As grandes empresas são as principais beneficiárias dos programas de ajuda implementados para estimular a economia após a pandemia de covid-19 em países em desenvolvimento, afirma um relatório publicado nesta quarta-feira (28) por um grupo de ONGs.

De acordo com o relatório, elaborado pela Coalizão de Transparência Financeira (FTC), os países em desenvolvimento atribuíram em média quase 40% da ajuda para a recuperação econômica a grandes empresas, reservando uma proporção quase equivalente para financiar medidas de proteção social.

“Apesar do custo de vida, os governos dos países em desenvolvimento, muitas vezes com as mãos atadas pelas instituições financeiras internacionais, estão colocando as grandes corporações à frente de sua população, afirma o diretor da FTC, Matti Kohonen, em um comunicado.

A proporção é ainda mais desequilibrada em alguns países, segundo a FTC, que cita em particular Nicarágua – país onde 87% da ajuda beneficiou as grandes empresas, contra apenas 13% para programas sociais -, Zâmbia ou Uganda.

Em outras nações, o contraste também chama a atenção: as grandes empresas foram beneficiadas por 41% da ajuda na Costa Rica, contra 25% para a proteção social; 50% na Colômbia, contra 9% para a questão social; 39% no Equador, contra 25% em ajudas sociais. Na Argentina a questão está mais equilibrada, com 37% para programas sociais e 36% para grandes empresas.

Oito países destinaram mais da metade da ajuda a políticas sociais, incluindo Brasil (58%), Chile (51%), Guatemala (51%) ou El Salvador (54%). Alguns chegaram a dedicar mais de 85% da verba, como Índia ou Malaui.

A ajuda beneficiou muito menos as mulheres, que recebem em média metade do valor que os homens, em particular pelo pouco apoio aos trabalhadores informais.

Como consequência, entre 75 e 95 milhões de pessoas entrarão na pobreza extrema até o fim do ano, afirma o relatório, que enfatiza que os gastos, que já registraram queda em 2021 na comparação com 2020, serão reduzidos novamente em 2022.

O relatório alerta que a pressão de instituições internacionais, como Fundo Monetário Internacional (FMI), para a adoção de medidas de austeridade e o corte do financiamento dos serviços públicos fundamentais em troca da reestruturação da dívida agrava o cenário.

Vários países “estão considerando cortes nos gastos essenciais de saúde, educação e proteção social, à medida que ficam sem dinheiro devido ao crescimento econômico menor e diante dos critérios de crédito rígidos do FMI e de outras instituições”, afirma Kohonen.

A FTC faz um apelo ao FMI, que terá sua reunião anual em meados de outubro, e ao Banco Mundial para que promovam políticas destinadas a reforçar o apoio à população (em particular com o incentivo à adoção de um um imposto de renda progressivo ou a tributação dos grandes lucros) e a combater os movimentos financeiros ilícitos.