Em atividade desde os anos 1940, o banco mineiro Mercantil do Brasil atravessou vários períodos difíceis na economia e na política. Controlado pela tradicional família mineira Araújo, o banco tem R$ 9,17 bilhões em ativos e ocupa a 39a posição no ranking do Banco Central (BC). Agora, na avaliação da agência de classificação de risco Moody’s, ele poderá enfrentar novas turbulências, agora internas. No dia 24 de maio, a agência rebaixou a nota dos depósitos de longo prazo do Mercantil do Brasil em reais. O rating caiu de B3, que indica “grau altamente especulativo”, para Caa1, ou “grau especulativo de risco substancial”. A agência também colocou a nota dos títulos do banco em moeda local e em moeda estrangeira em revisão, para um possível novo rebaixamento. De acordo com o relatório do analista Farooq Khan, sediado em Nova York, o banco “enfrenta desafios crescentes em obter rentabilidade sustentável e gerar capital para atender as exigências da terceira fase do acordo de Basileia, que será implementado em janeiro de 2019”.

Segundo Khan, essas dificuldades decorrem de um aumento da inadimplência na carteira de crédito. No fim do primeiro trimestre deste ano, o Mercantil do Brasil tinha emprestados R$ 5,97 bilhões, pouco menos que os R$ 6,01 bilhões do fim de 2017. Empréstimos para pessoas físicas respondem por 68% da carteira, ou R$ 4,06 bilhões. Desse total, 59,4% foram concedidos na forma de financiamentos de menor risco, que rendem poucos juros, como os empréstimos consignados. Quando o banco empresta a juros menores, a inadimplência consome uma fatia maior dos resultados. E o calote vem crescendo, afirma Khan. “O índice geral de inadimplência de 90 dias do banco subiu para 9,0% em março, alta de 100 pontos-base em relação a dezembro de 2017”, escreveu ele. Cem pontos-base equivalem a um ponto percentual.

Isso significa que o banco é obrigado a reconhecer uma parte da carteira de crédito como prejuízo. É uma dinâmica que a instituição enfrenta há algum tempo. De acordo com Pedro Breviglieri, analista da agência de classificação de risco Standard & Poor’s, “as perdas de crédito do Mercantil foram maiores em comparação às de outras instituições brasileiras do mesmo porte nos últimos anos”. No dia 8 de março, a Standard & Poor’s atribuiu uma classificação de risco “brB+” ao banco, indicando risco especulativo. Segundo o relatório, assinado por Guilherme Machado, a perspectiva é negativa. “O perfil financeiro do banco poderá se enfraquecer mais, prejudicando sua posição de capital e liquidez”, escreveu ele.

Essa incerteza torna mais difícil para o banco se enquadrar às exigências regulatórias. O Mercantil tem hoje uma relação entre empréstimos e patrimônio de referência de 8,6%. Pelas normas vigentes do acordo de Basiléia, essa relação tem de ser, no mínimo, 7,85%. O banco cumpre os requisitos sem problemas. No entanto, as regras da terceira fase de Basileia, que começam a valer no começo de 2019, devem elevar esse mínimo para 8,5%. “Isso deixará o banco com uma folga pequena”, escreveu Khan, da Moody’s.

A solução tradicional é injetar dinheiro novo no negócio. O banco vem tentando fazer isso. Sem sucesso, porém. No dia 18 de maio, uma semana antes do rebaixamento pela Moody’s, o BC negou, após nove meses de análise, um pedido do Mercantil para aumentar seu capital. O banco havia proposto vender seis milhões de ações ordinárias, em uma emissão privada, por R$ 9,50 cada. A maioria seria vendida para o investidor Pedro Ribeiro de Oliveira Neto. Oliveira, que é empresário e cliente do Mercantil do Brasil, se comprometeu a aportar até R$ 40 milhões no banco, o que o deixaria com pouco menos de 10% do capital.

Agência, no feriado o banco concede poucos empréstimos, um problema que deixou de ser de Roberto Assumpção (foto). O ex-presidente agora cuida do Banco Mercantil de Investimentos (Crédito:Divulgação)

Segundo o Mercantil, o BC justificou a negativa pela “não apresentação de documentos e informações complementares”. Não foi a primeira tentativa de atrair dinheiro novo. Em junho de 2017, os controladores negociaram um aporte de R$ 146 milhões da estatal mineira Codemig no capital do Banco Mercantil de Investimentos, do qual o Mercantil do Brasil possui 91,5% das ações ordinárias. O BC também não autorizou o negócio. A justificativa foi semelhante: não apresentação de documentos, informou a autoridade monetária que, procurada, afirmou que não comenta casos específicos.

O Mercantil do Brasil não concordou. Antes de recorrer formalmente, alguns executivos foram a Brasília para uma reunião no BC no dia 22 de maio. “Fomos avaliar o motivo da decisão e entender as nossas alternativas para conseguir essa aprovação”, disse à DINHEIRO Roberto Assumpção no dia 24 de maio, antes do rebaixamento do banco pela Moody’s. No entanto, ele garante que é possível contornar o problema. “Se o aumento de capital não for aprovado, os controladores têm capacidade de aportar recursos,” diz ele. Qual o cargo de Roberto Assumpção? Em uma mudança no estatuto publicada em 30 de abril, ele assinava como diretor-presidente.

Ao conversar com a reportagem, foi apresentado como Diretor Financeiro, de Relações com Investidores e de Marketing. No entanto, Assumpção havia renunciado aos cargos em 10 de maio, segundo a ata da reunião do Conselho de Administração nessa data. Questionada, a assessoria de imprensa do Mercantil do Brasil informou que o executivo renunciou às suas funções para se dedicar exclusivamente ao Banco Mercantil de Investimentos. “A sucessão do Mercantil do Brasil foi uma decisão planejada, longamente discutida e já estava definida há (sic) médio prazo”, informou a assessoria.

Além de tentar convencer o BC a permitir a entrada de novos investidores e de ter de melhorar a rentabilidade de suas atividades, o Mercantil do Brasil também está realizando mudanças na cúpula. A saída de Assumpção não foi a única alteração. A presidência do Conselho passou de Luiz Henrique Andrade de Araújo para Maurício de Faria Araújo, que era o vice-presidente. Segundo a assessoria de imprensa, o banco tem um novo presidente, cujo nome não pode ser divulgado. Seja quem for o novo executivo, ele – ou ela – terá muito trabalho pela frente.