O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) arquivou investigação do chamado “cartel das quentinhas” do Rio de Janeiro. A maioria do conselho entendeu não haver provas suficientes para condenar as empresas investigadas.

O processo investigava o conluio de empresas em uma licitação para fornecimento de marmitas para prisões fluminenses durante o governo de Sérgio Cabral – atualmente preso, denunciado pelo Ministério Público por receber propina do mesmo esquema.

Em dezembro, a então conselheira Cristiane Alckmin havia pedido a condenação das 17 empresas investigadas, com a aplicação de multas que somam R$ 413 milhões.

Em seu voto, ela defendeu que há evidências da atuação do cartel: similaridade de propostas, apresentação de lances de cobertura irregulares e o fato de empresas não reclamarem após serem desclassificadas. Além disso, o pregoeiro teria esperado o fim de todas as licitações para só então homologar o processo.

Uma das provas apresentadas pela conselheira foi uma publicação de um classificado no jornal “A voz da Cidade”, feita antes do resultado da licitação, em que constariam as empresas vencedoras em uma mensagem cifrada em formato de oração.

Depois de pedir vistas do processo em dezembro, o conselheiro Maurício Maia votou pelo arquivamento e disse que não existiam provas de que as empresas atuaram de forma combinada. Ele afirmou que os indícios são apenas matérias de jornal, que denunciam um “esquema de corrupção generalizada no Rio de Janeiro”, que ainda está sob investigação criminal.

Além disso, para Maia, apesar das investigações de corrupção relacionadas ao processo, não é possível fazer uma conexão automática entre esse fato e a existência de um cartel. “Há absoluta desconexão entre os temas e não há nenhuma prova ligando a corrupção com o crime de cartel”, afirmou.

Em relação ao poema publicado no jornal, Maia disse que a interpretação foi feita depois do resultado do cartel e o denunciante publicou o poema para, depois, jogar com as interpretações possíveis.

A decisão do Cade contraria parecer do Ministério Público Federal que, em 2017, defendeu a condenação das 17 empresas. No parecer, o MPF pede que o conselho considere o conjunto probatório como um todo e afirma que “as provas indiretas são tranquilamente aceitas pela autoridade concorrencial brasileira, permitindo-se que a apreciação conjunta de evidências e circunstâncias torne possível compreender a atuação de um cartel, sobretudo em licitações, quando atestado que não há explicação racional e crível para justificar o comportamento dos agentes econômicos licitantes”.

Investigação

Uma das empresas que era investigada é a Masan Comercial (hoje Agile Corp), cujo ex-sócio Marco Antonio de Luca foi preso acusado de ter pago propina a Cabral. De Luca foi um dos acompanhantes de Cabral na “farra dos guardanapos”, episódio que ficou conhecido após a divulgação de fotos das celebrações, em Paris, de Cabral com outros denunciados por corrupção.

Apesar de o esquema ter sido investigado pela Lava Jato, as irregularidades foram denunciadas ao Cade muito antes da operação. Em 2009, o órgão recebeu uma denúncia anônima sobre possível cartel em um dos pregões da Secretaria de Administração Penitenciária do Estado do Rio. O participantes teriam combinado o resultado da licitação, com contratos no valor de R$ 120 milhões por ano.

Preso no Rio de Janeiro, o ex-governador Sérgio Cabral foi denunciado pela 12ª vez no ano passado, quando foi acusado de receber propina na “máfia das quentinhas”. Na acusação, o MPF pediu ainda a reparação dos danos materiais causados, no valor de R$ 16,7 milhões, e a reparação por danos morais coletivos no valor de R$ 33,4 milhões.

No fim do ano passado, a Mansan disse que participou da licitação investigada pelo Cade, mas não foi vencedora e nunca forneceu quentinha para nenhum órgão do Estado do Rio de Janeiro.