A rua de Calvin. Durante mais de três décadas era assim que os nova-iorquinos se referiam à Sétima Avenida, sede do estúdio de um dos maiores estilistas do mundo. Ali, Calvin Klein desenhou as primeiras coleções. Cortou, costurou, pintou e bordou no universo fashion. Dali, ergueu, com o parceiro Barry Schwartz, uma legenda da indústria da moda que levou roupas e acessórios a todos os cantos, de Hong Kong a Paris. Mas na última semana a Sétima Avenida deixou de ser a rua de Calvin. Na quarta-feira 18, a companhia Philips Van-Heusen (PVH) ? dona de marcas como DKNY e Izod ? pagou US$ 700 milhões pela tradicional assinatura CK. Com a compra, a PVH leva as 24 lojas do estilista, amplia sua presença na área de roupas femininas, acessórios e perfumes, mas ficou sem o filé mignon: a linha jeans, responsável por mais de 40% das vendas. Klein a licenciou para a empresa Warnaco, que vive maus momentos e entrou em concordata. A PVH já avisou que pretende disputar o espólio da Warnaco, mas analistas de mercado dão como certa a transferência da linha jeans para outra gigante: a VF, dona de marcas como Wrangler e Lee. Resumindo, Calvin Klein pode ser dividido em dois.

A empresa do estilista americano vivia nos últimos tempos sérios problemas financeiros e tentou, sem sucesso, um processo de abertura de capital. A administração, excessivamente concentrada nas mãos dos fundadores, também foi um entrave ao crescimento. No início dos anos 90, Schwartz e Klein até ensaiaram um projeto de profissionalização. Caçaram nos estúdios do colega Giorgio Armani a executiva Gabriela Forte, tida como um dos furacões financeiros do mundo da moda. Só para tirá-la dos domínios de Armani, os sócios da Calvin Klein desembolsaram US$ 1 milhão de ?luvas?. A moça fez um bom trabalho e levantou a CK. Mas não agüentou o temperamento de Shwartz e Klein e deixou a empresa. ?Calvin Klein perdeu o controle da marca?, comentou ao The Wall Street Journal o consultor Harry Bernard. Por perda de controle entenda-se um processo desenfreado de parcerias e licenciamentos que acabou ofuscando o glamour da marca. A linha, antes exclusivista, passou a ser vista em tudo, de lençóis a óculos de sol. Por isso, os consumidores mais exigentes se afastaram. Devido a perda de receitas (a empresa não revela cifras), ele cortou 90 postos de trabalho. Em 1999, tentou vender a grife por US$ 1 bilhão. Ninguém apareceu e ele reduziu o preço.

 

A venda para a PVH, grupo que fatura US$ 14 bilhões, é mais um capítulo de uma tendência que vem ditando os rumos dessa indústria. Os grandes estilistas vão saindo de cena e em seus lugares entram conglomerados com poder de fogo para produzir em larga escala, reduzir preço e inundar prateleiras com ?grifes?. Esse foi o caminho seguido por meda-lhões como Yves Saint Laurent, Donna Karan, Christian Lacroix e Kenzo Tacada, entre outros. O único remanescente é Giorgio Armani, que não pára de ser assediado. ?Há uma tendência de marcas financeiramente fracas serem absorvidas?, diz o empresário André Brett, que representa Armani no Brasil.

Por aqui, só é possível ver produtos Calvin Klein em lojas de artigos importados e na sofisticada Daslu, em São Paulo. Com a perda de prestígio em vários cantos do mundo, Calvin Klein foi enfraquecendo. O estilista nascido no bairro nova-iorquino do Bronx, que aprendeu a manejar uma máquina de costura com a avó, despede-se com pouco glamour das passarelas. A CK, agora, é só mais uma marca de um grande conglomerado.