Adidas, Puma, Coca-Cola, Starbucks, Unilever, Ford. Não tem um dia que outra grande marca não remova seus anúncios do Facebook, uma campanha que atinge o cerne de seu modelo econômico, embora o impacto a longo prazo desse movimento permaneça incerto.

Mais de 400 empresas aderiram à campanha #StopHateForProfit para protestar contra o discurso de ódio na Internet e suspenderam sua publicidade no Facebook e Instagram durante o mês de julho. Outros foram além e pararam de anunciar em todas as redes sociais.

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Além do dano incontestável causado à sua imagem, há dúvidas sobre quais consequências essa campanha terá nessas plataformas que dependem quase completamente da publicidade. Até agora nenhum governo ou órgão regulador foi capaz de medir a ascensão dessas grandes empresas.

O Facebook, muitas vezes criticado por sua abordagem tímida no controle de conteúdo, fez uma série de anúncios nos últimos dias, pouco característicos de sua política.

Proibiu o movimento da extrema direita “Boogaloo”, prometeu destacar as informações com fontes seguras e reforçou sua política de moderação de conteúdo.

“Até agora, as redes sociais conseguiram se esquivar com discursos das pressões sobre a moderação dos conteúdos mais perigosos, mas o golpe é para suas carteiras”, explica Laurent Benzoni, professor da Universidade de Paris Panthéon-Assas.

“Não sei como eles encontrarão um compromisso no qual demonstrem que não são editores” da imprensa, um papel que eles não querem desempenhar, “e como poderão tranquilizar os anunciantes” sobre o conteúdo, acrescenta.

Daniel Salmon, analista da BMO Capital Markets, acredita que não haverá “impacto financeiro tangível” por enquanto.

– Base de PEMEs –

O Facebook, por exemplo, pode contar com uma base sólida de pequenas e médias empresas que colocam anúncios em sua plataforma, cerca de oito milhões no total.

De acordo com cálculos da empresa Pathmatics, citada pela CNN, as cem marcas que mais gastam no Facebook foram responsáveis por apenas 6% de seus US$ 70 bilhões em receita de publicidade no ano passado.

“É difícil para as pequenas empresas abandonarem o Facebook”, disse Nina Goetzen, analista especializada no setor de publicidade, em um podcast recente.

Debra Aho Williamson, analista da eMarketer, acredita que essa mobilização é “diferente” daquela que se seguiu ao escândalo após revelações de que o Facebook permitiu à Cambridge Analytica acessar as informações pessoais de seus usuários.

Anunciantes que aderiram ao boicote “são aqueles que têm histórico de se posicionar em questões de justiça social”, acrescenta.

O ponto de virada, estima, viria se gigantes como Proctor & Gamble ou Amazon se juntassem ao movimento. Mas essas companhias abandonariam a possibilidade de adaptar diretamente a publicidade aos clientes, o que o Facebook e outras plataformas oferecem graças à quantidade de dados pessoais que coletam sobre seus usuários?

As redes sociais “construíram seus modelos de negócios com base em publicidade direcionada” usando informações pessoais obtidas dos usuários, lembra o professor Olivier Bomsel, da Mines Paris Tech University.

As plataformas “têm um incentivo para maximizar sua audiência criando histórias sensacionalistas, exacerbando as diferenças de opinião, os conflitos de valores”, acrescenta.

O chefe de assuntos públicos da rede, Nick Clegg, negou em uma entrevista recente na Bloomberg TV que a plataforma recorra a esse tipo de estratégia.

“Não nos beneficiamos do ódio, não temos nenhum incentivo para ter ódio na nossa plataforma, não gostamos, nossos usuários não gostam, os anunciantes também não gostam”, garantiu.

“Nosso trabalho é minimizá-lo o máximo que pudermos, mas não quero fingir que podemos eliminá-lo”, acrescentou.

Mesmo que a campanha contra o Facebook obtenha resultados, o controle a longo prazo das grandes plataformas e seu crescente poder se tornará uma questão política.

“Como os anunciantes financiaram essas plataformas, temos o dever moral de criar soluções alternativas”, diz Joy Howard, diretora de marketing da Dashlane, gerente de senhas e informações pessoais.

“Mas apenas instituições eleitas democraticamente podem efetuar mudanças duradouras”, indica.