Comprar, manter ou vender uma ação? O trabalho do analista é responder essa pergunta de maneira correta, de modo a orientar as decisões dos investidores. Para realizar bem essa tarefa, os profissionais têm de ir além de interpretar corretamente as linhas e as entrelinhas dos demonstrativos financeiros. É preciso entender o funcionamento da companhia, compreender a dinâmica do setor em que ela se insere e antecipar o comportamento de inúmeras variáveis. Para fazer isso com competência, os analistas premiados pela edição mais recente do concurso de melhor analista conferido pela empresa de informações Thomson Reuters têm algo em comum: eles não se incomodam de gastar as solas dos sapatos. Entre suas tarefas cotidianas estão contatos frequentes com os executivos que comandam as empresas que acompanham.

Nesses encontros há espaço para conversas com outros profissionais além das tradicionais reuniões com o diretor financeiro e com o diretor de relações com investidores. “Também acho essencial conversar, pelo menos uma vez por semana, com clientes, fornecedores, concorrentes e até mesmo os dirigentes sindicais”, diz a analista Renata Faber, do Itaú BBA, premiada como a melhor da América Latina na categoria escolha de ações, ou stock picking. Thiago Ojea, que até recentemente trabalhava no Citi, segue a mesma regra. Analista premiado como o melhor em previsão de resultados, ou earnings forecast, ele não se incomoda de ir a campo. “Acompanho mineradoras e se me convidarem para visitar jazidas no meio da Amazônia, eu aceito sem hesitar”, diz Ojea.

O trabalho dos analistas que concorrem ao prêmio de escolha de ações é dizer a hora certa de comprar ou de vender. Segundo David Austin, gerente de produto da Thomson Reuters, eles são avaliados pelo resultado obtido por suas recomendações. As sugestões de compra ou venda dos papéis formam uma carteira teórica. Seu desempenho é comparado com a oscilação do índice de ações MSCI da América Latina durante 2017. No ano passado, o MSCI valorizou-se 24,15%. Um investidor que tivesse seguido à risca as recomendações de Renata Faber teria tido um ganho 18,7% superior a esse percentual, diz Austin.

Renata Faber, melhor analista na escolha de ações: conversas com executivos, clientes e fornecedores (Crédito:Marco Ankosqui)

Renata chefia dois analistas que acompanham 20 ações. São papéis do setor industrial, como Randon e Weg, concessionárias de rodovias como CCR e Ecovias e locadoras de veículos como Localiza e Locamerica. Para obter esse resultado, ela não recorre apenas à análise dos demonstrativos financeiros. “Adoro visitar as fábricas e falar com os executivos diretamente envolvidos na produção, como diretores comerciais e gerentes industriais”, diz ela. Renata, formada em Administração de Empresas pela Fundação Getulio Vargas, também recorre aos conhecimentos acumulados em quase duas décadas de carreira. No Itaú BBA desde 2005, ela iniciou sua carreira no ano 2000, no Banco Fator. “Já comecei cobrindo indústria e me encantei”, diz ela. Leitora voraz, ela acompanha o noticiário setorial brasileiro e internacional.

Quais suas recomendações? Renata afirma estar otimista com as perspectivas para as empresas que acompanha. Em sua avaliação, a crise dos últimos anos levou as companhias a cortar custos e aumentar a eficiência. Hoje, diz ela, há uma capacidade ociosa elevada. “Mesmo uma melhora discreta da atividade econômica permitirá elevar o faturamento rapidamente sem ampliar os custos fixos”, diz. Já Ojea se destacou pela extrema precisão com que antecipou os resultados das companhias que acompanha. Segundo Austin, da Thomson Reuters, em média os analistas latino-americanos têm uma precisão de 50% nas estimativas de resultados. Ojea obteve uma taxa de acertos de 97,8% considerando-se o período entre abril de 2017 e março de 2018. “O segundo colocado obteve uma precisão de 93%”, diz Austin.

Formado em administração de empresas pela Universidade de São Paulo e com um MBA pela Universidade da Califórnia, Ojea começou sua carreira em consultorias, assessorando operações de fusões e aquisições. “Eu cuidava da parte financeira, o que me trouxe familiaridade com demonstrativos e projeções”, diz. Ele trabalhou no Citi por cerca de sete anos e desligou-se recentemente, rumo a um prestigioso banco de investimentos americano, para acompanhar o mesmo setor.

Diferentemente de Renata, que acompanha apenas ações brasileiras, Ojea analisa mineradoras e siderúrgicas de outros países da América Latina. Por aqui, suas companhias mais relevantes são, além da Vale, as siderúrgicas Usiminas, Gerdau e CSN. Para prever os resultados, ele busca informações além dos portões das empresas. “No caso das siderúrgicas, é essencial acompanhar de perto o que está ocorrendo no varejo e no crédito”, diz ele. “Se a venda de geladeiras aumentou, é questão de tempo para os resultados das siderúrgicas melhorarem.”

Ojea diz esperar uma boa valorização das ações de siderúrgicas. Segundo ele, os preços do aço no mercado interno estão defasados. Em circunstâncias normais, as siderúrgicas nacionais cobram um prêmio em relação ao aço importado. O produto nacional não tem riscos cambiais nem de entrega e essa segurança tem valor. De acordo com o analista, a queda da demanda fez as companhias deixarem de cobrar esse preço adicional. “Isso é uma distorção, que vai se corrigir quando o consumo se normalizar”, diz ele. Para Ojea, as ações das siderúrgicas têm um potencial de valorização que vai de 25%, caso da Gerdau, até 50%, caso da Usiminas.