Em baixa em seu país, profeta no exterior? Em turnê pela Europa, longe dos reveses políticos nos Estados Unidos, Joe Biden procura se apresentar como o grande estrategista da unidade ocidental.

Na terça-feira, enquanto o presidente americano jantava com o rei da Espanha e os líderes que participam de uma cúpula da Otan em Madri, a Casa Branca convocou uma coletiva de imprensa.

Objetivo: enaltecer o papel do democrata de 79 anos no acordo que acabava de ser assinado entre a Turquia, por um lado, a Suécia e a Finlândia, por outro, sobre a adesão à Otan dos dois países nórdicos, historicamente não alinhados.

Uma autoridade americana comentou extensivamente os esforços de Joe Biden nos bastidores para conseguir a retirada do veto de Ancara, entre um telefonema de última hora ao turco Recep Tayyip Erdogan e a luz verde do presidente dos EUA antes do anúncio formal do acordo.

A mesma fonte lembrou como Biden incentivou a Suécia e a Finlândia, organizando uma teleconferência no Salão Oval e depois uma recepção na Casa Branca para os líderes dos dois países.

Alguns especialistas estimam que a perspectiva de um encontro bilateral com Joe Biden, prevista para esta tarde, ajudou a convencer Erdogan a levantar seu veto à adesão da Finlândia e da Suécia.

“Trabalhamos conscientemente (…) enquanto tentávamos, em público, manter a discrição”, disse o funcionário.

Na sexta-feira, antes de partir para a cúpula do G7 na Alemanha e depois para a da Otan em Madri, o presidente americano foi atingido por uma decisão da Suprema Corte de abolir o direito constitucional ao aborto, e à qual não tinha realmente uma resposta.

É um Biden muito mais sorridente que se mistura com seus colegas desde sábado, posando para fotos nos Alpes da Baviera e anunciando em Madri reforços militares americanos na Europa.

O presidente americano gosta, de fato, desses encontros diplomáticos, ele que orquestrou a unidade dos ocidentais contra a Rússia desde a invasão da Ucrânia – um perigo que os americanos foram os primeiros a denunciar.

Joe Biden, no entanto, frustra os jornalistas que o acompanham e que esperavam declarações mais contundentes desde sua chegada à Alemanha.

“Com tudo o que está acontecendo nos Estados Unidos neste momento (…), a Casa Branca não tem muito interesse em criar distração adicional”, explica Brett Bruen, ex-assessor de Barack Obama.

Com o debate sobre o aborto, assassinatos por arma de fogo, inflação galopante, o presidente americano já tem muito o que fazer.

“Biden não tem muitas novidades a anunciar nessas cúpulas. Parece suficiente para ele algumas fotos mostrando sua autoridade no cenário internacional antes de retornar e se concentrar na campanha” para as eleições legislativas de meio de mandado.

As pesquisas apontam uma derrota esmagadora para o campo democrata.

Discreto ou não, “é uma semana muito boa para Biden”, entusiasma-se James Jeffrey, especialista do Wilson Center e ex-embaixador americano na Turquia, elencando o reconhecimento pela Otan dos desafios representados pela China e o aumento dos orçamentos de defesa dos países-membros.

“Nada disso teria acontecido sem uma pressão maciça dos Estados Unidos e de Biden pessoalmente”, estima.

James Carafano, do think tank conservador Heritage Foundation, faz uma avaliação mais crítica de Joe Biden, que lhe parece “pouco dinâmico”.

“Mesmo no exterior, olhamos para o que está acontecendo nos Estados Unidos e temos uma opinião ruim sobre Biden. É difícil imaginar que essa viagem vá mudar a percepção”, afirma.

Para Marc Pierini, especialista do think-tank Carnegie Europe, os europeus estão preocupados com um enfraquecimento político do presidente democrata.

A perspectiva de ver “Donald Trump ou um de seus clones republicanos vencendo as eleições presidenciais de 2024 é uma grande preocupação”, estima.