O dia 19 de outubro deverá ficar marcado na história dos criptoativos como a data em que Wall Street finalmente se curvou diante desse investimento revolucionário. Foi a estreia do ProShares Bitcoin Strategy, um Exchange Traded Fund (ETF) dedicado a derivativos de bitcoins. Quem desenvolveu o produto, que será negociado com o código de Bito, foi a gestora americana ProShares, uma casa com US$ 67 bilhões em ativos especializada em ETFs, que são fundos cujas cotas são negociadas no pregão como se fossem ações. “Acreditamos que vários investidores aguardam ansiosamente o lançamento de um ETF vinculado ao bitcoin”, disse o CEO da ProShares, Michael L. Sapir. “O Bito proporcionará acesso ao bitcoin para quem se sente confortável comprando ações e ETFs, mas não deseja aprender a negociar criptomoedas.”

As declarações de Sapir são um dos raros exemplos em que as palavras de um executivo em um comunicado ao mercado refletem a mais pura verdade. A chegada do Bito aos pregões elimina o principal entrave que vinha impedindo a adoção dos criptoativos pelo mundo dos investimentos formais. Desde 2009, quando os primeiros bitcoins foram minerados e vendidos, todas essas transações ocorriam por meio de exchanges, que se apresentam como bolsas, mas na prática são corretoras que também podem operar carteiras próprias. São organizações sérias e confiáveis, mas que não estão totalmente sujeitas à regulamentação formal dos xerifes do mercado. E essa característica foi suficiente para limitar a atuação dos investidores institucionais como fundos de pensão e seguradoras, que têm mais poder de fogo.

Mais do que isso, a ausência de um instrumento formal listado em um pregão e com preços “oficiais” — e as aspas aqui são necessárias — dificulta a profissionais, como tesoureiros de bancos, montar estratégias de trading com esses ativos. Com o ETF, será possível a eles fazer hedge ou montar posições alavancadas. Será possível especular contra ou a favor do Bito por meio de opções de compra ou de venda do bitcoin. E aproveitar que o bitcoin tem uma das características mais desejadas em qualquer ativo: volatilidade. As criptomoedas são ativos voláteis. Além disso, é um mercado em expansão. Há cerca de 6,5 mil criptomoedas registradas, e esse número cresce diariamente. A chegada de um ETF abre espaço para que mais e mais gestoras lancem produtos parecidos dedicados a outras moedas. Apesar de todos os recursos tecnológicos e de todas as facilidades, muitos investidores individuais ainda receiam navegar nesses mares que são potencialmente agitados e exigem um pouco de conhecimento técnico.

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“A alta do bitcoin provocada pela chegada desse ETF é apenas o começo” Eduardo Carvalho CEO da Dynasty Global Investments AG.

VALORIZAÇÃO O mercado começou a comemorar o lançamento do Bito na sexta-feira (15), devido a uma derrapada da Securities and Exchange Commission (SEC), a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) americana. Na tarde da quinta-feira (14), a conta da SEC no Twitter publicou um texto sobre os riscos de investir em derivativos de criptomoedas. “Antes de investir em um fundo que possui contratos futuros de bitcoin, certifique-se de pesar cuidadosamente os riscos e os benefícios potenciais”, afirmou a postagem na rede social.

Nada além da advertência rotineira do regulador, cuja principal função é compensar a assimetria de informações entre os profissionais do mercado e os investidores individuais. Só por um pequeno detalhe: a SEC ainda não havia aprovado os ETFs, algo que ocorreria apenas na semana seguinte. Foi o suficiente para sustentar uma alta de 15% nas cotações em apenas sete dias, elevando o valor de mercado das criptomoedas para US$ 1,245 trilhão, ganho de US$ 162 bilhões nesse período. Na noite da quarta-feira (20) os bitcoins estavam sendo negociados a US$ 65 mil. “E eu não me surpreenderia se as cotações chegassem a US$ 70 mil ainda este ano”, disse o fundador e CEO da Dynasty Global Investments AG, Eduardo Carvalho. “O mercado de criptoativos está em franca expansão e a alta do bitcoin provocada pela chegada desse ETF é apenas o começo.” A Dynasty lançou sua criptomoeda, denominada D¥NS, que é vinculada a investimentos imobiliários em diversos países.

Apesar de representar uma evolução em relação ao que já existe, o Bito também pode oferecer alguns riscos aos investidores, segundo especialistas do mercado americano. Os ETFs são negociados em Nova York, e, segundo a ProShares, investirão “principalmente” em contratos futuros do bitcoin negociados na Bolsa de Chicago. Os contratos futuros são liquidados financeiramente — ou seja, no vencimento o investidor recebe ou entrega dólares, e não bitcoins — devido à dificuldade operacional de entregar a criptomoeda. No jargão do mercado, isso se chama liquidação por diferença. Esse é um mercado grande, mas o mercado de ETFs é várias ordens de grandeza maior. Há fundos desse tipo dedicados a todas as classes de ativos, em todas as combinações possíveis, e a demanda por eles só faz crescer. Não se descarta, portanto, o risco de que os ETFs fiquem grandes demais, o que provoque distorções de preço nos mercados futuros, gerando prejuízos aos investidores.