Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) – Depois de uma reunião bastante tumultuada, o presidente da CPI da Covid no Senado, Omar Aziz (PSD-AM), encerrou de vez a sessão na tarde desta quinta-feira e anunciou que o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), deixará de ser ouvido como testemunha e será convocado como investigado.

“Ele já está convocado. Fizemos inicialmente esta troca (de convocação para convite) em deferência ao deputado, que estava como testemunha. Agora ele terá que vir para tentar se defender”, disse Aziz.

A sessão já havia sido suspensa no início da tarde, depois de Barros ter afirmado que produtores de vacinas contra Covid-19 desistiram de vender ao Brasil por causa da atuação da CPI, o que revoltou alguns dos senadores e provocou mais uma confusão.

Depois da suspensão, em entrevista, Barros repetiu a afirmação.

“A CPI faz seu trabalho, mas o fato é que não há mais laboratórios procurando o Brasil porque não querem se expor a esse tipo de inquirição que a CPI faz”, afirmou.

Barros se referia à vacina chinesa CanSino, que tinha, até o mês passado, a empresa farmacêutica Belcher –cujos donos são amigos pessoais do deputado– como seu representante. A fabricante chinesa cancelou o contrato com a Belcher e está, no momento, sem representante para poder vender vacinas ao país.

No entanto, procurado pelo jornal Valor Econômico, o vice-presidente de Negócios Internacionais da farmacêutica, Pierre Morgon, negou que a decisão tenha relação com a CPI. Ao contrário, afirmou que a decisão foi tomada por questões de compliance da Belcher e que segue interessado em vender a vacina para o Brasil.

Antes de encerrar a sessão, Aziz acatou uma questão de ordem do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) que sugeriu o encerramento e uma consulta ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o que a CPI pode fazer em casos como de Barros, que mentiu mas tem imunidade parlamentar.

A legislação dá poderes jurídicos à CPI, que pode determinar a prisão de depoentes que mentem. No entanto, por Barros ser um deputado, Vieira considerou que seria necessário consultar o STF para ver até onde podem ir os poderes da CPI.

“É um momento grave da vida nacional que não comporta molecagem, que não comporta brincadeira. Existem repostas sérias. E não temos como fazer isso nessa circunstância e com esse depoente”, disse o senador, em proposta acatada pela presidência da CPI.

Barros é acusado de envolvimento no caso da compra –que no final acabou não sendo efetivada pelo Ministério da Saúde– da vacina indiana Covaxin. De acordo com o deputado Luís Miranda (DEM-DF), que fez a denúncia sobre os problemas na compra da vacina, ao contar ao presidente Jair Bolsonaro sobre o assunto, teria ouvido do presidente que seria um esquema de Barros.

O líder do governo afirmou que foi um mal-entendido, e que Bolsonaro teria apenas perguntado se ele estaria envolvido, ao ver sua foto em uma reportagem sobre o caso da empresa Global –proprietária da Precisa, então representante da Covaxin no Brasil– em que Barros é investigado.

Barros negou qualquer envolvimento com o caso da Covaxin e alegou nunca ter tratado do tema com ninguém no Ministério da Saúde.

“Não tenho relação pessoal com Maximiano (presidente da Precisa). O recebi no gabinete como ministro com a nossa equipe de compras. Está nos registros aqui que ele alegou, e eu também aleguei, que a última vez que nos encontramos foi quando eu era ministro. Portanto, nunca tratei de Covaxin”, afirmou Barros, que foi ministro da Saúde no governo Temer, à CPI.

Os senadores, no entanto, apontaram vários indícios da relação de Barros com a Global, empresa do mesmo dono da Precisa, que representava o laboratório indiano Bharat Biotech, fabricante da Covaxin. O deputado está sendo processado em um caso em que a Global recebeu pagamento adiantado para medicamentos de alto custo, como representante da Sanofi, e não entregou. Na época, Barros era o ministro da Saúde.

Os senadores vêem o mesmo modus operandi no caso da Covaxin, em que a Precisa também iria receber o pagamento antecipadamente, como constava nas primeiras faturas apresentadas pela empresa.

Barros alegou que havia um acórdão do Tribunal de Contas da União que permitia o pagamento antecipado em alguns casos. Pressionado pela senadora Simone Tebet (MDB-MS), que mostrou que o número citado pelo deputado não se referia a isso, mudou para um acórdão que seria do Ministério da Saúde.

Omar Aziz diz que a narrativa que Barros tenta emplacar é de alguém que “não tem compromisso com a vida”.

“Todas essas empresas (intermediárias na tentativa de venda de vacinas) têm ele no radar”, afirmou Aziz.

Barros alega que a decisão de interromper a sessão aconteceu porque a CPI não estava conseguindo “sustentar sua versão”.

“Estou sendo atacado desta forma porque sou líder do governo e me comportei dessa forma porque sou líder do governo”, disse Barros. “Se eu vier como convocado não vai mudar nada do que eu irei fazer, mas não vou permitir que narrativas se repitam sem contradita.”

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