Sob o impacto do aquecimento global e do desmatamento, a Amazônia está se aproximando de um “ponto de inflexão” mais rapidamente do que o esperado, o que pode transformar em savana a maior floresta tropical do mundo, um sumidouro de carbono vital para o equilíbrio do planeta.

Para chegar a esta nova constatação alarmante, publicada nesta segunda-feira (7) na revista Nature Climate Change, os pesquisadores analisaram 25 anos de dados de satélite para avaliar a resiliência da floresta amazônica a traumas como incêndios ou secas.

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E, este indicador chave da saúde geral do ecossistema amazônico caiu em mais de 75% de sua superfície e até 50% na capacidade de resiliência nos lugares mais maltratados, especialmente perto de atividades humanas ou afetadas por secas, explica à AFP Tim Lenton, da universidade britânica de Exeter, coautor do estudo.

Segundo os modelos, o aquecimento global sozinho poderia empurrar a floresta amazônica para uma transformação irremediável em savana. O último relatório do IPCC – os especialistas em clima da ONU – publicado há uma semana, voltou a alertar para esta possibilidade, que segundo alguns modelos poderá ser desencadeada por volta de 2050.

– Interações –

“Mas obviamente não é apenas a mudança climática, as pessoas estão cortando ou queimando a floresta, que é um segundo ponto de pressão”, continua Lenton. “Esses dois fatores interagem, então há preocupações de que a transição ocorra ainda mais cedo”.

Além da Amazônia, sistemas tão importantes para o equilíbrio planetário como as calotas polares, “permafrost” (solo permanentemente congelado, particularmente na Sibéria) que contém enormes quantidades de metano ou CO2, recifes de coral, regime de monções do sul da Ásia ou correntes do oceano Atlântico, são ameaçados por esses “pontos de inflexão”, que podem alterar radicalmente o mundo em que vivemos.

Na Amazônia brasileira, o desmatamento atingiu níveis recordes desde que o presidente Jair Bolsonaro chegou ao poder em 2019.

De acordo com um estudo recente, a floresta amazônica brasileira, que representa 60% do total, já passou de um “sumidouro de carbono” para uma fonte líquida de carbono, liberando 20% a mais desse poderoso gás de efeito estufa do que ela absorveu.

O recente relatório do IPCC sublinhou até que ponto os ecossistemas naturais estão ameaçados, embora sua boa saúde possa contribuir efetivamente para a luta contra as mudanças climáticas. A terra e a vegetação absorveram assim um terço das emissões de CO2 ano após ano desde 1960.

– Provas vitais –

A transformação da bacia amazônica em savana teria, portanto, enormes consequências, tanto regional quanto globalmente, alertam os autores do estudo.

Cerca de 90 bilhões de toneladas de CO2 – o dobro das emissões globais anuais de todas as fontes combinadas – poderiam então ser liberadas na atmosfera acentuando ainda mais o aquecimento.

Regionalmente, não só a floresta sofreria: “se perdermos o papel da Amazônia no ciclo das chuvas, teremos consequências para o centro do Brasil, o coração agrícola do país”, sublinha Tim Lenton.

Para avaliar a resiliência da floresta, os pesquisadores analisaram dados que medem sua biomassa e o “verde” do dossel.

“Muitos pesquisadores teorizaram um ponto de inflexão (…) Nosso estudo fornece evidências empíricas vitais de que estamos nos aproximando desse ponto”, analisa Niklas Boers, professor do Potsdam Institute for Climate Impact Research (PIK) e coautor do estudo.

“Se perdermos muita resiliência, a morte da floreta pode se tornar inevitável. Mas isso só será óbvio quando o evento que derrubar o sistema passar”, alerta o pesquisador.

Para Tim Lenton, pode haver uma pequena chance de restaurar a situação. “Se pudermos baixar a temperatura novamente, mesmo depois do ponto de inflexão, talvez poderemos mudar as coisas”.

Mas seria necessário contar com técnicas de extração massiva de CO2 da atmosfera, que não são operacionais, “e que envolvem seus próprios riscos”.