Havia décadas que o Brasil precisava de uma legislação assim. Mas nunca alguém se dispunha a levá-la adiante. Em abril de 2000, porém, o Senado aprovou a Lei de Responsabilidade Fiscal e deu-se um passo decisivo para o controle criterioso das contas públicas nas esferas, federal, estadual e municipal. A partir daquele momento, o banco público, a prefeitura ou o governo estadual que gastasse mais do que o permitido em sua conta bancária seria severamente punido pelos altos escalões do poder. Além disso, foram estabelecidos tetos para os gastos com a folha de pessoal e proibiu-se a aquisição de dívidas que não pudessem ser pagas no mesmo mandato. Na prática, FHC criou, assim, um antídoto para uma doença crônica no Brasil: o hábito secular dos dirigentes brasileiros de gastar mais do que arrecadam. ?Até então, muitos governantes se deparavam com uma dívida tão grande quando assumiam o mandato que qualquer gestão financeira razoável ficava impossível?, diz Raul Velloso, especialista em contas públicas. De acordo com ele, muitos deles anunciavam que era impossível pagar e não faziam ajuste algum, passando a batata quente para o substituto. ?Com a nova lei a mudança de comportamento foi completa?, diz Velloso.

Antes mesmo da aplicação da lei, o governo promoveu mudanças sem as quais a lei não sairia do papel. A mais importante delas foi o saneamento dos bancos estaduais, que chegaram a somar uma dívida de mais de R$ 90 bilhões com a União. A saída para eles foi o Programa de Saneamento dos Bancos Estaduais, Proes, que obrigou muitos governadores a fechar, vender ou reestruturar suas instituições. Quem se adequou às exigências se comprometeu a pagar as dívidas em 30 anos a uma taxa de juros subsidiada de 6%. Uma vez que a lei entrou em vigor, a limpeza prosseguiu e a situação ficou complicada nos Estados do Rio Grande do Sul, governado por Olívio Dutra, e de Minas Gerais, de Itamar Franco. Este último chegou a decretar a moratória em 1999. Sem caixa, os dois voltaram a pedir ajuda financeira à União (só para pagar a dívida gaúcha seriam necessários três anos de arrecadação tributária). Nas prefeituras, a adaptação aos termos da lei também não foi menos difícil mas, com um ano e meio de implantação, 58% dos municípios registraram superávits primários, ou seja, arrecadaram mais do que gastaram, segundo dados do Ministério do Planejamento.