No final de outubro, Valentim dos Santos Diniz, fundador do Grupo Pão de Açúcar, recepcionou os convidados para a festa de reinauguração da loja número 1 da rede, fundada em 1959, instalada no número 3.138 da avenida Brigadeiro Luiz Antônio (capital paulista). Dificilmente esta cena será protagonizada pelos netos e bisnetos do veterano executivo de 89 anos. Isto porque, na quarta-feira 10, Abilio Diniz, presidente do maior grupo varejista do País e filho de Valentim, anunciou que a família sairá do dia-a-dia da empresa, limitando sua atuação ao Comitê Executivo e ao Conselho de Administração, ambos serão presididos por ele. A decisão afeta diretamente Ana Maria, a única herdeira a ocupar um cargo executivo na companhia (a vice-presidência de Operações) e tida como a sucessora natural do pai. Isso, porém, nunca fez parte dos planos de Abilio. Ela e os irmãos João Paulo e Pedro Paulo também terão assento no conselho e no comitê. Abilio ? que em menos de 10 anos transformou uma rede semifalida em um gigante que fatura R$ 11,5 bilhões e lidera o setor ? será substituído por Augusto Marques da Cruz Filho, atual diretor vice-presidente administrativo e financeiro. O novo presidente do Pão de Açúcar tem 49 anos e foi contratado em 1994. Homem de poucas palavras, detalhista e meticuloso, Cruz é obcecado por resultados. ?Ele tem a obrigação de ter um grande desempenho pois terá o melhor professor do mundo: Eu?, diz Abilio. Apesar de deixar o dia-a-dia, ele continuará ocupando a mesa na sala da diretoria executiva, a poucos metros de Cruz. O novo dirigente garante estar preparado para a missão. ?Tenho sido um bom aluno?, afirma.

 

 

O anúncio da profissionalização da gestão do Pão de Açúcar agradou ao mercado. ?A solução foi perfeita?, avalia Adriano Pitoli, economista da Tendências Consultoria. ?Ele (Abilio) agiu corretamente ao definir uma situação delicada, como a sucessão, quando o grupo vive seu melhor momento?, completa Claudio Felisoni de Angelo, coordenador-geral do Provar-USP, consultoria da Universidade de São Paulo. Analistas dizem ainda que a medida também pavimenta o caminho para que o grupo possa atrair um novo sócio estratégico, arma importante em um mercado onde a competição é acirrada. O francês Casino já detém 24,5% do capital votante. Tem a opção de chegar a 40%, se pagar US$ 540 milhões. Abílio não descarta este caminho. ?O contrato já prevê isto?, diz. A saída do clã Diniz confere ao grupo, cujas ações são cotadas nas Bolsas de São Paulo e Nova York, uma aura de transparência. Segundo Abilio, a reestruturação era, de fato, inevitável. ?Meus filhos e eu não acreditamos que uma empresa familiar possa ter sucesso após atingir determinado tamanho?, argumenta. O organograma desenhado por Abilio mantém, no entanto, posições chaves nas mãos dos Diniz. Ana cuidará do Comitê Financeiro e João presidirá o Comitê de Desenvolvimento e Marketing. Pedro se limitará aos assentos que tem direito no comitê e no conselho. Em entrevista à DINHEIRO Abilio se disse preparado para assumir um papel secundário em sua empresa: ?Eu sou o principal ativo da empresa. Tenho muito a ensinar ?.

Ana Maria deixou escapar uma pontinha de decepção. ?Fui a mais afetada pelas mudanças?, avalia. Aos 41 anos, ela pretende lançar-se na carreira de consultora. Será a principal executiva e sócia local da consultoria montada em parceria com os americanos Peter Senge (um dos mais festejados gurus da administração) e Fred Koffman. O contato com eles aconteceu em abril, durante um curso de gestão empresarial na Universidade Harvard (EUA). ?Foi um casamento perfeito?, diz. O escritório começa a funcionar em fevereiro mas ela já faz planos ambiciosos: ?Vamos abrir filiais no México, Argentina e também na Europa?, garante.

?CHEGOU A HORA DE SAIR?
Um dia após anunciar as mudanças no Grupo Pão de Açúcar, Abilio Diniz deu a seguinte entrevista para DINHEIRO:
Qual a finalidade da reestruturação do grupo?
Quero preservar a vitalidade e garantir a continuidade da empresa. E isso não seria possível mantendo o modelo atual de administração. Chegou a hora de sair.

Dava-se como certo que sua filha, Ana Maria, ocuparia seu lugar. O que mudou?
Ela nunca foi treinada para isso. Estou ensinando meus filhos a serem empresários e terem capacidade para tomar decisões.

O sr. vai, de fato, se afastar do dia-a-dia da companhia?
Com certeza. Tenho plena consciência de que é o melhor para a empresa.

E o que o seu sócio, o Casino, achou da reestruturação
do grupo?
Eles foram comunicados de nossa intenção em meados do
ano e não só aprovaram como também acompanharam
todo o processo.