Prometida para ser entregue ao Congresso Nacional nesta terça-feira (18), a proposta do arcabouço fiscal pode ser um divisor de águas no terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Isso porque a expectativa é de que o conjunto de regras facilite uma redução da taxa de juros, mostre interesse do governo em ter limite de gastos, arrecadação e estabilizar a dívida pública.

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Não somente, os rumos da votação podem aproximar – ou não – a base de Lula do “blocão” de Arthur Lira (PP), que reúne 173 parlamentares. José Guimarães (PT), líder do governo na Câmara, disse que a expectativa é aprovar o texto em 20 dias.

Alexandre Pires, professor de Relações Internacionais e Economia no Ibmec, explica que a regra fiscal entra na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), cuja proposta do governo foi entregue ao Congresso na sexta-feira (14). Tais regras estão no campo das metas fiscais, onde elas são explicitadas e aparece como que o governo vai atingir os números pretendidos.

“No ano atual, o que temos é uma LDO elaborada em agosto de 2022, e ela tem ali algumas perspectivas ligadas ao cumprimento da meta e ainda há vigência ali no teto de gastos; na LDO atual, proposta pelo governo, nós temos uma perspectiva diferente com relação ao teto de gastos, propondo uma individualização dos gastos de cada setor, especialmente educação e saúde. Então isso é uma alteração que vai passar valer para 2024, ou seja, na formulação do orçamento de 2024 ao longo de 2023”, explica o professor.

Pedido de R$172 bilhões

Na última sexta-feira (14), o governo enviou a proposta da LDO com meta fiscal e prioridades do governo federal para 2024. Na proposta, há um valor de R$172 bilhões acima do teto de gastos, que só podem ser liberados diante da aprovação do novo arcabouço fiscal. 

“O arcabouço fiscal é fundamental porque hoje, com o teto de gastos, o governo não tem margem de manobra para nenhuma despesa discricionária, ou seja, ele vai cumprir a risca para pagar a saúde educação; não há muito o que fazer, por exemplo, para reduzir o reduzir o déficit primário. Com ‘menos’ esses R$172 bilhões, o governo não consegue ter receita suficiente para pagar as despesas”, explica Bianca Xavier, professora da FGV Direito.

Pela proposta da regra fiscal do Ministério da Fazenda, “a despesa da União fica limitada a 70% da variação da receita verificada nos 12 meses anteriores. Para evitar distorções em períodos de arrecadação muito alta ou muito baixa, o texto assegura um aumento mínimo de 0,6% e máximo de 2,5% nas despesas. A expectativa do Poder Executivo é zerar o déficit primário em 2024 e atingir superávits de 0,5% em 2025 e 1% em 2026”.

Em suma, para se ter um equilíbrio orçamentário entre receita e despesa, o governo vai precisar de desses R$172 bilhões essencialmente. “Nesse momento, se for aprovado um projeto [de arcabouço fiscal] diferente, muda drasticamente, pois, ou o governo está limitado a gastar o que foi gasto nos anos anteriores corrigido pela inflação, ou vai ter liberdade maior. O arcabouço é um pressuposto dessa discussão orçamentária”, acrescenta Bianca.

A ministra do Planejamento, Simone Tebet, destacou que o projeto de LDO é a “princípio atípico” por causa da revisão do arcabouço fiscal, que substituirá o teto de gastos. “Precisamos ter condições de cumprir a constituição e as despesas obrigatórias para o ano que vem”, disse, em entrevista coletiva à imprensa.

Lira promete votação rápida

Lira já afirmou que será rápido para garantir a votação da proposta do arcabouço fiscal. “Nossa expectativa é que, o texto chegando, designaremos relator rapidamente, e duas, três semanas no máximo estaremos votando em plenário”, disse. O “blocão” é composto pelo Progressistas, União Brasil, PSB, PDT, PSDB-Cidadania, Solidariedade, Avante e Patriota.

Alessandro Azzoni, advogado, economista e conselheiro da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), sinaliza que a proposta tem força de ser aprovada, mas que apresentou resistência de bases aliadas, como do PSOL, por exemplo, que faz uma crítica à proposta da regra dizendo que ela é menos rígida que o teto de gastos e ainda que põe riscos aos investimentos do governo federal e às promessas de campanha.

“A presidente também do PT, Gleisi Hoffmann, também afirma que foi pega de surpresa pelo próprio ministro [Haddad]. A própria base aliada ainda encontra-se praticamente dividida em relação ao arcabouço. Mas o governo tem uma base forte de mais de 300 deputados, que fazem parte da base que elegeu presidente Lula. Já tivemos uma aceitação principalmente do mercado financeiro, dos investidores estrangeiros, que praticamente endossaram uma proposta”, avalia o economista.

Segundo Pires, há uma possibilidade não pequena do governo não conseguir alterar as emendas que dão  sustentação pro teto de gastos. “Isso exige uma maioria qualificada, ou seja, 60% do Congresso, e isso é difícil de conseguir. O bloco formado hoje não daria isso: os 2 blocos atuais em que o PT não participa tem o necessário para passar emendas. Será preciso muita negociação para que o pacote atual avance, porém já havia no Congresso uma certa insatisfação com as amarras ligadas ao teto de gastos, e pode haver um avanço em razão de ser algo que vai ser modificado pelo pro próprio Congresso”, finaliza o professor do Ibmec.