Uma das mais memoráveis peças publicitárias da história da propaganda brasileira, elaborada em 1978 pela agência Novo Ciclo, trazia o slogan “Não esqueça a minha Caloi”. Para quem não se recorda, a campanha mostrava bilhetinhos direcionados aos pais com essa mensagem, escondidos pelos filhos em locais estratégicos da casa. O sucesso dessa ação de marketing, atualizada a cada dois ou três anos durante as décadas seguintes, aliado a produtos de qualidade à força da marca, sustentaram em alta as vendas da Caloi. Nos anos 2000, no entanto, as dívidas e a concorrência com as bikes chinesas deixaram a empresa em apuros.

Produção nacional: a fábrica da Caloi em Manaus monta, desde janeiro, outras marcas do grupo Dorel, como Cannondale e GT (Crédito:Claudio Gatti)

A participação de mercado recuou de 60% para 40%, patamar registrado atualmente. O controle da companhia passou da família do fundador, Luigi Caloi, para Edson Musa, ex-CEO da Rhodia no Brasil, e seu filho Eduardo. Anos depois, em 2013, a Caloi foi adquirida pelo grupo canadense Dorel, multinacional com faturamento de US$ 1,6 bilhão. “A perenidade da Caloi é resultado da força de sua marca, que apesar das dificuldades financeiras ao longo do tempo conseguiu preservar seus valores e princípios”, afirma Eduardo Tomyia, diretor-geral da Milward Brown Vermeer para a América Latina. “A principal concorrente, a Monark, era tão antiga quanto a Caloi, mas quebrou porque não soube se reinventar.”

Reinventar sua própria marca parece ser a trilha adotada pela Caloi para os próximos anos. Desde janeiro pilotada pelo executivo Cyro Gazola (ex-Philips e Procter&Gamble), a empresa pedala rumo ao mercado de bicicletas elétricas, com o lançamento da linha E-Vibe. Embora não revele os números, Gazola afirma que foram vendidas em dois dias, no início deste mês, o que era esperado para seis meses. E não foi pelo preço. O modelo City Tour, pensado para uso urbano, custa a partir de R$ 8 mil. Já a E-Vibe, versão mountain bike, chega a R$ 13 mil. “Vamos atacar em um segmento que praticamente não existe no País, e concorrer diretamente com o mercado de scooters”, disse Gazola à DINHEIRO, em sua primeira entrevista na presidência da Caloi. “Acreditamos que, em entre cinco e dez anos, 15% de toda nossa venda virá da E-Vibe.”

As bicicletas elétricas da Caloi foram desenvolvidas em parceria com a japonesa Shimano, líder absoluta em produção de peças e acessórios para ciclismo, com 70% do mercado. As baterias acopladas ao quadro garantem uma autonomia de até 125 quilômetros no modo Eco, a distância equivalente a São Paulo e Taubaté. Na opção high, a mais forte, com velocidade máxima de 25 km/h, é possível percorrer 60 quilômetros. Já no modo normal, o alcance é de 85 quilômetros. A recarga é feita na tomada. “Essa é uma reinvenção de tudo já a empresa já fez em seus mais de cem anos de existência”, garante.

O otimismo da Caloi se apoia também nas perspectivas de recuperação da economia. Em agosto, segundo a Abraciclo, associação do setor, foram produzidas 72.321 bicicletas, volume 11,3%% superior ao registrado em julho. Na comparação com agosto passado, houve estabilidade. “Os resultados sinalizam uma melhora no mercado nacional e indicam avanço para os próximos meses”, diz João Ludgero, vice-presidente da Abraciclo.

Em paralelo às bikes elétricas, a Caloi quer ampliar sua presença no segmento premium. A fábrica em Manaus, que já monta em sistema CKD as outras marcas do grupo Dorel, como a Cannondale e a GT, recebeu investimento de R$ 25 milhões para criar uma ala dedicada à produção em fibra de carbono. Apenas como comparação, uma bicicleta de entrada, produzida em aço e alumínio, custa a partir de R$ 430. A Caloi produz 3 mil unidades dessa linha por dia. O modelo Elite Carbon Team, para atletas de alta performance, chega a R$ 20 mil. Como são feitas de forma artesanal, apenas 70 unidades são produzidas por dia. “A inovação é o que nos move, e por isso continuaremos reinventando a nossa própria roda, pensando nos próximos cem anos”, garante Gazola.