O Banco Central também deve anunciar aprimoramentos metodológicos para incorporar o impacto fiscal das operações do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) em suas estatísticas, disse nesta terça-feira, 18, o coordenador-geral de Estudos Econômico-Fiscais do Tesouro, Felipe Bardella.

Segundo o técnico, os dados de resultado primário divulgados pelo BC (e que valem para avaliar se o governo cumpriu ou não a meta fiscal do ano) não devem sofrer alterações, uma vez que a metodologia do Banco Central já captura esse efeito. Mas a estatística de dívida líquida deve sofrer impacto – o Tesouro disse não saber ainda com que viés.

“O Banco Central deve detalhar esses aprimoramentos”, disse o coordenador. “Esse novo processo está alinhado ao processo do Tesouro”, afirmou.

Bardella explicou ainda que só agora foi possível fazer esse ajuste na metodologia de resultado primário do Tesouro Nacional (mensurado a partir do fluxo de receitas e despesas).

“Não identificamos no ano passado que esse era o evento que estava gerando discrepância (em relação a resultado do BC), o que saltou aos olhos em 2016”, justificou. No ano passado, a discrepância “não explicada” atingiu R$ 8,94 bilhões, bem acima dos padrões históricos.

A partir de agora, o coordenador afirmou que a discrepância estatística existente entre o resultado primário do Tesouro e o do BC (que leva em consideração as mudanças no estoque da dívida líquida) deve voltar ao padrão. “Não há indício de nenhuma outra questão estrutural que precise ser atacada dentro da questão metodológica”, disse.

Escondido

A nova metodologia do Tesouro Nacional para mensurar o impacto do risco de calote do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) no resultado primário do governo visa a “explicitar algo que era escondido”, afirmou a secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi. Segundo ela, esse aprimoramento não será necessário no caso do Novo Fies.

“O programa que já existe ainda tem fluxos (de desembolsos) contratados, e Novo Fies entra já em bases equilibradas do ponto de vista fiscal, busca estabelecer contatos mais ajustados com os estudantes”, disse a secretária.

O Novo Fies, anunciado pelo governo no início do mês, prevê que as instituições de ensino assumam maior parte do risco de inadimplência. A cobrança também será feita de forma consignada na renda formal do estudante após a conclusão do curso.

O Tesouro ainda vai encaminhar ao Tribunal de Contas da União (TCU) uma nota técnica explicando as mudanças na mensuração do impacto do Fies antigo nas contas do governo. Segundo a secretária, a nota técnica é meramente explicativa, mas necessária, uma vez que o TCU é o órgão de controle da União.

O Tesouro anunciou nesta terça-feira, que vai alterar o registro das operações do Fies no resultado primário do governo central. Diante do elevado índice de calotes do programa, o órgão vai criar uma rubrica para refletir esse impacto, que hoje já aparece nas estatísticas do Banco Central. A estimativa do Tesouro é que a mudança vai gerar efeito de R$ 7,042 bilhões a mais em despesas primárias em 2016 e R$ 1,408 bilhão adicional nos gastos em 2017 até maio.

Com a exposição dos impactos fiscais do Fies, o relatório de avaliação de receitas e despesas do 3º bimestre vai incorporar a nova rubrica de despesas, tornando o Orçamento ainda mais apertado. “A previsão vai incorporar a despesa realizada até junho e a expectativa para ano. A rubrica do Fies de fato ainda não está incorporada em relatórios anteriores”, disse o coordenador-geral de Estudos Econômico-Fiscais do Tesouro, Felipe Bardella.

A opção do Tesouro foi a de tentar refletir o risco de calote por meio da metodologia de “net lending”, que é o resultado líquido de desembolsos e reembolsos dos financiamentos. Esse conceito já é adotado em contratos do Programa de Financiamento às Exportações (Proex) e do Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).

As projeções devem ser conservadoras, segundo Bardella. Nos contratos do Fies sem garantia do Fundo de Garantia de Operações de Crédito Estudantil (Fgeduc), será registrado como despesa primária o resultado integral dos desembolsos menos reembolsos (pagamentos recebidos).

“É tudo que desembolso a mais do que eu recebo. Se eu não recebo nada, o impacto vai ser no montante que estou desembolsando. Se inadimplência é elevada, eu não vou receber nada”, explicou o coordenador.

No caso dos contratos com garantia do Fgeduc, haverá dois tipos de contabilização. Como o fundo arca com 90% do contrato inadimplido, os 10% não garantidos serão contabilizados integralmente como uma perda.

Já os demais 90% garantidos pelo fundo serão ponderados pelo índice de inadimplência acima de 360 dias (a partir de quando o fundo passa a honrar as garantias). Em fevereiro de 2017, esse índice era de 16,4%.

O Tesouro considera que a ponderação pela inadimplência total acima de 360 dias também é uma forma conservadora de fazer a mensuração do impacto. Isso porque o Fgeduc tem capacidade para honrar integralmente até 10% de inadimplência dos contratos avalizados. O Tesouro poderia, portanto, considerar apenas a parcela acima disso como risco de calote a ser incorporado ao primário (neste caso, 6,4%). Segundo Bardella, essa opção foi discutida com o Banco Central, mas a conclusão foi pela adoção do índice cheio, mais conservador.

O fluxo de impactos fiscais deve continuar ainda por aproximadamente três anos e meio, devido à continuidade dos desembolsos de novos contratos da antiga modalidade de Fies. Mas depois a tendência é que o volume maior de reembolsos reverta o sinal desse impacto para superávit, disse Bardella. Em 2017, ainda não é possível afirmar que a despesa primária com Fies será menor ou maior que os R$ 7 bilhões verificados no ano passado, disse o técnico.