntamente com MV Bill, a Central Única das Favelas (Cufa), organização social presente em mais de 400 cidades e que reúne, atualmente, 1,5 milhão de colaboradores. Desse projeto, cujo objetivo era organizar e dar poder às camadas mais pobres da população, surgiu um braço corporativo, estabelecido para explorar um mercado que movimenta R$ 1,6 trilhão por ano no País, formado pelo universo das periferias das grandes cidades. Trata-se da Favela Holding, um conglomerado empresarial que concentra 21 companhias, de diversos setores, entre elas a FVV.

A atuação de Athayde é voltada a um só objetivo: inverter a lógica perversa de desenvolvimento no Brasil, que transforma pobreza em condição irrevogável e riqueza, em privilégio eterno. É por isso que o pobre não tem acesso a serviços básicos, como saúde e segurança, que deveriam ser providos pelo Estado. Esse é o motivo, também, da invisibilidade da periferia, que movimenta trilhões de reais por ano, aos olhos empresariais. “Não tenho medo de errar”, diz Athayde. “O que eu quero é levar o jovem da favela a tentar, a buscar o seu reconhecimento. Ao mesmo tempo, fazer com que o dinheiro gerado na periferia fique na periferia.”

Essa visão corajosa e empreendedora tem sido bem sucedida. Além da rede de agências, a FHolding reúne uma operadora de cartões de crédito e débito, uma agência de publicidade, uma produtora musical, um instituto de pesquisa e uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), a Favela Shopping, que desenvolve complexos comerciais e revitaliza lojas nas regiões de atuação da holding. Mas seu maior empreendimento é a Favela Distribuições, empresa responsável por distribuir, nas maiores favelas do País, produtos de gigantes empresariais, como P&G, Natura e TIM. Para isso, ela emprega egressos do sistema prisional, que compõem sua principal força de vendas, recrutados por meio do programa Recomeço, mantido pela Cufa.

Neste ano, Athayde deu um passo importante na sua estratégia. Ele criou um partido político, o Frente Favela Brasil, que está em fase final de registro no Tribunal Superior Eleitoral. O empresário diz que não tem intenção nenhuma de se candidatar. Isso não significa que ele não queira influenciar no processo eleitoral, ajudando o povo da periferia a conquistar, também, um espaço na representação política. Afinal, como ele mesmo diz, é difícil saber se é possível unir as periferias em torno de um único objetivo. “Mas ninguém poderá dizer que faltou opção”, afirma Athayde. “O que eu quero é estar na mesa de negociação.” Isso, ele já conseguiu. A favela nunca mais será ignorada.


Confira o Especial completo “Empreendedores do Ano de 2017”:

Ilan Goldfajn é o empreendedor do ano 2017

Frederico Trajano é o empreendedor do ano 2017 em e-commerce

Flavia Bittencourt é a empreendedora do ano 2017 no varejo

Guilherme Paulus é o empreendedor do ano 2017 em serviços

Paulo Cesar de Souza e Silva é o empreendedor do ano 2017 na indústria