O sucesso mundial da Body Shop, a multinacional inglesa de produtos de beleza que trabalha só com componentes naturais, inclusive da Amazônia, foi uma das inspirações para o grande salto que a Natura, uma das três maiores indústrias de cosméticos do Brasil, começa a dar agora em setembro. Há mais de dois anos a companhia decidiu iniciar pesquisas para desenvolver uma família de produtos que valorizasse a biodiversidade brasileira e usasse ingredientes como guaraná, maracujá, pitanga e cupuaçu. O resultado da empreitada é a nova linha Ekos de shampoos, condicionadores de cabelos, sabonetes e óleos, que já chegou às mãos do exército de 221 mil vendedoras autônomas da empresa. ?Queremos que esses produtos representem 10% dos nossos negócios no ano que vem e de 20% a 30% em uma década?, afirma o presidente de operações da Natura, Pedro Passos. Na realidade, os planos são ainda mais ambiciosos. A companhia pretende usar o Ekos como um dos pontos de apoio para entrar no mercado norte-americano até 2003. ?A biodiversidade do Brasil é hoje até mais valorizada nos Estados Unidos e na Europa do que aqui?, declara o executivo.

A estratégia de aproximação da Natura com os norte-americanos começa no ano que vem, quando o México passa a entrar também no portfólio de exportações da companhia. Atualmente, a empresa já comercializa seus produtos ? sempre por meio de vendedoras independentes ? para consumidores argentinos, chilenos, bolivianos e peruanos. Os países vizinhos respondem por cerca de 5% do faturamento total de R$ 1,2 bilhão e passaram a ter, recentemente, um reforço de publicidade de US$ 2,5 milhões para estimular as vendas. Mas a Natura quer mais, muito mais do que a América Latina, e por isso encara o projeto Ekos com a maior seriedade. ?Já investimos R$ 11 milhões nessa linha e mais R$ 6 milhões serão gastos em 2001 em laboratórios para explorar a flora da Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica?, ressalta Passos. A fase laboratorial é importantíssima, pois até agora a companhia apenas utilizou plantas já conhecidas pela maioria do público. ?Vamos em breve atrás da descoberta de compostos ativos ainda desconhecidos?. Isso porque apenas 1% da flora brasileira é catalogada cientificamente e Passos acredita que há muito a descobrir. ?As primeiras pistas sobre novos produtos serão dadas pelas populações locais das florestas, que conhecem muitas plantas e seus efeitos.?

A investida da Natura, que em maio de 2001 conclui a construção de seu imenso parque industrial em Cajamar, na Grande São Paulo, a um custo de R$ 110 milhões, pode mexer muito com todo o mercado de cosméticos. Atualmente 80% dos componentes processados nas empresas de produtos de beleza são importados. Se tudo der certo, a balança comercial tende até a sair beneficiada, com a exportação de substâncias para as grandes multinacionais da beleza. A Body Shop, por exemplo, já importa plantas da Amazônia. Mas a companhia inglesa e a Natura, apesar do interesse comum na biodiversidade, também têm grandes diferenças. Enquanto a primeira é radicalmente contra testes em animais e a decodificação de compostos ativos de plantas, a empresa brasileira atua nos dois campos. ?Temos reduzido as experiências com cobaias radicalmente nos últimos anos. Mas continuamos favoráveis às análises laboratoriais e à criação de produtos sintéticos, recursos que podem ajudar a melhorar a qualidade de vida das pessoas?, diz Passos.