Quando tem vento de popa, você coloca a vela a 90 graus e vai navegar. Quero ver navegar na calmaria. A frase do executivo Fábio Schettino reflete o ano de 2020 para a Hidrovias do Brasil. A empresa de soluções logísticas integradas em transporte hidroviário navegou contra a corrente, sob a tormenta de uma pandemia jamais enfrentada em 11 anos de história, e alcançou porto seguro. Ou melhor, resultados surpreendentes. Crescimento de 56% na receita em relação a 2019, para R$ 1,5 bilhão, além de R$ 637 milhões de Ebitda, quase 40% acima do registrado no ano anterior. E o próximo destino se mostra promissor. A companhia já projeta investimento entre R$ 2,5 bilhões e R$ 3 bilhões até 2025 no desenvolvimento dos negócios, para evitar qualquer risco de encalhe. “Escolhemos estrategicamente estar dispostos a setores em que o Brasil é um player global”, disse o presidente. “Em 2020, a agricultura, a mineração, o papel e celulose e a bauxita, que são os nossos principais produtos transportados, sofreram menos com os efeitos da pandemia.”

A Hidrovias opera no corredor logístico Norte (Miritituba-Barcarena, no Pará), onde realiza o escoamento de grãos da região Centro-Oeste, além de operação de cabotagem para o transporte de minérios. O sistema tem capacidade para movimentar até 6,5 milhões de toneladas de grãos por ano. Já o corredor Sul é desenvolvido pela companhia na hidrovia Paraguai-Paraná, com capacidade para mais de 17 milhões de toneladas de cargas diversas, como commodities agrícolas, minérios e fertilizantes. Além disso, administra um terminal especializado em cargas sólidas a granel dentro do porto público de Montevidéu, no Uruguai. Somados, os dois canais representam capacidade de escoar 23,5 milhões de toneladas – em 2020, a companhia transportou 7 milhões em suas hidrovias, 30% da capacidade, e a expectativa é atingir entre 10,2 milhões e 11,2 milhões até 2025.

COMBATE À POLUIÇÃO Empresa iniciará em 2022 a operação de empurradores de manobra elétricos para reduzir a emissão de poluentes na atmosfera. (Crédito:Divulgação)

Schettino destaca que a Hidrovias não é “um caminhão do rio”. A companhia dispõe de uma logística integrada, com transbordo de carga, navegação e porto de exportação. “Pego o minério da Vale em Corumbá e levo até San Nicolas, na Argentina, por exemplo. Isso é um pouco do nosso DNA”, disse. Em abril, a empresa ampliou a atuação na América do Sul com a aquisição das operações da Imperial Logistics, com sede em Assunção, no Paraguai, e também atuante na hidrovia no Sul. O negócio adicionou empurradores troncais e barcaças aos ativos da Hidrovias do Brasil, além da concessão do Porto Baden, em Concepción (Paraguai), administrado em modelo de joint venture com a CIE, companhia do segmento de infraestrutura. O investimento total chegou a US$ 85 milhões.

O Brasil possui a maior bacia hidrográfica do mundo, com 7 milhões de quilômetros quadrados e, segundo o executivo, a matriz hidroviária no País não explora 7%. “Quando a Hidrovias começou, há 11 anos, transportavam-se 5 milhões de toneladas de granel no Brasil. No Rio Mississipi (Estados Unidos) eram 700 milhões de toneladas. Tem espaço para muito crescimento no Brasil e região.”

E nada melhor do que investimentos para expandir as operações. O montante de até R$ 3 bilhões inclui possíveis aquisições. Além da Imperial Logistics International, a Hidrovias já havia adquirido, no final de 2017, o negócio de granel da Log-In para o transporte de bauxita. Foram investidos R$ 680 milhões na transação. “A gente continua analisando possibilidades tanto no Brasil quanto na hidrovia Paraguai-Paraná.” O crescimento da empresa inclui ainda a diversificação das operações para Porto Velho com objetivo de acessar as regiões Oeste e o Noroeste do Mato Grosso, além do possível transporte de biocombustível pela hidrovia Paraguai-Paraná.

“A gente continua analisando as possibilidades de aquisição tanto no Brasil quanto na hidrovia Paraguai-Paraná” Fábio Schettino presidente da Hidrovias.

A preservação do meio ambiente também integra o programa de crescimento. A empresa já planeja a substituição de combustíveis fósseis por energias mais limpas. Para reduzir a emissão de gases poluentes gerados pela queima de óleo diesel, a Hidrovias iniciará em 2022 a operação de dois empurradores de manobra elétricos. Com a utilização dos modelos em construção no estaleiro Belov, na Bahia, a atmosfera deixará de receber anualmente até 2,1 mil toneladas de CO2 (gás carbônico). O montante envolvido no negócio não foi divulgado.

EXPANSÃO DA MALHA A companhia vive a expectativa pela implementação do projeto BR dos Rios, em desenvolvimento pelo Ministério da Infraestrutura, que incentiva o transporte hidroviário. Um estudo da Confederação Nacional do Transporte de 2019 aponta que o Brasil tem 63 mil quilômetros de vias navegáveis, dos quais apenas 19,5 mil (30,9%) são utilizados comercialmente. O baixo aproveitamento, de acordo com a análise, se deve a entraves de infraestrutura e de operação, por exemplo.

O presidente da Hidrovias afirmou ser favorável a todo programa de incentivo à competitividade e à desregulamentação de qualquer setor. Porém, se disse contrário à ideia de cobrança simples de pedágio para utilização de rios que hoje estão livres para a navegação. “Isso não agrega valor. Pelo contrário. Tira a competitividade do setor. É necessário que haja o desenvolvimento completo do sistema de transporte hidroviário”, disse. Se decisões governamentais não atrapalharem, o vento parece de popa.