Por Lisandra Paraguassu e Ana Mano

BRASÍLIA/SÃO PAULO (Reuters) – O plano nacional de fertilizantes, lançado nesta sexta-feira, tem o objetivo de reduzir a dependência do Brasil de importações desses produtos dos atuais 85% para 45% em 2050, afirmou o Ministério da Agricultura, em um momento em que o Brasil lida com alta nos preços desses insumos, além de escassez por conta da guerra na Ucrânia.

A grande dependência de compras externas de fertilizantes pelo país –maior importador global desses insumos– é uma situação que preocupa o agronegócio brasileiro, disse a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, que afirmou que o plano deve ser tratado como uma política de Estado, e não de governo.

No médio prazo, o programa tem potencial de aumentar em 35% a produção nacional de fertilizantes até 2025, com capacidade de atrair investimentos da ordem de 4 bilhões de reais por ano, afirmou o Sindicato Nacional da Indústria de Matérias-Primas de Fertilizantes (Sinprifert).

No entanto, o plano depende também de uma mudança na cobrança de ICMS, que hoje é zerado para a importação, mas tem uma tarifa de até 8,4% para a produção nacional.

“Imposto sobre fertilizante é tudo zerado. Todas as posições sobre fertilizantes importantes, grandes volumes, são todos zerados, desde imposto de importação, IPI, PIS/Cofins, tudo, todos os impostos federais. Onde incide o imposto: o ICMS”, disse Luís Eduardo Rangel, diretor de programas do Ministério da Agricultura.

Rangel explica que desde 1997 o Conselho dos Secretários de Fazenda Estaduais (Confaz) reduziu o ICMS de toda a cadeia de insumos para a agricultura, mas no caso dos fertilizantes criou uma distorção ao zerar o imposto para produtos importados, mas manter cobranças para a produção nacional.

Um acordo feito em 2021 no Confaz prevê uma equalização dos impostos nos próximos cinco anos, aumentando o dos produtos importados para 4% e reduzindo o da produção nacional também para 4%. Até o momento, no entanto, nem todos os governos estaduais fizeram os decretos necessários para as mudanças.

“Esse assunto estava tão discrepante que a gente conseguiu aprovar isso no Confaz”, disse Rangel, acrescentando que o governo vai monitorar o cumprimento do acordo.

Embora a situação da dependência externa de fertilizantes tenha sido acentuada com a guerra na Ucrânia, envolvendo a Rússia –normalmente o principal fornecedor aos brasileiros–, o plano mira o longo prazo.

Segundo a ministra, a dependência de fertilizantes do Brasil em 2050 será “proporcional à grandeza da nossa agricultura”.

“Mas teremos nossa dependência externa bastante reduzida… Não estamos visando a autossuficiência… as commodities continuarão circulando em ambiente de livre mercado… entretanto, precisamos garantir o suprimento para a nossa mais importante atividade econômica”, afirmou Cristina.

Segundo a ministra, a meta, para 2050, é poder suprir cerca de 50% dos fertilizantes utilizados no Brasil com a produção nacional. Hoje, o Brasil importa 85% da sua necessidade, chegando a 96% no caso do potássio.

O programa prevê incentivos à indústria nacional, com linhas de financiamento e atração de investimento privado para exploração de minas de potássio e fosfato, entre outros pontos.

Dessa forma, o governo pretende reduzir a dependência da China, Canadá e Marrocos –bem como da Rússia e de Belarus, cujas exportações estão agora severamente prejudicadas por sanções.

O Canadá é a maior fonte de potássio do Brasil, nutriente que representa 38% do uso doméstico de fertilizantes, mas a Rússia e Belarus juntas fornecem quase metade dos suprimentos.

O fósforo representa 33% do uso total de fertilizantes no Brasil, enquanto os nitrogenados representam 29%, segundo o ministério.

Entre as metas do plano, consta que o país pode atingir produção de 1,6 milhão de toneladas de nitrogênio ao ano em 2025; 1,9 milhão em 2030; 2,3 milhões em 2040; e 2,8 milhões em 2050, em termos de capacidade instalada.

Para a rocha fosfática, espera-se avançar para 14 milhões de t/ano em 2030; e crescer para 21 milhões de t/ano desse produto em 2040; e 27 milhões de t/ano em 2050, também em termos de capacidade instalada.

E no caso da produção nacional de potássio (K2O), elevar a pelo menos 2 milhões de toneladas até 2030; 4,0 milhões de toneladas até 2040 e 6,0 milhões de toneladas até 2050, em termos de capacidade instalada, entre outras iniciativas.

Mas especialistas alertam que serão necessários anos de investimentos pesados, e há algumas dificuldades em termos de recursos minerais.

Marcelo Mello, chefe da mesa de fertilizantes da StoneX, disse que as minas de potássio do Brasil não são tão competitivas quanto as localizadas no Canadá, Belarus e Rússia, enquanto as reservas de fósforo não se comparam às de Marrocos, Arábia Saudita, Rússia e China.

“As minas dependem de Deus colocá-las lá”, disse ele.

Um projeto de potássio promissor do Brasil está na região amazônica, e poderia produzir cerca de 2 milhões de toneladas por ano, disse Mello, o que atenderia apenas parte do consumo anual do Brasil de cerca de 13 milhões de toneladas.

A produção de fertilizantes nitrogenados exigiria grandes investimentos industriais e enormes quantidades de energia, o que não seria barato no Brasil, acrescentou Mello.

OBRAS

Segundo o secretário especial para Assuntos Estratégicos do Ministério da Agricultura, Flávio Rocha, o governo deve apoiar a conclusão de obras para ampliação da capacidade produtiva nacional, entre outras iniciativas.

Segundo Rocha, foram identificados 21 projetos –obras inacabadas e outras que ainda não saíram do papel– que poderiam estar concluídas e gerando produção nacional de adubos, acrescentou ele, sem dar detalhes.

“Alguns projetos ainda não foram iniciados, outros estão em várias fases de execução”, afirmou, citando a fábrica de nitrogenados de Três Lagoas (MS), em negociação entre a Petrobras e a russa Acron.

Ainda de acordo com o plano, ações da Embrapa sobre otimização do uso de fertilizantes podem promover uma economia de 20% no uso de adubos, com redução de custos potenciais da ordem de 1 bilhão de dólares na safra 2022/23.

A empresa de pesquisa agropecuária fará uma “caravana” às regiões produtivas para prestar assistência técnica aos agricultores, informou a Embrapa na semana passada.

(Por Lisandra Paraguassu)

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