Por Maria Carolina Marcello

BRASÍLIA (Reuters) – A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira o projeto de lei que flexibiliza o uso de agrotóxicos no Brasil, apelidado de “Lei do Alimento Mais Seguro” por governistas e representantes do setor agropecuário na Casa, mas de “PL do Veneno” por críticos.

Por 301 votos a 150, com 2 abstenções, deputados aprovaram o texto principal, que se refere aos agrotóxicos como “pesticidas” e confere ao Ministério da Agricultura o poder de registrar as substâncias. Depois, rejeitaram as emendas que pretendiam alterá-lo, e ele agora retorna para o Senado.

Defensores da proposta dizem que ela tem o objetivo de desburocratizar e dar mais transparência à aprovação dos pesticidas no país. Destacam que o projeto mantém e aperfeiçoa estudos toxicológicos que avaliam a segurança das substâncias.

“A proposta prevê também uma análise mais completa e leva em consideração todos os riscos envolvidos à saúde e ao meio ambiente, inclusive, acrescenta critérios referentes à exposição das pessoas a esses produtos, a exemplo do que é feito em países com agricultura similar à brasileira, como Austrália e Estados Unidos”, diz nota da Frente Parlamentar da Agropecuária.

Críticos, no entanto, apontam como principais retrocessos o fato de a proposta determinar que o Ministério da Agricultura será o único órgão a registrar novos agrotóxicos, reduzindo o papel do Ibama e da Anvisa a órgãos “homologatórios”.

Também alertam que o texto permite o registro de agrotóxicos comprovadamente nocivos e cancerígenos, porque exclui uma vedação prevista na legislação atual.

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“Boa tarde para quem comeu tomate hoje e não lembrou do agrotóxico. Para quem não comeu, não pense muito, porque ‘todes’ os alimentos no Brasil estão encharcados deles. E vai piorar. Essa é má notícia”, aponta texto divulgado pelo Greenpeace sobre o projeto.

DEMANDA DO SETOR

O texto atende demanda do setor agropecuário, recentemente atingidos por falta de substâncias agrícolas. Na véspera, associações de agricultores do Brasil apontaram problemas nas entregas de herbicidas, que teriam sido comercializados mas não entregues, o que colocaria em risco lavouras de milho do país, assim como a dessecação da soja para a colheita.

Em função disso, o setor advoga pela liberação e registros de empresas que tenham condição de produzir volumes de substâncias como a atrazina, herbicida com ação de controle de ervas daninhas do milho, de maneira suficiente para o abastecimento do mercado brasileiro na safra atual. Também pedem que seja liberada a importação de produtos de países do Mercosul.

Nesta quarta, entidades como a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) e a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), divulgaram um manifesto em apoio ao projeto.

“A lei que trata de pesticidas em vigência no país, foi promulgada em 1989 e passou por poucas atualizações nesse período”, diz o manifesto.

“A agricultura e o conhecimento científico, no entanto, evoluíram sobremaneira nos últimos 30 anos. Por isso, a legislação atual não atende mais às necessidades técnicas de avaliação dos produtos e a alteração da lei se faz necessária para dar aos agricultores brasileiros a mesma facilidade de acesso que seus concorrentes possuem às novas tecnologias geradas pela ciência”, acrescenta o texto.

JUDICIALIZAÇÃO

Não são pequenas as chances de o projeto ser questionado no Supremo Tribunal Federal (STF). Durante as discussões em plenário, a deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) chegou a apresentar questão de ordem argumentando que a proposta feria a Constituição.

“Presidente, esse projeto de lei padece de inconstitucionalidade ao contrariar o pressuposto do dever do Estado de garantir tanto o direito à saúde, mediante política de redução de riscos de doenças graves, como o direito ao meio ambiente equilibrado. Ao contrário disso, o projeto reduz o papel do Estado na regulação desses produtos de reconhecida toxicidade, ampliando consideravelmente o risco de doenças e de danos ao meio ambiente”, disse a deputada.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), respondeu, no entanto, que o projeto já passou pelo exame da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, e foi aprovado “sem nenhum vício de inconstitucionalidade”.

O relator da matéria, deputado Luiz Nishimori (PL-PR), defendeu o projeto e a necessidade de atualização da legislação vigente.

“Todos sabem do grande avanço científico e tecnológico que houve em nossa agricultura, mas nos últimos tempos a legislação dos pesticidas não conseguiu acompanhá-lo”, argumentou o relator.

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