A trama da Trousseau é tecida entre sonhos e realidade. Há 30 anos, a grife vem se consolidando como referência de luxo para o segmento de homewear no Brasil — um caminho até então pouco explorado por aqui. Expandiu seu universo para 200 mil clientes de varejo, 300 redes hoteleiras e uma nova carteira premium no setor hospitalar, sobretudo em São Paulo, onde fornece enxovais para o Vila Nova Star, símbolo de requinte da rede D’Or, o Einstein e os laboratórios Fleury. Companhias e pessoas que buscam a Trousseau por dar valor ao conforto — algo que foi reforçado pela pandemia. Hoje, um jogo de lençóis da marca pode custar quase R$ 6 mil. E 33% das vendas são para novos clientes. “Estamos vendo um público que consumia somente no exterior despertar para o produto nacional”, disse Romeu Trussardi Neto, sócio e co-fundador da Trousseau, em entrevista à DINHEIRO.

Ele tem motivos para celebrar as três décadas da companhia criada com a esposa Adriana. Com uma rede de 18 lojas próprias e 35 revendedores em todo o País, a empresa cresceu 40% em 2020 e espera repetir o número este ano. A boa fase, que obrigou a Trousseau a dobrar sua capacidade produtiva e logística, foi provocada em grande parte pelo crescimento de 500% do e-commerce no ano passado. Com o isolamento, as vendas on-line saltaram de 40 para 250 pedidos diários. “Entendemos o digital como um importante aliado da experiência física”, afirmou Trussardi Neto. Exemplo disso é a loja de Miami, criada há três anos, e que projetou a marca para o setor hoteleiro norte-americano e da região do Caribe.

Por aqui, a recuperação do turismo no País liberou a demanda represada de hotéis boutique, que hoje trabalham com capacidade máxima. A consultoria International Luxury Travel Market aponta alta das viagens de luxo durante a pandemia, que se confirma no Brasil, onde os patamares já estão nivelados com os de 2019. Embora positivo para o futuro dos negócios, o cenário pressiona a empresa, que é responsável por 100% da sua produção e enfrenta alta dos preços de matérias-primas como o algodão, cujo valor em dólar subiu 70%. “Os contratos com nossos fornecedores têm nos garantido atender essa procura mesmo com o estresse na cadeia”, disse o empresário. Ele prevê que o aquecido segmento de hotelaria deva puxar o crescimento de receita em 30% no próximo ano.

As projeções se baseiam também no êxito de colaborações com artistas renomados, que representam 15% do faturamento anual da empresa — o número é mantido em sigilo. A última linha, apresentada no segundo semestre, trouxe artigos de casa e moda criados pela estilista Paula Raia. Os preços variam entre R$ 550 (capa de almofada) e R$ 9,4 mil (duvet tamanho king). “O mix de peças quase exclusivamente artesanais — caso da coleção com a Paula — com uma produção de maquinário nos permitiu ampliar o sortimento”, afirmou o executivo.

DO PÂNICO À EUFORIA Apesar de ter driblado as adversidades econômicas na pandemia, a realidade não se impôs apenas da porta para fora na Trousseau. “Empreender não é um conto de heróis”, afirmou Trussardi Neto. Em março de 2020, seu pai, referência do setor têxtil e pioneiro no bordado industrial de qualidade no Brasil, foi internado com um quadro grave, mais tarde diagnosticado como infecção pela Covid-19. Ele morreria em agosto, após outras duas internações. Afetado pelo drama pessoal, o executivo ainda teve de lidar com um período sem vendas, cancelamento de pedidos e atrasos nos recebimentos. “Em momentos como esses, os alicerces da companhia são testados.” E foram. À época, a própria equipe se mobilizou para salvar a empresa. Do pânico à euforia em duas semanas com o boom do e-commerce, o negócio conseguiu responder imediatamente à nova demanda digital graças à reestruturação operacional.

Por carregar um pouco das 300 pessoas que fazem parte dessa trajetória, a Trousseau foi capaz de resistir ao tempo. Em reconhecimento a esse trabalho, as peças vendidas hoje vêm com cartões com rostos e histórias daqueles que tecem suas tramas. “Nossos produtos existem pela arte dessas pessoas. Queremos que os clientes também as reconheçam”, disse o co-fundador da marca. Com o peso desse legado nas suas mãos, Trussardi Neto não se diz mais preocupado com o ritmo de expansão, e sim em proteger a identidade da marca. “O foco é crescer de forma sustentável, no que entendemos como uma saída para atender os anseios do mercado sem destruir nossa própria essência”. Assim a empresa segue para os próximos 30 anos, num ritmo artesanal, aos poucos se consolidando no imaginário de novos consumidores.