Ao longo dos últimos meses, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, adiou o máximo que pôde o anúncio de sua pré-candidatura à Presidência da República. Em eventos empresariais, sempre que sondado, apenas sorria e salientava que a decisão seria tomada até o dia 7 de abril, prazo limite estabelecido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Agora é oficial. O comandante da economia no governo Michel Temer, que vai trocar o PSD pelo MDB, deixará o cargo nos próximos dias, algo que já era dado como certo há muito tempo pelos seus assessores mais próximos (leia reportagem aqui). Com um currículo recheado de cargos executivos nos setores público e privado, Meirelles sabe como é importante garantir uma sucessão serena em postos estratégicos. Por conta disso, entregou pessoalmente ao presidente Temer as peças que ele considera ideais para a montagem do quebra-cabeça da nova equipe. O mercado financeiro aprova suas indicações, que têm como objetivo principal a blindagem do núcleo econômico de eventuais interferências eleitorais.

As sugestões de Meirelles incluem a nomeação do secretário-executivo da pasta, Eduardo Guardia, para a cadeira de ministro da Fazenda, e a do secretário de Acompanhamento Fiscal, Mansueto Almeida, para o cargo de ministro do Planejamento. Dyogo de Oliveira, atual ministro do Planejamento, iria para a presidência do BNDES. O economista Paulo Rabello de Castro, que vai disputar a eleição presidencial pelo PSC, deixou o comando do banco estatal na terça-feira 27. “Todos esses nomes são tecnicamente competentes”, diz José Márcio Camargo, professor da PUC-Rio e economista-chefe da Opus Gestão de Recursos. “Na Fazenda, o ideal é que o Guardia assuma, pois, sendo o atual secretário-executivo, ele tem uma noção administrativa importante para os poucos meses que restam de governo.”

Nascido em São Paulo, em 1966, Guardia é doutor em economia pela USP. Tem um perfil discreto e uma forte ligação com o PSDB. Foi secretário do Tesouro Nacional do governo Fernando Henrique Cardoso, além de trabalhar na equipe do ministro da Fazenda, Pedro Malan. Em São Paulo, comandou a Secretaria estadual da Fazenda no governo Geraldo Alckmin, entre 2003 e 2006. Na gestão de Meirelles na Fazenda, poucas vezes foi possível ouvir o secretário-executivo comentando publicamente algum assunto. Uma delas aconteceu recentemente, quando o presidente americano Donald Trump anunciou uma sobretaxa ao aço e ao alumínio. “O efeito prático disso é que pode desencadear uma guerra comercial na reação de outros países”, disse Guardia, no começo de março, em evento na Advocacia Geral da República (AGU). “Isso vai na contramão do livre-comércio e do aumento do fluxo de mercadorias, serviços e capitais, que é o que a gente defende e entende que seja o caminho para o desenvolvimento.”

Já Mansueto tem um perfil mais extrovertido e, na condição de especialista em contas públicas, sempre foi requisitado pela imprensa a dar opiniões sobre os problemas fiscais do País. Nascido em Fortaleza, em 1967, é mestre em economia pela USP e funcionário de carreira do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Assim como Guardia, participou da equipe do ex-ministro Malan. O cargo de ministro do Planejamento, dado o atual contexto desafiador para as contas públicas, cairia como uma luva para quem é expert em cortar gastos. “É um ajuste gradual porque vem da despesa, é muito mais lento, porque a despesa no Brasil é muito engessada”, afirmou Mansueto, no fim do ano passado, ao comentar os resultados negativos das contas públicas. “É muito difícil mexer nessa despesa sem antes ter um grande debate público, um grande debate democrático.”

O ministro do Planejamento, Dyogo de Oliveira, é cotado para ocupar a presidência do BNDES, no lugar de Paulo Rabello de Castro, que se lançou pré-candidato à Presidência pelo PSC (Crédito:Wenderson Araujo)

O martelo será batido pelo presidente Temer nos próximos dias, mas, segundo um assessor do Palácio do Planalto, não deve haver surpresas. “A equipe econômica operou com extraordinária eficiência”, afirmou Temer, na segunda-feira 26, após reunião com empresários na Fecomercio-SP. “Não pode quebrar essa equipe por nós montada no início do governo.” Para o mercado financeiro, o mais importante é que o time econômico continue blindado de eventuais interferências eleitorais. Há quase um consenso dos especialistas de que o ano de 2018 “já está dado”, ou seja, o Produto Interno Bruto (PIB) vai crescer perto de 3%, o triplo do que foi registrado no ano passado. A maior preocupação reside na campanha eleitoral. “O PIB já está encomendado, a inflação permanece sob controle, mas o câmbio pode estremecer se candidatos da extrema esquerda ou da extrema direita crescerem nas pesquisas”, diz José Cláudio Securato, presidente da Saint Paul Escola de Negócios, que participou do programa “Papo de Economista”, na TV Dinheiro.

