O Brasil, um dos convidados à primeira cúpula de segurança nuclear em Washington, nesta segunda e na terça-feira, conta com um ambicioso programa nuclear civil.

Somou-se tarde, em 1998, ao Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), sem subscrever o protocolo adicional que reforça o controle por parte da Agência Internacional de Energia Atômica, AIEA.

A possibilidade de que material nuclear caia em mãos terroristas é a principal obsessão dos Estados Unidos, e motivo pelo qual o presidente Barack Obama convocou a reunião de cúpula em Washington.

“Não queremos que o tema desta reunião (o terrorismo nuclear) se converta no quarto pilar do tratado, não queremos que seja incorporado ao TNP”, advertiu, no entanto, na sexta-feira, o porta-voz do presidente Luiz Inacio Lula da Silva, Marcelo Baumbach.

Mas o caso brasileiro é peculiar por outras razões.

O Brasil anunciou em 2004 a construção de uma usina de enriquecimento de urânio em Resende para seus dois reatores nucleares em funcionamento.

Depois, surpreendeu a AIEA ao negar a seus inspetores a visita às centrífugas da usina, mediante lonas que ocultavam os equipamentos.

O Brasil pretextou que essas centrífugas representavam um novo protótipo desenhado no país, enquanto algumas fontes argumentaram que talvez sua tecnologia tivesse sido copiada de países europeus.

Durante meses, esse conflito foi motivo de tensão dentro da AIEA e chegou a ser feito um paralelismo em relação ao caso iraniano, que se nega a abrir totalmente suas instalações à Agência.

No final de 2004, houve um acordo sobre o tamanho dessas lonas que ocultavam as centrífuga. Isso permitiu, oficialmente, preservar os zelosos interesses brasileiros, ao mesmo tempo em que os inspetores conseguiram aceder a essas instalações.

“Não é provável que esse acordo único (entre Brasil e a AIEA) seja levado à cúpula, uma vez que o regime de não proliferação já tem problemas suficientes”, explicou à AFP Maria Rost Rublee, especialista em não proliferação da Universidade de Auckland (Nova Zelândia).

“A principal preocupação é Irã e Coreia do Norte; ninguém quer reviver velhas pendências, além das que já estão na agenda” da comunidade internacional, ressalta a especialista num e-mail.

A reunião que começa nesta segunda-feira com um jantar de trabalho ameaça com outro tipo de polêmica, como a ausência do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu.

Rublee coloca o Brasil na lista de países como o Japão, isto é, com capacidade para explorar a construção de armas nucleares, mas sem interesse oficialmente em fazê-lo.

Que o Brasil não seja um problema a ser levantado em Washington não significa que não prossiga uma política ativa de defesa de seus interesses.

O presidente Lula prevê reunir-se, precisamente, com o primeiro-ministro japonês durante sua visita a Washington, antes do início da cúpula, informaram fontes diplomáticas à AFP e que preferiram não ter o nome divulgado.

As ambições do Brasil destacam-se uma vez mais numa região cujos membros, Cuba incluída, assinaram há quatro décadas a declaração de Tlatelolco (México), segundo a qual a América Latina não será nunca uma zona de armamento nuclear.

Argentina, Chile e México também participarão da cúpula. A Argentina, com dois reatores, é um país sem grandes ambições nucleares por falta de dinheiro, segundo Rublee. O Chile depende dos Estados Unidos para a reciclagem de seu urânio enriquecido.

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