O procurador-geral da República, Augusto Aras, recomendou nesta quinta-feira, 9, ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) uma série de restrições para a adoção do juiz de garantias, prevista no pacote anticrime sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro no fim de dezembro. O memorando da Procuradoria-Geral da República (PGR) sugere que a medida não seja aplicada a processos de homicídios nem a casos relacionados à Lei Maria da Penha. O texto também recomenda que haja juízes de garantias especializados em áreas como lavagem de dinheiro e questiona se o novo dispositivo legal valerá para a Justiça Eleitoral.

O texto aprovado por Bolsonaro cria a figura de um juiz responsável, exclusivamente, para acompanhar a fase de investigação dos processos. O juiz de garantias seria responsável por autorizar ou negar medidas como mandados de busca e apreensão, prisões preventivas e quebras de sigilo telefônico ou bancário. A partir do momento que a denúncia é aceita, o processo passa a ser comandado por outro magistrado, que ficará a cargo de ouvir as partes, analisar as provas e dar a sentença.

O memorando apresentado nesta quinta por Aras foi feito por procuradores que atuam nas áreas criminal, de combate à corrupção e de meio ambiente e patrimônio cultural. Eles fizeram uma análise comparativa dos códigos penais de Brasil, Argentina e Chile para destacar oito pontos que necessitam de regulamentação e eventuais regras de transição. Os dois países vizinhos têm figuras semelhantes em seu conjunto de leis.

Com relação à Justiça Eleitoral, o texto da PGR lembra que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em março de 2019, que devem ficar nessa instância casos relacionados às eleições, como caixa 2 e lavagem de dinheiro. Aras pede um esclarecimento sobre como funcionaria o juiz de garantias neste caso e se é necessária a edição de uma lei específica. A Justiça Eleitoral não tem estrutura própria e é formada por magistrados de outras varas.

Em outro ponto, a PGR afirma que a medida deveria valer somente para inquéritos policiais novos, o que evitaria contestações. A deputada federal Margarete Coelho (PP-PI), autora da proposta no Congresso, também defende que processos em andamento não sejam modificados pela decisão. O presidente do Supremo, Dias Toffoli, concorda com o argumento de Margarete.

Aras também demonstra preocupação, no documento, com a divisão de casos para magistrados que assumiram a nova função. “Considerando o volume de cautelares e outros processos e requerimentos que ficarão com a competência dos juízes de garantias, que o número dos mesmos seja calculado de forma proporcional ao número de feito e às varas, que serão responsáveis por instrução e julgamento de ações penais.”

Debate

A criação do juiz de garantias causou reação na magistratura. Duas das principais entidades da classe se insurgiram contra a figura e recorreram ao Supremo, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e Associação dos Juízes Federais (Ajufe). Além desses grupos, os partidos políticos Podemos, Cidadania e PSL também questionaram o dispositivo na Corte. Críticos da medida argumentam que ela pode aumentar os custos do Judiciário – pois seria necessário contratar mais juízes – e atrapalhar investigações em andamento, principalmente contra corrupção.

Defensores do juiz de garantias, entre eles ao menos seis ministros do Supremo, negam que esses problemas possam acontecer e alegam que a figura dá mais imparcialidade aos processos judiciais. A criação do posto acabaria com o argumento usado por alguns advogados de que juízes são parciais por acompanharem toda a fase de investigação e se “contaminarem” com os pontos da acusação.

Grupo de trabalho

O memorando de Aras foi encaminhado ao CNJ porque o colegiado montou um grupo de trabalho para debater a implementação do juiz de garantias. A PGR também recomenda, no texto, que os tribunais estabeleçam um cronograma de implantação de juiz de garantias que priorize varas que já dispõem de informatização em todos os processos e inquéritos”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.