Ex-presidente da Fiocruz, o médico Carlos Morel é o único brasileiro a integrar um grupo de elite da Organização Mundial de Saúde (OMS). O colegiado tem como objetivo investigar as origens do Sars-CoV-2, vírus causador da covid-19, e criar diretrizes para identificar e prevenir o surgimento de patógenos capazes de deflagrar novas pandemias.

A OMS já havia criado um grupo de especialistas para determinar a origem do novo coronavírus responsável pela pandemia. Por que outro grupo?

O grande desafio geográfico, científico e político é saber de onde veio o vírus e como ele surgiu. Foi a mão humana? A Mãe Natureza? Foi disseminado propositalmente? Houve um vazamento (de um laboratório)? Não vamos excluir nenhuma hipótese, mas não temos uma agenda predeterminada. No entanto, só vamos avançar com a colaboração da China. Ninguém tem o poder de entrar e vasculhar gavetas, não é por aí. A gente vai precisar trabalhar com os cientistas e com o governo chinês. Eles têm de confiar no grupo.

O senhor participou do Projeto Viroma Global, lançado em 2018, que tinha por objetivo justamente identificar e sequenciar os vírus com potencial de causar uma pandemia. Se tivesse avançado, isso poderia ter evitado ou pelo menos previsto a pandemia?

Difícil dizer, mas talvez a montagem do “atlas” com todos os vírus circulantes estivesse mais avançada.

Mas os morcegos estavam na mira de vocês, não é?

Se estavam! A virologista Shi Zhengli, de Wuhan, participou de seminário na Fiocruz em meados de 2019, deu uma palestra ótima, com vários slides chamando a atenção para animais silvestres como hospedeiros e/ou reservatórios de vários vírus… Era como se estivesse apontando: ‘Olha o perigo aí, gente!’

O que mais o novo grupo pode fazer? Estabelecer diretrizes mundiais para o caso do surgimento de novos patógenos, por exemplo?

A OMS não tem poder de polícia, tudo se constrói com confiança, mas podemos criar diretrizes para os países. Por exemplo: podemos criar uma norma de comunicação imediata à OMS para a identificação de um novo patógeno.

Teremos uma nova pandemia?

Os vírus são talhados e preparados para se espalhar. É Darwin na veia.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.