Não é de hoje que pesquisadores, ambientalistas, investidores e líderes internacionais alertam para a catástrofe natural que está em curso na Amazônia brasileira. No atual ritmo de desmatamento, a região mais rica em biodiversidade do planeta está perdendo mais de 1 mil quilômetros quadrados por mês, o equivalente à cidade do Rio de Janeiro. Mas o governo federal se comporta como se estivesse tudo bem. A União Europeia já alertou para o assunto. E nada. Há um mês, fundos de investimento internacionais que gerenciam mais de R$ 20 trilhões em ativos puxaram a orelha do Brasil, pedindo que o País suspenda o desmatamento na Amazônia. Caso contrário, podem parar de investir aqui. O presidente da República deu de ombros. Até o ator americano Leonardo Di Caprio, um engajado defensor – e investidor – de causas ambientais, deu declarações em defesa da selva. Recebeu como resposta uma acusação pueril de estar financiando queimadas. Insanamente agarrado às suas certezas infundadas – como defender medicamentos sem eficácia comprovada contra o coronavírus –, o presidente nunca demonstrou a menor intenção de mudar de postura em relação à preservação da maior floresta tropical do mundo. Agora, na quarta-feira (22), surgiu uma semente de esperança.

Enxergando que não dá para esperar atitudes diferentes do governo, os três maiores bancos privados do País –Bradesco, Itaú Unibanco e Santander – resolveram agir em defesa da Amazônia e lançaram um plano conjunto para promover o desenvolvimento sustentável da região. A proposta das instituições inclui medidas importantíssimas, como estímulo às cadeias sustentáveis na região e viabilização de investimentos em infraestrutura para o desenvolvimento socioambiental (leia quadro). A ideia é que as medidas comecem a ser adotadas ainda este ano. O pacote de boas iniciativas foi apresentado ao governo por três altos executivos dos bancos: o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari; a vice-presidente do Itaú, Claudia Politanski; e o presidente do Santader, Sergio Rial. Do outro lado da mesa estavam o vice-presidente, Hamilton Mourão – que preside o Conselho Nacional da Amazônia Legal –, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e a ministra da Agricultura, Tereza Cristina. O recado dos bancos foi claro: sem preservar as riquezas naturais da Amazônia, o futuro do Brasil está inegavelmente comprometido. Após a reunião, Mourão disse ter comunicado aos executivos dos bancos que “seria importante eles pensarem em formas de financiamento para projetos em bioeconomia”.

Claudio Gatti

“Queremos dar passos concretos para tornar discurso em realidade. Proteger a Amazônia guarda boa parte das respostas corretas para um mundo que tem dúvidas e incertezas” Octavio de Lazari Junior presidente do Bradesco.

Num comunicado conjunto, os bancos afirmaram que “este projeto une Bradesco, Itaú e Santander pelo propósito de contribuir para um mundo melhor”. Segundo o texto, a ideia é que todos precisam assumir sua parcela de compromisso com as futuras gerações. “Por isso, lançamos uma agenda objetiva que pretende defender e valorizar a Amazônia, suas riquezas naturais, florestas, rios e cultura diversificada.” Os presidentes dos três bancos emitiram notas oficiais sobre o assunto, reforçando o caráter coletivo do programa. “Queremos dar passos concretos para tornar discurso em realidade. A Amazônia não é um problema. O ato de proteger a Amazônia guarda boa parte das respostas corretas para um mundo que tem dúvidas e incertezas”, disse o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari. Já o presidente do Itaú Unibanco, Cândido Bracher, disse que, como agentes importantes do sistema financeiro, as instituições bancárias compartilham das mesmas preocupações a respeito do desenvolvimento e da conservação da floresta. “Acreditamos que os três bancos têm forças complementares. Atuando de forma integrada, vemos grande potencial de geração de impacto positivo na região”, afirmou Bracher. Por sua vez, Sergio Rial, presidente do Santander, destacou o grande desafio que a causa representa. Segundo ele, é preciso uma atuação firme e veloz de todos os atores que puderem participar da construção de um modelo de desenvolvimento sustentável para a Amazônia. “Com a união de esforços da nossa indústria, conseguiremos fazer ainda mais por essa região, que tem um valor inestimável não só para o País, mas para todo o planeta”, afirmou Rial.

