Acaba de chegar às livrarias italianas um livro explosivo. Trata-se de L?af fare Telecom ? il caso politico-finanziario più clamoroso della Seconda Republica. Como o título indica, a obra dos jornalistas Giuseppe Oddo e Giovanni Pons tem a ambição de esquadrinhar o maior escândalo econômico e político da Itália moderna. Ao longo da narrativa, surge um personagem central: Roberto Colaninno, ex-capo da Telecom Italia até a venda da empresa para a Pirelli. Diante da coletânea de operações financeiras nebulosas apresentadas pelos autores, o leitor tem a impressão de que Colaninno passou três anos à frente da operadora italiana com um único desejo, o de pagar mais, muito mais, por tudo que surgisse à sua frente. E, em muitos casos, boa parte do dinheiro que saía do bolso dos acionistas da Telecom Italia, nas aquisições superfaturadas de empresas ao redor do mundo, acabava retornando para paraísos fiscais, supostamente para Colaninno e membros do regime político ? a esquerda de Massimo D?Alema ? que o sustentava à frente da operadora.

Seria um escândalo puramente italiano, não fosse um detalhe. O livro dedica um capítulo apimentadíssimo aos negócios patrocinados por Colaninno no Brasil. Dois chamam a atenção: a compra superfaturada da CRT, operadora gaúcha que pertencia à espanhola Telefônica, e a aquisição de 30% do portal Globo.com. No primeiro, os italianos, com o aval dos fundos de pensão brasileiros, decidiram pagar cerca de US$ 100 milhões acima do que seria necessário. No segundo, os italianos gastaram US$ 850 milhões por um negócio que, segundo avaliação da própria Telecom Italia na gestão Pirelli, vale zero. No caso CRT, o mais grave é o fato de que o superfaturamento não saiu dos cofres da Telecom Italia, mas sim da Brasil Telecom, uma empresa majoritariamente brasileira, em que os italianos têm 49% do capital de controle. No livro, são relatados detalhes do fechamento da operação, que ocorreu em uma reunião secreta na Agência Nacional de Telecomunicações, quando a CRT estava sob intervenção e a Telefônica corria o risco de ter a concessão cassada. Portanto, eram os compradores, e não os vendedores, que tinham uma posição de força no negócio. ?O presidente da Brasil Telecom, Henrique Neves, foi obrigado a assinar?, relata o livro. Em decorrência dessa operação, corre na Justiça uma ação contra os italianos em que o Opportunity, principal sócio nacional da Brasil Telecom, busca ressarcimento pelas perdas impostas pela Telecom Italia.

Para concretizar todos esses negócios, Colaninno teve uma grande aliada: a executiva Giulia Nobili, uma italiana com passagem por grandes bancos de investimento. Era ela quem chancelava a maior parte das avaliações técnicas por trás dos gastos de Colaninno. No caso da CRT, a avaliação variava entre US$ 600 e US$ 850 milhões. Colaninno estava disposto a pagar US$ 850 milhões e chegou a acertar o preço com Juan Villalonga, então presidente da Telefônica. Depois, cedeu em parte e acabou pagando ? a contragosto!!! ? US$ 50 milhões a menos. Pode parecer extravagante, mas a disposição do ex-capo da Telecom Italia era sempre tomar os valores de avaliação pelo teto. Na compra da boliviana Entel, projeções do Citibank variaram entre US$ 460 milhões e US$ 610 milhões. Colaninno assinou o cheque pelo valor máximo. Na compra da Telecom Sérvia, foram gastos 892 milhões de euros e, segundo o livro, com fartas propinas ao governo de Slobodan Milosevic.

Depois de todos esses escândalos, a questão que o livro deixa em aberto pode vir a incomodar muitas pessoas que trabalharam ao lado dos italianos no Brasil. ?Por que os sócios brasileiros tiveram de aceitar as condições dos sócios italianos na compra da CRT??, indagam os autores. Em outras palavras: por que gastaram, desnecessariamente, pelo menos US$ 100 milhões? É algo que ainda está sendo investigado na Itália.