Eras são feitas de símbolos. E ritos. Poucas marcas representam tanto o capitalismo quanto Coca-Cola e McDonald’s. Atuar no universo dos alimentos & bebidas tem muito a ver com isso, já que se tornam produtos acessíveis a literalmente todo o mundo. É nesse contexto que deve ser lido o anúncio da interrupção das operações da gigante americana de fast food na Rússia por causa da invasão à Ucrânia: o peso na narrativa da guerra é maior do que o financeiro. Fechar temporariamente as 850 unidades em solo russo significará abrir mão de US$ 50 milhões mensais, menos de um dia da receita global da rede. O simbolismo maior está em deixar a Rússia, mesmo que temporariamente, depois de 32 anos, quando a instalação de seu primeiro endereço no país, na Praça Pushkin, marcou o fim da União Soviética.

Muitos russos têm tentado, inclusive, vender os últimos itens da marca em plataformas de leilões. Um kit de embalagens de batatas, torta, suco e Big Mac era ofertado no site Avito por 50 mil rublos, cerca de US$ 480. Uma verdadeira aula sobre preço e valor. Caro? Pode ser, mas se trata de comprar uma relíquia de um dos maiores ícones do mundo do consumo, o Big Mac.

O sanduba, aliás, se tornará oficialmente tiozão. Vai fazer 55 anos. Foi criado na minúscula Uniontown (Pensilvânia), que tinha 17 mil habitantes na época (hoje tem menos de 10 mil), por Jim Delligatti, franqueado McDonald’s na região. Ele queria combater lanchões da concorrência – Whooper, do rival Burger King, e um chamado Big Boy, de uma rede local –, e insistia junto à alta direção do Mc para introduzir o burger duplo no cardápio.

Os executivos da rede relutavam, porque a introdução da novidade poderia atrapalhar o processo fordista de montar lanches criado pelos irmãos Richard e Maurice McDonald. Mas Delligatti conseguiu. Dois hambúrgueres, alface, queijo, molho especial, cebola e picles, num pão com gergelim entraram no cardápio no sábado 22 de abril de 1967, por US$ 0,45. Não era pouco. Custava três vezes mais que a versão básica da época, vendida a US$ 0,18.

Foi um sucesso. Em pouco tempo, estendeu a criação para mais três unidades suas. No ano seguinte, 1968, o lanche fazia parte de cada McDonald’s nos EUA. Em 1969, já representava 19% de todas as vendas da marca. Estima-se que hoje sejam vendidos pelo menos 900 milhões deles em uma centena de países a cada ano. Em 1986, a The Economist criou um indicador global lastreado no lanche. O Big Mac Index baseia-se na teoria da paridade do poder de compra e é seu exemplo perfeito. Como utiliza os mesmos ingredientes, o mesmo modo de preparo e a mesma receita no mundo todo, em tese deveria ter o mesmo preço em dólares em cada país. Mas isso não ocorre. Então, se em determinado local o preço em dólar for menor do que nos EUA, significa que naquele país a moeda está desvalorizada em relação ao dólar. Se o preço for maior, estará valorizada. Um símbolo capitalista e na teoria econômica.

Evandro Rodrigues