Olga Vlahou

“Com a união de esforços da nossa indústria, conseguiremos fazer ainda mais por essa região, que tem um valor inestimável não só para o País, mas para todo o planeta” Sérgio Rial presidente do Santander Brasil.

POSTURA O documento apresentado pelos bancos ao governo federal cobra um combate “inflexível e abrangente” em relação às queimadas e ao desmatamento ilegal na região. A mesma cobrança que já foi feita pelos mais diversos setores da sociedade e da economia, tanto do Brasil quanto do exterior. Uma diferença que se percebe dessa vez é que a postura dos três maiores bancos privados do País é conciliatória, propositiva, não apenas de críticas e acusações às atitudes atabalhoadas do presidente. “A esperança é de que essa atitude dos bancos leve o presidente a, finalmente, reconhecer que precisa estruturar políticas públicas de sustentabilidade em relação à Amazônia. É o que todos queremos e precisamos”, disse, à DINHEIRO, o diretor executivo de uma das maiores ONGs ambientais do mundo, sob condição de anonimato por ter projetos em parceria com o governo federal. Há, porém, uma questão que preocupa a todos os interessados em defender a floresta: ao destacar a necessidade de se combater, de forma “inflexível e abrangente”, desmatamentos e queimadas, o projeto dos bancos toca justamente numa das maiores feridas do governo federal em relação à Amazônia.

Gabriel Cabral

“Acreditamos que os três bancos têm forças complementares e, atuando de forma integrada, vemos grande potencial de geração de impacto positivo na região” Candido Bracher presidente do Itaú Unibanco.

Todas as vezes, sem exceção, em que o presidente foi confrontado com os fatos – contra os quais, não há argumentos – de que a destruição da floresta não para de aumentar em seu governo, ele reagiu com agressividade e negacionismo. No mês passado, a Amazônia Brasileira completou 14 meses seguidos de sucessivas altas nos índices de desmatamento. Ou seja, faz mais de um ano que, durante o atual governo, os ataques de madeireiros e fazendeiros à selva não param de crescer. De 2015 até hoje, junho foi o mês que teve a maior área de mata nativa derrubada: foram pouco mais de 1 mil quilômetros quadrados de floresta destruída, o equivalente a duas vezes a cidade de Porto Alegre e que representa alta de quase 11% em relação a junho do ano passado.

HAMILTON MOURÃO E RICARDO SALLES Representantes de um governo que se nega a reconhecer os problemas ambientais, eles receberam propostas em reunião com os bancos privados. (Crédito:Edu Andrade)

Por outro lado, a quantidade de operações do Ibama para reprimir crimes ambientais e de multas aplicadas pelo órgão nunca foi tão baixa. E enquanto Bradesco, Itaú e Santander decidem agir em defesa da Amazônia, o presidente do Banco do Brasil, Rubem Novaes, segue os passos do presidente do País. Recentemente, ele declarou que a imagem do Brasil diante do resto mundo em questões ambientais está mais suja do que mogno queimado por simples implicância com governos de direita. “É uma questão de narrativa”, disse Novaes, tentando lutar contra os fatos. O executivo da ONG ambiental ouvido pela DINHEIRO afirmou que o receio dos especialistas é que, mesmo com o esforço e empenho dos três maiores bancos privados do Brasil, o mandatário da Nação permaneça com sua postura negacionista, sem admitir que seu governo tem severas falhas em relação à política ambiental e ainda acreditando que meio ambiente é “coisa de comunista”, como já declarou. “Agora, só nos resta seguir trabalhando pela Amazônia e torcer para o presidente acordar para a realidade”, disse.