Em agosto do ano passado, o grupo suíço Julius Baer preparava uma estreia de peso no Brasil: o lançamento de uma nova marca de gestão de patrimônio, a Julius Baer Family Office. Hoje com R$ 55 bilhões em ativos sob gestão, a gestora de fortunas nasceu da integração das empresas GPS Investimentos e Reliance Asset Management e planeja uma operação independente.

A decisão de criar uma operação unificada no Brasil fazia sentido. Em dezembro do ano passado, o valor administrado por 86 gestoras do segmento chegou a R$ 209 bilhões, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima).

Mas o cenário de “vacas gordas” para os mais endinheirados não deixou de ser alvo da crise gerada pelo coronavírus. Paulo Miguel, sócio do Julius Baer Family Office, relata a estratégia da gestora para sobreviver ao estresse e o impacto para os investidores de grandes fortunas:

Como o avanço da crise afetou a gestão de fortunas?

A natureza dessa crise é inédita. A sua velocidade generalizou as movimentações econômicas e desencadeou um processo de busca por liquidez a qualquer preço. O resultado foi um deslocamento no mercado que não se via desde 1929. As movimentações não funcionaram e os ativos de categorias seguras também tiveram um comportamento atípico de bolsa de valores. Esse fenômeno se traduziu em marcações negativas nas nossas carteiras.

Quando deve vir a retomada?

A maior dúvida é sobre o “timing” do relaxamento da quarentena. O tamanho dos pacotes fiscais e a injeção de liquidez que foram colocados aguentam mais dois meses. A partir disso, tudo vai depender das restrições. Já vimos uma recuperação importante em outras regiões do mundo, mas os países emergentes estão mais atrasados. Já começamos uma reversão do momento nos ativos de renda fixa aqui no Brasil. Estamos na expectativa das próximas etapas. Vamos recuperar como o resto do mundo, mas agora o coronavírus é que dá as cartas.

Qual é o impacto para os investidores de grandes fortunas?

As marcações negativas de março foram as maiores da história em um período tão concentrado. Foi tão grave que atingiu classes de ativos como debêntures, que tiveram performance muito boa no ano passado. Quando o grau de incerteza é alto, é necessário ter paciência no rebalanceamento das carteiras. Estamos cautelosos em relação às realocações e temos uma postura defensiva nos ativos que vemos uma visibilidade menor no curto prazo.

Que tipo de intervenção foi necessária para proteger o patrimônio das famílias?

Posicionamos a carteira em renda fixa, encurtamos alguns prazos e aumentamos a alocação nesse universo de juros reais. Já na renda variável, aumentamos a nossa posição e fizemos algumas proteções. Nesse campo, há um viés de compra que foi implementado ao longo de março.

Houve reação de levar os recursos para o exterior?

Apenas um movimento tímido. O patamar do câmbio não é convidativo. Se fosse mais favorável, talvez houvesse mais remessas nessa direção.

O coronavírus afetou a confiança do investidor?

Em termos de confiança, o Brasil já estava em um cenário conservador. O País estava saindo de uma crise e é natural que os investidores fiquem mais cautelosos agora. O movimento de poupar será maior no pós-crise, tanto do lado das famílias como das empresas.

O cenário político pode atrapalhar?

Há riscos, porque o Brasil tem as suas particularidades com a política. É um desafio, mas o que realmente vai definir o cenário é a velocidade de combate ao vírus. Por ora, estamos passando no teste de fazer uma gestão razoavelmente responsável. Se houver sucesso, andaremos junto com os outros países, independente da situação política.

Qual é a estratégia a partir de agora?

Olhamos o momento como uma oportunidade, porque essa crise tem um elemento deflacionário importante que vai significar juros menores no Brasil. Ao longo de março, a gente aumentou as alocações em renda fixa indexada à inflação na premissa de que haverá mais redução de juro.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.