Cartão-postal de Toronto, a CN Tower manteve por três décadas o título de construção mais alta do mundo. Com seus 553,33 metros, só perderia o posto em 2010, para o edifício Burj Khalifa, em Dubai. A torre começou a ser construída em 1972 pela Canadian National Railway para abrigar uma imensa antena de comunicação a serviço do sistema de transporte ferroviário. Em pouco tempo, porém, ela se tornaria uma das principais atrações turísticas da maior cidade canadense. Seu restaurante giratório, apropriadamente batizado 360 (ele leva uma hora para completar uma volta), é uma parada obrigatória de quem visita Toronto — e, talvez, o melhor ponto de partida para aqueles que planejam se aventurar pelo Canadá aproveitando o conforto e a segurança de sua eficiente malha ferroviária.

Na Union Station, a pouco mais de 100 metros da entrada da CN Tower, é possível escolher entre dezenas de destinos para percorrer o país sobre trilhos. E por que não Halifax, na Nova Escócia? A viagem teria escalas em Quebec (na ida), Montreal e Ottawa (ambas na volta). Cada uma das cidades pode deixar lembranças inesquecíveis, com seus museus, galerias, parques, restaurantes, bares, cafés e passeios. A experiência no trem, contudo, torna a viagem ainda mais memorável.

Levando em conta o quanto o Brasil carece de roteiros turísticos ferroviários, é preciso fazer um alerta quanto às condições impostas por uma longa viagem de trem. Que ninguém se iluda. A aventura a bordo do The Ocean é extramente compensadora, mas não se trata de uma acomodação de luxo. Os sofás das cabines são convertidos em camas do tipo beliche, que a camareira arruma com lençóis e mantas confortáveis. Há armários para pendurar roupas, mas parte da bagagem, mesmo de mão, precisa ser acomodada no chão mesmo. O banheiro é diminuto e, quando equipado com chuveiro, as toalhas precisam ficar dentro de uma sacola plástica para que não molhem durante o banho. Para pessoas obesas, a situação tende a ser um tanto incômoda, assim como é dificultoso subir os degraus da escada para a cama superior.

A experiência no 360 Restaurant (à dir.), giratório, é única — e inesquecível (Crédito:Divulgação)

Apesar do chacoalhar constante, é obrigatório andar pelos vagões, seja em direção ao restaurante (em geral no início da composição), seja no sentido oposto, rumo ao carro panorâmico. Ali, um segundo andar coberto por um domo de vidro descortina a paisagem de florestas, rios e lagos que a linha férrea corta. Alguns trechos são deslumbrantes, de tirar o fôlego. Prepare-se para acordar cedo e aproveitar o visual o máximo possível, já que parte do trajeto é feito durante a noite.

Como há uma limitação de vagas no restaurante, as refeições precisam ser agendadas. Há três opções de horário para o almoço e para o jantar. Os menus incluem entrada, prato principal e sobremesa, com uma sugestão de vinho para harmonizar cada escolha. Impossível passar fome durante a viagem, já que o vagão panorâmico mantém uma mesa com café, chá, cookies e frutas frescas à disposição dos viajantes. Um bar provê bom sortimento de bebidas e snacks. Degustações de vinhos locais e cervejas artesanais também são oferecidas como cortesia, acompanhadas de explicações sobre o estilo e o caráter do que é servido. Quem aprecia bebidas pode dar a sorte (como foi o caso) de contar com uma camareira expert no assunto. Bastou perguntar para obter indicações de vinícolas e destilarias próximas a Halifax que mereceriam visita: Domaine de Grand Pre, Jost Vineyards e Glenora Destillery. A agenda apertada não permitiu estender o passeio para a área etílica. Ficará para a próxima.

TITANIC Pouco conhecida dos brasileiros, Halifax é marcada por duas tragédias náuticas: a explosão de um navio com armamentos da Primeira Guerra que destruiu boa parte da cidade; e o naufrágio do Titanic. Foi de Halifax que partiram os navios usados no resgate de sobreviventes, episódio bem documentado no Maritime Museum of the Atlantic. Os acidentes não tiraram da cidade sua vocação original. Pelo contrário, Halifax se consolidou como o mais importante polo da indústria naval canadense, com estaleiros que rivalizam em importância com os maiores do mundo. Passear por seu longo waterfront sentindo a brisa marítima é uma delícia, assim como saborear os peixes e frutos do mar servidos em restaurantes à beira-mar. A lagosta da região é famosa, especialmente nos três destinos turísticos vizinhos: Peggy’s Cove, com seu inconfundível farol, Mahogany Bay e Lunenburg. Lugares encantados.

O vagão panorâmico do trem The Ocean (à esq.) que permite apreciar as belas paisagens canadenses a partir de um ponto de vista singular. No centro, a pitoresca Lunenburg, próxima a Halifax. E a sede do Parlamento na capital Ottawa (Crédito:Divulgação)

CHÁ NO CHÂTEAU O trem The Ocean cobre o trecho Halifax-Montreal, a partir de onde pode-se fazer conexão com outras cidades. Uma opção é a capital Ottawa, com atrações de sobra para qualquer perfil de viajante. A estação ferroviária costumava ficar no centro, ao lado dos edifícios do Parlamento, com sua arquitetura imponente inspirada no estilo gótico inglês. A antiga estação foi convertida em pavilhão de exposições, e quem chega a Ottawa de trem desembarca a certa distância de onde estão as principais atrações turísticas: além do Parliament Hill, o canal Rideau, que conecta os rios São Lourenço e Ottawa por meio de uma série de pequenas eclusas.

Mesmo sendo capital, Ottawa surpreende por manter o charme de uma cidade pequena. Um chá da tarde no Zoe’s, o renovado restaurante do luxuoso hotel Fairmont Château Laurier, pode remeter a um programa altamente aristocrático. Nos quarteirões em volta do mercado central, fazendeiros ainda revendem produtos de terroir, como o indefectível maple syroup. Um despojado passeio de barco pelo rio Ottawa apresenta a cidade e seus mais ilustres moradores, caso do primeiro-ministro Justin Trudeau.

A cidade pode ser pequena, mas ela tem se desenvolvido em busca de ares mais cosmopolitas. Por isso mesmo, há muito que conhecer por lá, especialmente se o interesse for por arte e história. A Galeria Nacional do Canadá tem uma coleção fabulosa. Já o Museu Canadense de História é uma experiência indescritível, desde a arquitetura até as instalações interativas. Vizinha ao moderníssimo hotel Le Germain, a Ottawa Art Gallery traz um quê de vanguarda à cidade que tem, ainda, uma cena gastronômica refinada. No restaurante Riviera, uma torre de frutos do mar satisfaz o mais exigente dos paladares. E deixa na boca um gosto de querer voltar.


Serviço:

• VIA Rail Canada
• CN Tower / 360 Restaurant
Le Germain Hotel Ottawa