Pense bem. Você já viu alguém comprar um telefone celular preocupado com a tecnologia de transmissão, a capacidade da memória ou a cobertura de área? Provavelmente não. A maioria dos consumidores escolhe este ou aquele aparelho pelo tamanho, peso, preço, joguinhos disponíveis, tela colorida e principalmente porque a mulher ou namorada acha ele ?bonitinho?. É, definitivamente o celular deixou de ser um bicho tecnológico para se tornar um produto de consumo, um objeto de desejo e símbolo de status de quem o usa. Com aparelhos cada vez mais semelhantes, é no campo do marketing que os fabricantes disputarão mentes e corações dos consumidores. E também é nesse campo que a Motorola está apostando suas fichas para chegar à liderança do mercado brasileiro ainda este ano, posição ocupada pela arqui-rival Nokia. A filial da companhia americana fechou 2002 com uma participação de cerca de 25%, contra 20% no ano anterior. Para 2003, a expectativa é atingir 30% das vendas de celulares, estimadas em 11 milhões de unidades. ?Segundo nossos cálculos, estaremos em empate técnico?, disfarça Enrique Usscher, diretor geral para celulares da Motorola no Brasil.

A Motorola tem uma série de trunfos nessa corrida. Por exemplo: possui uma fábrica no Brasil, com economia de escala garantida pela soma das vendas internas com as exportações. No ano passado, quase US$ 700 milhões foram arrecadados com as vendas externas. Além disso, a produção local lhe dá agilidade ? em apenas três meses, a Motorola é capaz de colocar um novo produto nos balcões. Até o final de 2003, a filial brasileira colocará à disposição dos consumidores de 13 a 17 novos modelos. Entre eles, três com tecnologia TDMA, praticamente abandonada no restante do mundo, mas muito utilizada por aqui. Dos 33 milhões de celulares existentes, 21 milhões usam esse sistema. ?Atendemos às necessidades de nossos clientes?, diz Ussher.

A subsidiária brasileira também conta com a estratégia mundial inaugurada no ano passado. Com o mote HelloMoto, a empresa lançou uma ofensiva sobre o público consumidor, de preferência o jovem. Em vez das vantagens tecnológicas, a Motorola passou a apresentar seus produtos como ?um parceiro inseparável, que pode ser personalizado pelo dono tanto na aparência como nas funções?, como diz o francês Jean-Pierre Le Cannellier, diretor de marketing e estratégia para a América Latina.

A nova postura da Motorola ficou clara na semana passada durante o lançamento mundial de sua nova linha de celulares. A empresa tomou conta da paisagem iluminada de Xangai, na China, onde o evento foi realizado. Imensos painéis com o slogan HelloMoto ocupavam todos os espaços disponíveis, dos saguões do moderno aeroporto internacional de Pudong, passando pelas largas avenidas da cidade até o prédio do Centro de Exibições de Xangai, onde centenas de pessoas participaram do jantar promovido pela empresa com cardápio tipicamente chinês. O edifício, uma construção baixa e sólida de linhas retas, ao melhor estilo do realismo socialista, era iluminado por canhões de luz que estampavam em sua fachada a expressão Nihao Moto (Hello Moto em chinês, é claro!). Os oito celulares da nova linha foram apresentados por Mike Zafirovsk, um dos chefões da Motorola, jovens modelos vestidos em roupas de algum estilo inominável, mas que certamente representavam variadas ?tribos? urbanas. No palco, eles dividiam espaço com os executivos engravatados da Motorola. O clima fashion revelava o alvo da empresa: o público jovem. ?O jovem é o CTO (chief tecnological officer) da família?, diz Le Cannellier. ?Como é um público sedento de novidades, vamos acelerar os lançamentos. O número para este ano pode ser maior do que os oito anunciados.? A Motorola também colocou no mercado uma série de acessórios próprios para esse pessoal. São óculos com fone de ouvido, carregador de bateria acoplado ao sistema de viva-voz, câmara digital, entre outros.

O que ficou claro para os convidados presentes em Xangai foi o esforço da empresa em renovar sua imagem. Um estudo do Gartner Group, divulgado dias depois do evento chinês, conclui que a prioridade da Motorola é substituir a linha de produtos que três anos atrás ?contribuiu para uma significativa perda de participação de mercado.? Foi a época das submarcas, como Startac e Timeport, que fizeram com que a assinatura Motorola ficasse em segundo plano nos investimentos de marketing e, pior, na cabeça dos consumidores. A recuperação vai custar um bocado de dinheiro. Para 2003, a verba reservada para divulgação da marca somará mais de US$ 300 milhões. Mesmo assim, a companhia tem pela frente uma tarefa árdua por duas razões, escrevem os analistas. Primeira: parte da nova linha só chegará ao mercado no segundo semestre. Segunda: a empresa sofrerá uma dura concorrência, sobretudo
da Samsung. Para o Gartner, com essa ofensiva, a Motorola ?manterá sua participação na China, revigorará sua participação
na Europa e aumentará sua participação nas Américas? ? Brasil, é claro, incluído.