O acordo sobre o programa nuclear iraniano ficou praticamente esvaziado de conteúdo após o anúncio do Irã no domingo (5), afirmando que não respeitará mais os limites impostos pelo texto de 2015.

Analistas apontam, contudo, que o Irã mantém alguma cautela e evita renunciar por completo ao pacto.

O acordo entre o Irã e as grandes potências foi assinado em 2015 em Viena para garantir a natureza pacífica do programa nuclear iraniano.

O anúncio de domingo “é apenas um desabafo, porque Teerã dá continuidade a seus anúncios anteriores”, disse um diplomata à AFP.

“O Irã é politicamente muito cauteloso, porque não diz ‘abandonaremos o acordo'”, explica Robert Kelley, ex-diretor de inspeções da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).

Após vários meses de não cumprimento de partes do texto, a comunidade internacional temeu novas violações, em meio à tensão causada pelo assassinato no Iraque do general iraniano Qassem Soleimani em um ataque americano.

A decisão de suspender as restrições às centrífugas, que são usadas para produzir combustível nuclear, “é menos grave do que se temia, que era mudar para 20% de enriquecimento”, disse Ali Vaez, gerente de projetos do International Crisis Group, no Twitter.

O acordo de 2015 estipula que o Irã pode enriquecer urânio somente a 3,67%, um nível bem abaixo dos 90% necessários para fabricar uma bomba atômica.

Após a decisão dos Estados Unidos de abandonar o acordo em 2018 e de restaurar as sanções econômicas, o Irã deixou de respeitar o acordo e, hoje, enriquece 5%.

Este nível permite que as usinas produzam eletricidade.

No domingo, porém, o Irã disse que continuará a colaborar com os inspetores da AIEA, que poderão ter acesso às instalações nucleares do país.

“O JCPOA [acrônimo do acordo] talvez seja um zumbi, mas ainda não está morto”, diz Richard Johnson, da Nuclear Threat Initiative (NTI), dos Estados Unidos.

As centrífugas são indispensáveis para produzir urânio enriquecido. Após o acordo de Viena, o Irã reduziu o número de suas centrífugas ativas em 5.060 (comparado a mais de 19.000 anteriormente) e prometeu não exceder esse número por dez anos.

Em setembro, o país violou o acordo, ao lançar centrífugas com tecnologia avançada na usina de Natanz. Em novembro, também começou a usar as centrífugas na fábrica de Fordo.

De acordo com o analista Kelsey Davenport, do Arms Control Institute, é preciso ver “quantas centrífugas extras o Irã instalará e quantas serão usadas para produzir urânio enriquecido”.

O objetivo original do acordo era que, caso o Irã quisesse fabricar uma bomba atômica – o que o país sempre negou – seria necessário pelo menos um ano, ou mais.

Agora, após várias violações, esse tempo chamado “tempo de interrupção” é inferior a um ano, diz o analista Kelsey Davenport.

Um tempo que seria ainda mais curto, se o Irã obtivesse 20% de enriquecimento e aumentasse a capacidade de suas centrífugas.

“Não há mais nenhum obstáculo que atrapalhe o programa nuclear da República Islâmica do Irã no campo operacional”, afirmou o governo iraniano no domingo.

O país voltou a repetir que está disposto a cumprir o acordo, caso os Estados Unidos suspendam as sanções aplicadas desde 2018.