A manutenção da estabilidade macroeconômica num ano eleitoral depende da credibilidade da equipe. Nesse quesito, o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, é considerado peça-chave. Eleito Empreendedor do Ano pela DINHEIRO em 2017, o economista recebeu, no dia 15 de março, o prêmio de melhor banqueiro do mundo, oferecido pela publicação britânica The Banker, especializada em finanças internacionais e pertencente ao Financial Times. Tamanho prestígio tem contribuído, inclusive, para a ancoragem benigna das expectativas inflacionárias, abrindo caminho para a queda recorde da taxa básica de juros (Selic).

Atualmente em 6,50% ao ano, a Selic pode cair um pouco mais – um ou dois cortes de 0,25 ponto percentual – nas próximas reuniões, segundo comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom). Na quarta-feira 28, o BC anunciou uma drástica redução nos depósitos compulsórios com o objetivo de reduzir os juros bancários (leia quadro ao final da reportagem). Ilan, como é chamado no mercado, rechaça prontamente todas as especulações sobre o seu nome para o Ministério da Fazenda. Sua gestão eficiente no combate à inflação e na queda dos juros levou, inclusive, o candidato do PSDB à Presidência, Geraldo Alckmin, a cravar a manutenção seu nome no BC num eventual mandato, a partir de 2019.

Questões eleitorais à parte, a nova equipe econômica tem pela frente nove meses de muito trabalho. O maior desafio será driblar o calendário apertado, que terá a Copa do Mundo e a campanha eleitoral como obstáculos às votações no Congresso Nacional. A agenda é extensa e inclui a reforma Tributária, a reoneração da folha de pagamentos e a autonomia do Banco Central (confira quadro acima). Para o setor produtivo, o projeto mais importante é o da simplificação, tema que mereceu um comentário de Guardia, durante evento da AGU, que garantiu que a mudança não é para aumentar a arrecadação.

“A reforma do PIS/Cofins é neutra”, afirmou Guardia, que deve empunhar essa bandeira caso seja efetivado como ministro da Fazenda. “A alíquota nominal irá subir, mas alíquota efetiva será a mesma.” A maior dificuldade é convencer os governadores de que os Estados não perderão receita. Outro tema caro à equipe econômica é a reforma da Previdência Social, que deve ser feita apenas em 2019, pelo próximo presidente. “Se não fizermos reformas, melhorarmos a carga tributária, abrirmos a economia e não completarmos o ajuste fiscal, não vamos crescer mais de 2%”, diz Mansueto, que está de malas prontas para se transferir ao Ministério do Planejamento. “Com as reformas, podemos crescer tranquilamente mais de 3,5%.”


BC declara guerra aos juros altos

Causou irritação dentro do governo o resultado da pesquisa mensal do Banco Central (BC) sobre os juros bancários, divulgada na segunda-feira 26. Em fevereiro, pelo segundo mês consecutivo, as taxas de juros cobradas de consumidores e empresas subiram, num contexto em que a taxa básica (Selic) não para de cair – está em 6,5% ao ano, o menor patamar da história. Três dias depois, o presidente do BC, Ilan Goldfajn, anunciou uma redução drástica no recolhimento dos depósitos compulsórios. Trata-se do dinheiro que os bancos são obrigados a deixar guardado, sem poder emprestar aos clientes. A alíquota dos depósitos à vista caiu de 40% para 25%; a dos depósitos da poupança de 21% para 20%; e no caso da poupança rural, de 24,5% para 20%. “O impacto agregado das medidas pode ser estimado em R$ 25,7 bilhões devolvidos ao Sistema Financeiro Nacional”, escreveu o BC, em nota, ao divulgar a medida.

Em tese, com mais recursos para emprestar, os bancos poderão cobrar menos juros de seus clientes. Há, no entanto, o risco de as instituições comprarem títulos públicos em vez de ofertar mais crédito. A decisão sobre se este dinheiro vai para a população ou para o governo vai depender dos tesoureiros. No mercado financeiro, o sentimento geral é de que o BC está preocupado com o ritmo lento da atividade econômica, não restringindo o seu olhar às questões inflacionárias. Na pior das hipóteses, se os bancos preferirem comprar mais títulos públicos, haverá um efeito secundário de queda na curva de juros do mercado. De uma forma ou de outra, o BC declarou guerra aos juros altos.