André Lara Resende, um dos pais dos planos Cruzado e Real, ex-negociador da dívida externa e ex-presidente do BNDES, vai sair de circulação como homem público para poder voltar ao mercado como financista. O economista, fundador do Banco Matrix no início dos anos 90, está a menos de um mês de abrir para o mercado uma nova companhia de investimentos, formada em parceria justamente com os sócios que controlam hoje o seu antigo banco. Sua nova incursão no mercado, segundo Lara explicou à DINHEIRO, será uma empresa de administração de fundos semi-fechados, a exemplo dos hedge funds americanos. ?Vamos limitar as entradas e saídas de dinheiro?, adianta o economista.
O modelo vai permitir aos fundos a montagem de operações grandes e de longo prazo. O negócio tem alvo certo: o dinheiro de grandes investidores institucionais internacionais. Traduzindo em miúdos, Lara e os donos do Matrix vão ser os gestores no Brasil do dinheiro de grandes bancos de investimento estrangeiros e de fundos de investimento fechados internacionais.

O perfil da clientela escolhida representa quase uma volta às origens. Um dos negócios centrais do Matrix em seus primeiros anos era justamente o de representar estrangeiros no mercado brasileiro. A instituição andou afastada desse caminho, mas, com o mercado cada vez menos favorável para as tesourarias se arriscarem em operações de valor alto, a idéia voltou a encantar seus sócios. Parte dos contatos que o banco tinha àquela época está sendo agora retomado, mas ainda como sondagem, porque a captação de dinheiro ainda não foi oficialmente iniciada. As conversas, porém, estão adiantadas. A previsão é de que a empresa esteja em operação em no máximo quatro semanas.

O novo negócio ainda não tem nome, mas já começa a ganhar forma. André Lara ficará no conselho, juntamente com os três maiores sócios do Matrix, Roberto Moritz, Antônio Carlos Freitas Valle e Roberto Ruhman. ?Já passei da idade de ficar em mesa de operações?, resume o economista. Seu papel será, como o dos demais conselheiros, de traçar estratégias e de abrir as portas dos grandes investidores para a companhia. Os outros seis sócios com participação menor no banco também estarão na empresa e serão eles os encarregados de colocar a mão na massa ? terão a responsabilidade de ocupar os cargos executivos.

Longe do BC. Um modelo que chegou a estar em discussão entre os sócios foi o da GP Participações, a empresa para onde os ex-banqueiros liderados por Jorge Paulo Lemann se mudaram de vez logo após a venda do Banco Garantia. É o tipo de negócio que tem a vantagem de ser integralmente não financeiro e de, com isso, estar liberado dos intermináveis e caros controles que o Banco Central exige dos participantes do mercado. Mas a preferência acabou recaindo sobre um modelo mais próximo da experiência acumulada no dia-a-dia do Matrix. ?O projeto envolve ao mesmo tempo operações em bolsas e com empresas?, diz um representante dos sócios do banco. Um exemplo de negócio que cabe no perfil da nova empresa é a operação que acabou na venda da Elevadores Atlas, no ano passado. O Matrix tinha comprado nas bolsas uma participação acionária relevante na empresa e, com os demais minoritários, ajudou a conduzir a empresa até a venda ? lucrativa para os acionistas ? do controle para a concorrente Schindler.

Pegar um novo projeto a unha é praticamente a única rotina na trajetória profissional de André Lara nos últimos anos. Quando o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso começou, ele era assessor especial do presidente e estava escolhido para chefiar um estelar conselho de assessores econômicos. O conselho não saiu do papel e o economista, ainda sentindo o bombardeio causado pelo grampo do BNDES, que o derrubou da presidência do banco no segundo semestre do ano anterior, preferiu se retrair. Lara chegou a se associar ao outro grande afetado pelo grampo, o ex-ministro Luís Carlos Mendonça de Barros, para lançar um site de análise política e econômica na Internet, o Primeira Leitura, mas sua aventura na rede acabou antes mesmo de o site ir ao ar. A oportunidade de voltar ao mercado em parceria com os sócios do banco que fundou falou mais alto.

Vida de banqueiro o economista sabe levar. Obcecado pela idéia de não expor sua intimidade, Lara, nas poucas vezes em que é visto em público, está às voltas com brinquedos caros como carros esportivos e cavalos. A paixão pela velocidade já lhe valeu vitórias em corridas de resistência, como os 500 Quilômetros de Interlagos, e até um honroso quarto lugar em uma das mais tradicionais provas do mundo, as 24 Horas de Daytona. Quando não está com o boné do Porsche Clube do Brasil, do qual é sócio de primeira hora, pode ser visto com o chapéu usado pelos cavaleiros que disputam provas de saltos, nos clubes de hipismo. O gosto pelos cavalos é uma mania compartilhada por um de seus novos sócios, Antônio Carlos Freitas Valle, e foi um dos fatores que manteve a amizade entre eles após a saída do economista do Matrix.

A criação da companhia de investimentos aumenta a carteira de negócios dos sócios do Matrix num momento em que o banco passa por um processo inverso, de redução drástica nas atividades. O balanço do primeiro semestre revelou um corte no resultado com a atividade bancária de R$ 186 milhões, nos seis primeiros meses de 1999, para uma quantia irrelevante, de R$ 2 milhões. Os ativos caíram de R$ 511 milhões para R$ 240 milhões, e os lucros desapareceram, passando de R$ 140 milhões para R$ 2 milhões. Juntando esses dados ao anúncio recente de um acordo com o Itaú ? que assumiu a venda e a administração da burocracia dos fundos de investimento ? e à venda da financeira do banco para o Fininvest, o resultado é uma retirada acelerada do Matrix da atividade bancária. Os sócios discutem desde o início do ano a conveniência de manter ou não ativa a carta patente da instituição financeira, que traz custos e responsabilidades perante o BC, e parece estar chegando o momento da decisão.