A Câmara dos Deputados derrubou na quarta-feira, 17, a maior parte dos vetos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) à lei 14.119, que institui a Política Nacional por Pagamentos de Serviços Ambientais (PSA) no Brasil.

O projeto de lei, que tramitou por 13 anos, foi aprovado no fim do ano no Congresso e sancionado por Bolsonaro em meados de janeiro com vetos que, no entender de parlamentares e de entidades que já trabalhavam pela agenda, poderiam comprometer a transparência e a própria aplicação da política, que tem como objetivo estabelecer formas de compensar produtores rurais por manterem floresta.

De autoria dos deputados Rubens Bueno (Cidadania-PR) e Arnaldo Jordy (PPS-PA), o texto do projeto de lei, considerado de consenso entre ruralistas e ambientalistas, tinha mecanismos de governança e instrumentos econômicos que foram vetados por Bolsonaro.

Era o caso do item que estabelecia a criação de um órgão colegiado, com participação do governo, do setor produtivo e da sociedade civil, que seria responsável por estabelecer as áreas prioritárias para receber esse tipo de recurso e como eles poderiam ser aplicados. Este veto foi derrubado na votação de ontem.

Outro item que volta a valer agora é que estabelecia a existência de um cadastro nacional para registrar todos os contratos de PSA do Brasil. O objetivo deste cadastro é dar transparência para a movimentação de recursos, em especial quem está recebendo e em qual local, o que ajuda a evitar eventuais duplicidades e a dar segurança jurídica ao acordo celebrado entre as partes.

A votação de quarta derrubou também o veto ao trecho da lei que estabelecia como deve se dar o uso de PSA em unidades de conservação do País. Para esta quinta-feira, 18, está prevista a continuação da análise dos vetos do presidente, que incluem também instrumentos econômicos previstos na política, como a isenção de cobrança de imposto de renda sobre o recurso obtido com os acordos de PSA.

A derrubada dos vetos foi articulada por parlamentares como o senador Fabiano Contarato (Rede/ES), os deputados Nilto Tatto (PT-SP) e Rodrigo Agostinho (PSB-SP) – ambos da frente ambientalista -, e os deputados Bueno, Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) e Camilo Capiberibe (PSB-AP), da Frente Parlamentar da Agropecuária. Em meados de fevereiro, eles encaminharam uma carta a todas as lideranças do Congresso justificando por que esses itens são necessários para a aplicação da lei.

A movimentação contou com o apoio da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, rede que congrega gigantes do agronegócio, do setor bancário, da academia e do ambientalismo; de ONGs como a SOS Mata Atlântica, o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), WRI-Brasil, TNC e o WWF-Brasil; do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), da Confederação Nacional de RPPNs e da empresa Natura.

“Há um grande volume de recursos no nível internacional com foco nesta agenda, porém, exigem como condicionantes instrumentos que garantam a transparência da aplicação dos recursos, das metodologias utilizadas para a precificação dos serviços ambientais e o monitoramento dos resultados, com a participação social e a justa distribuição de benefícios. Para o setor privado, ainda é necessário além do ambiente jurídico seguro vantagens tributárias para serem atraídos como indutores das iniciativas de PSA”, afirmaram os deputados na ocasião.

“Mais do que um acordo para derrubada dos vetos, acho que o diálogo que estabelecemos com a liderança do governo no Congresso abre caminho para que o governo brasileiro compreenda que esse instrumento, o PSA, pode ser algo inclusive para ser colocado na mesa na Conferência do Clima da ONU em Glasgow (Escócia), no fim deste ano, como uma evolução da legislação ambiental brasileira. Estamos indo além dos instrumentos de comando e controle para um instrumento de estímulo também (à conservação)”, disse Arnaldo Jardim.

“A lei de Pagamentos por Serviços Ambientais é um instrumento importante para promover a bioeconomia e negócios sustentáveis no Brasil, mas só terá efetividade com participação social e com incentivos para a geração de renda local a partir da preservação dos biomas pelas comunidades”, complementa Denise Hills, diretora Global de Sustentabilidade da Natura.

Em nota, a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura afirmou que a derrubada dos vetos consolida a política de PSA como uma “lei alinhada aos princípios de boa governança e transparência”, e reforçou o pedido para que os parlamentares também derrubem os vetos sobre os incentivos fiscais, considerados fundamentais para atrair investimentos para a área. “Os benefícios fiscais serão fundamentais para atrair os diferentes setores da economia para a agenda de PSA”, aponta o grupo.

Para a coalizão, a lei, da forma como foi aprovada pelo Congresso, representava “um consenso entre atores da agropecuária e do meio ambiente”, mas os vetos comprometiam a transparência e a governança do programa.