O maior escândalo italiano dos últimos anos acaba de desembarcar no País. O caso diz respeito à rede de espionagem ilegal montada pela Telecom Italia para grampear e vasculhar dados financeiros de empresários, políticos e jornalistas. Até agora, esse episódio já provocou um suicídio e 21 prisões ? sempre de pessoas ligadas à operadora telefônica. A novidade recente veio à tona em duas reportagens do Corriere della Sera, o mais influente jornal italiano, e está diretamente relacionada ao Brasil. O Corriere obteve o depoimento secreto prestado pelo investigador privado Mario Bernardini, que trabalhou para a Telecom Italia e fechou um acordo de delação premiada com a Procuradoria de Milão. Nele, o agente Bernardini revelou a existência de uma conta bancária em Hong Kong que teria feito pagamentos a lobistas, políticos e policiais brasileiros. O contexto era a disputa entre a Telecom Italia e o grupo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, pelo controle da operadora Brasil Telecom (BrT). E a ação decisiva para que houvesse uma mudança no comando na BrT, hoje em poder dos fundos de pensão estatais, foi a Operação Chacal, da Polícia Federal, deflagrada em julho de 2004, que também teve o objetivo de provocar a prisão de Dantas.

Agora, dois anos depois, o depoimento do agente Bernardini está trazendo à tona duas grandes revelações. A primeira é que o CD do chamado ?caso Kroll?, que foi entregue à Polícia Federal e serviu de base para a operação, pode ter sido produzido dentro da própria Telecom Italia. O responsável seria o executivo Fabio Ghioni, da área de informática da operadora. E isso reforça a defesa dos executivos da Kroll que, à época, disseram que os documentos vazados pela PF para a imprensa eram falsos ou adulterados. A segunda revelação diz respeito a supostos pagamentos de US$ 1,1 milhão, de recursos provenientes da Telecom Italia, que teriam sido feitos pelo advogado Marcelo Elias a políticos e policiais brasileiros. Elias é um ex-funcionário do Opportunity que se associou ao empresário Luís Roberto Demarco, outro ex-funcionário do banco, na cruzada contra Dantas. Ambos são muito conhecidos pelos jornalistas especializados que acompanharam o caso, rotulado como a maior disputa societária da história do País. Outro executivo italiano investigado pela Procuradoria de Milão, o agente secreto Angelo Janonne, também se referiu a Demarco no seu depoimento. E disse que os pagamentos ocorreram porque ele seria muito influente no Brasil e amigo das pessoas colocadas no vértice dos fundos de pensão, que também são sócios da Brasil Telecom (leia trechos abaixo).

Desde o início da Operação Chacal, a revista DINHEIRO publicou reportagens apontando as várias contradições do caso. Entre as provas apresentadas pela Polícia Federal, havia mensagens eletrônicas que pareciam adulteradas e declarações de um suposto espião da Kroll, o português Tiago Verdial, que haviam sido dadas ao próprio Janonne, da Telecom Italia ? parte nitidamente interessada na guerra empresarial. Além disso, cinco executivos da Kroll foram presos em flagrante, acusados de grampo, e depois comprovou-se que os equipamentos apreendidos pela PF faziam apenas varreduras, ou seja, o antigrampo. Agora, com as revelações assombrosas que vêm de Milão, capazes de provocar a entrada do Ministério Público brasileiro no caso, tudo parece confirmar as suspeitas levantadas sobre a Operação Chacal. E isso, de certa forma, cumpre a profecia feita por Jules Kroll, dono da Kroll, à DINHEIRO, ainda em 2004. ?Quem nos ataca acaba sendo preso mais cedo ou mais tarde?, disse ele.