O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) poderá perder até R$ 14,6 bilhões com o grupo Odebrecht, pivô do esquema de corrupção investigado pela Operação Lava Jato. A estimativa, revelada ao jornal O Estado de S. Paulo pelo presidente do banco, Gustavo Montezano, faz parte do esforço de explicar a suposta “caixa-preta” do BNDES. Parte dessa perda potencial ficará com o Tesouro Nacional, que deu garantia em empréstimos para outros países contratarem a empreiteira baiana em obras de infraestrutura.

“Não é uma história bonita. O grupo por si só meteu os pés pelas mãos economicamente também. Certamente é o grupo econômico que mais trouxe prejuízo econômico ao banco na história”, disse Montezano, ressaltando que, apesar de diversas investigações internas e externas, não há indícios de envolvimento do BNDES no esquema de corrupção.

O grupo Odebrecht, que pediu recuperação judicial, é o terceiro maior cliente do BNDES nas duas últimas décadas. São R$ 51,3 bilhões, em valores corrigidos pela inflação, liberados entre 2003 e 2018, em empréstimos, participações acionárias e em títulos de dívida de 49 empresas controladas pelo conglomerado baiano, segundo dados que serão divulgados pelo banco nesta segunda-feira.

Instrumento que tenta evitar a quebra de empresas a partir de negociação com os credores, a recuperação judicial da Odebrecht, com 21 firmas no total, soma R$ 98,5 bilhões em dívidas. Embora haja duplicação de valores e dívidas intercompanhias, é considerada a maior recuperação da América Latina.

Na conta da perda potencial do BNDES, R$ 8,7 bilhões estão nas recuperações judiciais da Odebrecht e da Atvos, antiga Odebrecht Agroindustrial, subsidiária de açúcar e etanol, que entrou com o pedido em maio – os processos correm em paralelo.

Segundo Montezano, o banco não deverá perder a totalidade das dívidas na recuperação, mas evitou estimar o quanto poderá recuperar. Por precaução, o BNDES “provisionou” o total no balanço financeiro. Isso significa que o banco registra preventivamente a perda, derrubando o lucro líquido.

Exterior

O cálculo das perdas inclui ainda US$ 900 milhões (cerca de R$ 3,7 bilhões) em empréstimos para países estrangeiros que contrataram a Odebrecht para tocar obras e estão inadimplentes – Venezuela, Cuba e Moçambique. Essa perda não ficará com o BNDES, mas, sim, com o Fundo de Garantia à Exportação (FGE), formado com recursos do Tesouro Nacional, que garantiu as operações.

Fecham a conta dois investimentos em participação acionária. São praticamente certas as perdas de R$ 800 milhões com o investimento na própria Atvos e de R$ 1,4 bilhão na Odebrecht Transport (OTP), operadora de concessões em logística. As perdas com essas participações já foram registradas como “baixas contábeis” no balanço financeiro do BNDES.

Embora as investigações tenham estimado que o grupo Odebrecht pagou R$ 1 bilhão em propinas entre 2004 e 2014, segundo Montezano, as perdas do BNDES não têm a ver com corrupção, mas, sim, com más escolhas associadas às políticas de financiamento. “De tudo o que soubemos até hoje e foi investigado internamente e externamente, não tem qualquer indício de corrupção de nenhum funcionário do banco”, disse.

Para Sérgio Lazzarini, do Insper, que estuda o papel do BNDES, faltou “critério” na seleção dos projetos financiados, que deveria ir além de apoiar “grandes grupos” em setores específicos. “Um banco público tem de fomentar algo de interesse público”, afirmou Lazzarini.

Já na visão do economista Júlio Gomes de Almeida, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), os valores bilionários emprestados pelo BNDES para as empreiteiras, em parte, são resultado do fato de faltarem fontes de financiamento de longo prazo.

Como a infraestrutura requer empréstimos por prazos elevados, o banco era a fonte preferencial. Segundo Almeida, fazia sentido apoiar tanto a infraestrutura quanto o setor de carnes e a exportação de aviões, apesar de alguns excessos. Procurada, a Odebrecht não se pronunciou até o fechamento da reportagem. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.