Enquanto os Estados Unidos registram anualmente cerca de 100 milhões de visitas a salas de emergência provocadas por acidentes de consumo, o Brasil não tem dados precisos sobre esse tipo de ocorrência. O Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) quer estimular a população a relatar esse tipo de situação aos órgãos competentes.

O comparativo foi feito nesta quinta-feira (14) pelo coordenador executivo de Gestão Inmetro, Paulo Coscarelli, responsável pelo Sistema Inmetro de Relatos de Acidentes de Consumo (Sinmac), criado em 2013.

Os acidentes de consumo geram nos Estados Unidos um custo de US$ 1 trilhão com o tratamento de vítimas pelo sistema de saúde, com indenizações pagas pelo Judiciário, e ainda com danos às propriedades.  “Ainda que não tenha dados concretos, a gente pode estimar que o problema no Brasil seja tão grande como é lá, nos Estados Unidos”, frisou Coscarelli. O mais importante, segundo ele, é que o consumidor se perceba como um ator fundamental na definição de políticas públicas voltadas para a redução de acidentes provocados por produtos e serviços inseguros que são oferecidos no Brasil.

“O consumidor precisa se sentir empoderado desse papel que ele possui porque ele detém uma informação e precisa fazer chegar essa informação até as autoridades como o Inmetro”. Paulo Coscarelli disse que esse relato de acidentes de consumo dá oportunidade para o Inmetro e outras autoridades públicas para adotar ações de correção quando um acidente acontece e, mais importante ainda, ações de prevenção para que novos incidentes não ocorram.

Ocorrências

Segundo o Inmetro, queda de escada de alumínio, corte na mão ao abrir uma lata de conserva ou arranhões no rosto de criança provocados por objetos pontiagudos no carrinho de bebê são ocorrências que caracterizam acidentes de consumo. Eles acontecem com certa frequência e podem afetar a saúde e a integridade física de uma pessoa.

O Sinmac funciona como um banco de dados, fornecendo relatórios e estatísticas registrados no país, com filtros por produto, classe de produto e estado, bem como estatísticas que permitem estimar os impactos destes eventos no sistema de saúde, com o tratamento de vítimas, e na produtividade do país, com o afastamento de consumidores que se acidentam em seus postos de trabalho, informou o Inmetro.

Lesões

Coscarelli explicou que um acidente provocado por um produto inseguro pode gerar uma lesão que obrigue o consumidor a ser atendido na emergência de algum hospital ou mesmo ser internado, provocando impacto no sistema de saúde no país. No caso de um trabalhador que perca dias parado por conta de um acidente de consumo, o país perde produtividade, ressaltou. “Dependendo da gravidade da lesão e de quem sofrer essa lesão, esse acidente pode gerar um custo social bastante grande”.

Uma criança que se acidenta e sofre uma amputação, ou que fica paraplégica ou tetraplégica por causa de um acidente provocado por um produto ou serviço inseguro, gera um impacto na família bastante grande. A associação desse tipo de evento com o índice de separações e divórcios é elevado, disse o coordenador. “São os familiares que buscam culpados e isso acaba desfazendo o núcleo familiar”. Lamentou ainda que o impacto no Judiciário é elevado, porque muitos consumidores buscam indenizações na Justiça.

A mensagem que o Inmetro quer passar para o consumidor é que ele relate qualquer acidente de consumo que sofrer ou alguém de sua família, “porque, com a informação que chega para a gente, conseguimos analisar e, se for o caso, podemos abrir uma investigação para entender um pouco melhor como e por que aquele acidente aconteceu. E a partir desse entendimento, a gente consegue ajudar na formulação de políticas públicas para reduzir esses acidentes”.

Conscientização

O Inmetro quer que o consumidor se conscientize de que tem que relatar esses acidentes. Ele pode fazer isso no Sinmac. “A gente acumula informações e com base nelas já foi feito muita coisa. Muitos produtos foram regulados com base nas informações desse banco de dados, houve muitos recall (pedido de devolução de um lote ou de uma linha inteira de produtos feita pelo próprio fabricante, pela descoberta de problemas relativos à segurança do produto)”.

De acordo com o Inmetro, houve uma queda significativa de relatos de consumidores.

O Sinmac recebe, em média, 300 relatos anuais mas, até outubro foram relatados apenas 130 acidentes. “Em novembro, não houve (relato) nenhum”, disse Coscarelli. Ele considerou muito baixa a quantidade de relatos por ano.

Paulo Coscarelli destacou que também os médicos e enfermeiros de hospitais são importantes fontes de informação sobre esses acidentes de consumo e é preciso que façam esses dados chegar ao Sinmac. “É tentar dar uma unificada nesses sistemas que existem, para que essas informações sejam convergentes e acabem caindo dentro de um mesmo sistema. Aí, essas ações corretivas e de prevenção serão tão mais importantes quanto for a riqueza que a gente tem disponível, quanto mais precisas forem as estatísticas que temos. Por isso, é tão importante o relato dos consumidores”.

Diagnóstico

O diagnóstico do Inmetro é que o consumidor, como não conhece o que é um acidente de consumo, não sabe identificar quando ele acontece. “Aí, como ele não conhece e não identifica, ele não relata”. Outro comportamento observado pelos técnicos do Inmetro é que o consumidor brasileiro se sente constrangido a relatar acidentes causados por produtos piratas, ou contrabandeados, dependendo de qual seja o resultado, porque se sente responsável de certa forma pelo que ocorreu e acha que vai ser julgado por isso. Coscarelli deixou claro que o Sinmac não faz julgamento de consumidores; é apenas um sistema de relatos de acidentes de consumo.

O coordenador executivo de Gestão do Inmetro enfatizou que o consumidor tem que ser pró-ativo. Precisa compreender o seu papel para a formulação de políticas públicas. Coscarelli disse que no âmbito do Conselho Nacional de Combate à Pirataria, o Inmetro pretende aproveitar o gancho da campanha contra a pirataria e pelo consumo de produtos originais para mostrar ao consumidor que ele está levando para casa um produto aparentemente mais barato mas que pode causar danos bem elevados. “Aquele produto pode provocar um acidente e tem alguns riscos associados, como partes pequenas que as crianças podem engolir ou uma borda cortante, mas tem riscos que são invisíveis. Um exemplo é a quantidade de chumbo que tem na tinta de um brinquedo pirata que pode causar impacto direto na saúde da criança. Ou mesmo essa criança, ao se tornar adulta, no caso de uma menina, pode inclusive se descobrir infértil em função do acúmulo de chumbo no organismo. Essas questões são importantes de serem divulgadas, avaliou Coscarelli.