Com o peso argentino em queda livre, as contas públicas à beira do colapso e a aversão internacional de bancos, fundos e investidores, o governo de Alberto Fernández empossou, na segunda-feira (4), e economista Silvina Batakis como a nova ministra da Economia. Amiga da vice, Cristina Kirchner, ela assume a pasta em meio à deterioração do ambiente de negócios e dos pilares macroeconômicos ­— o que só se agravou depois da renúncia, no sábado (2), de seu antecessor, Martin Guzmán.

A superministra terá total liberdade da Casa Rosada para enfrentar os superproblemas do país: inflação de 60,7% no acumulado em 12 meses (até maio), pobreza acima de 42%, desemprego de 12,1%, taxa de juros de 50% ao ano e pagamento renegociado de uma dívida de US$ 45 bilhões com o Fundo Monetário Internacional (FMI) até 2034. O descontentamento da população já é evidente nas ruas.

Se os problemas são os mesmos das últimas três décadas, a capacidade da ministra de encontrar uma solução é questionável. Ligada ao kirchnerismo, considerado uma das principais fontes dos problemas econômicos recentes, Silvana poderá ter função decorativa, fazendo apenas o que deseja a vice-presidente — uma mistura de Paulo Guedes com Rainha da Inglaterra.

Na avaliação de Paulo Dutra Constantin, professor de economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, a necessidade de consertar a economia sem lançar planos econômicos que prejudiquem a imagem do governo deve transformar a ministra em mais um nome na lista dos que falharam até agora. “A Argentina enfrenta o mesmo que toda a América Latina, inclusive o Brasil: a onda crescente do populismo com a economia querendo agradar o presidente”, afirmou. Para entender que as chances de sucesso são pequenas, basta olhar o histórico de Silvina. Ela é uma funcionária pública de carreira e vista como próxima da coalizão peronista governista que quer aumentar os gastos. Paradoxalmente, prometeu contenção fiscal — tipo de malabarismo que a Argentina acredita ser capaz de fazer.

A saída para o drama argentino, segundo Constantin, depende dos mesmos remédios amargos que serão necessários no Brasil em breve e que são sempre refutados pela população. “A solução em médio e longo prazo seria uma política contracionista, com aumento das taxas de juros para tentar conter a inflação e forte redução dos gastos públicos”, disse o professor. Vale lembrar que o último que tentou isso, o ex-presidente Mauricio Macri, chegou a soltar um pacote de austeridade em 2018 e o resultado foi uma ebulição social, críticas ferrenhas e o caminho aberto de volta ao kirchnerismo.

Com esse histórico recente, a tarefa de Silvina é considerada por parte do mercado como uma missão impossível. O economista e ex-secretário das Finanças da Argentina Daniel Marx considera que a ministra não terá apoio do Congresso para corrigir os desajustes. Na visão dele, as tentativas de rever os rumos da economia dos últimos anos, tanto com governos de esquerda quanto de direita, geraram muito desgaste para que novos planos prosperem de forma rápida.

DESEQUILÍBRIOS O banco americano JP Morgan alertou seus investidores de que a Argentina pode implementar uma política de aumento de gastos, em vez de arrocho fiscal. Em relatório, Diego Pereira, que é analista da instituição, disse que a nomeação dela mostra que “o poder pendeu para o lado kirchnerista, com o risco de se voltar para uma postura fiscal mais expansiva em meio a crescentes desequilíbrios financeiros”.

A nomeação de Silvina, de fato, não caiu bem para o mercado. Na véspera e no dia em que tomou posse, o peso despencou 8% frente ao dólar. Houve uma forte corrida às casas de câmbio para compra de moeda estrangeira. Nesta segunda-feira (4), o peso no mercado paralelo caiu para 260 pesos por dólar, mais do que o dobro da taxa de câmbio oficial de 126 pesos por dólar. O índice de ações S&P Merval da Argentina caiu 1% e os títulos perderam 0,8%. Por sorte, em negociações fracas, devido ao feriado de 4 de julho nos Estados Unidos.

Além dos problemas econômicos internos, a moeda argentina tem causado grande estrago, principalmente porque o país tem uma dívida com o FMI que gira em torno de US$ 45 bilhões e foi renegociada em abril deste ano. Hoje, o país tem taxas de câmbio muito elásticas e de amplitude divergentes em razão dos rígidos controles cambiais que limitam as compras em dólares a apenas US$ 200 por mês. Com isso, os cidadãos recorrem a mercados paralelos e informais, onde dólar e euro custam muito mais. Outro problema antigo a ser resolvido com as mesmas velhas táticas por nossos hermanos.