Enquanto o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ganhava projeção nacional ao encabeçar reformas econômicas, coube ao seu par no Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) um papel de apoio. Agora, com a guerra posta entre Legislativo e Executivo pelo orçamento impositivo, o jovem senador amapaense ganhou os holofotes ao articular um acordo para garantir os recursos do orçamento impositivo na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020 sem elevar o clima de tensão entre os Poderes. O processo para o acordo, no entanto, teria sido mais fácil se o governo não tivesse acirrado a tensão com o Legislativo, o que exigiu ainda mais jogo de cintura do senador.

Nas últimas semanas, além de Bolsonaro compartilhar um vídeo de apoiadores que pediam o fechamento do Congresso, falas do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do general Augusto Heleno (do Gabinete de Segurança Institucional) incomodaram parlamentares, que preveem piora na negociação com o governo após a troca de Onyx Lorenzoni e pelo general Braga Neto no comando da Casa Civil. Para tentar passar tudo em pratos limpos, um encontro entre Bolsonaro e Alcolumbre, na última semana, foi marcado pela postura enfática do senador, que garantiu ao presidente Bolsonaro que a Casa não irá tolerar mais ataques ao Legislativo.

Depois de se entender com o presidente, foi a vez de Alcolumbre entrar de com força na briga pelo orçamento impositivo. A queda de braço envolve R$ 30,1 bilhões em emendas parlamentares previstas para 2020 — cifra que o Congresso aprovou em dezembro como de execução obrigatória do Executivo. Quando a LDO foi enviada para sanção presidencial, Bolsonaro vetou alguns trechos, deixando parte do orçamento mais flexível e passível, inclusive, de contingeciamento. “Se o governo puder escolher quando e com quais parlamentares vai usar esse recurso, isso será usado como prêmio para os que votarem com ele, como aconteceu na reforma da Previdência”, diz a deputada Maria do Rosário (PT-RS). Em contrapartida, o senador Major Olímpio (PSL-SP) afirmou que derrubar o veto incentiva a política de troca de favores. “Ninguém está discutindo as emendas individuais ou de bancadas. O que se discute é o fim de acordos em que se beneficiam aqueles que são amigos dos presidentes do Senado e da Câmara”, afirma.

ACORDO Quando Maria do Rosário diz A e Major Olímpio diz Z, é provável que a verdade esteja no meio do caminho. O fato é que após quatro semanas de impasse governo e Congresso firmaram um acordo sobre o Orçamento. A decisão foi tomada após o presidente Bolsonaro tirar parte dos poderes de Paulo Guedes tanto na interlocução com o Congresso quanto na aplicação do Orçamento da União. Para tentar abrir o diálogo com o Parlmento, e depois de lidar com encontros esvaziados com lideranças políticas, foi a hora de Alcolumbre agir. Na madrugada de terça-feira 3 o presidente do Senado conseguiu costurar um acordo. Ficou determinado que o governo deixaria na mão do Congresso R$ 20 bilhões dos R$ 30 bilhões em jogo, contanto que o Parlamento não derrubasse os vetos de Bolsonaro. Foi também decidido que o Planalto enviaria três Projetos de Lei para regulamentar o uso dos recursos daqui por diante. “O projeto amplia a regulamentação do orçamento impositivo, assegura prerrogativas do Executivo e cria critérios para pagamento”, diz o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE). Segundo Paulo Guedes, tais alterações são necessárias para permitir modificações nas emendas, e assegurar o cumprimento da meta fiscal deste ano (déficit primário de R$ 124,1 bilhões).

CARMA A queda de braço sobre as emendas não é nova. Em 2015, antes do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, Jair Bolsonaro (ainda deputado) defendia o orçamento impositivo. O objetivo à epoca era aprovar pautas-bomba que pressionassem o governo.Para o analista político Sérgio Lobo, esse cenário criou o que chamamos de parlamentarismo branco, que dá ao Legislativo obrigações do Executivo. “Viramos a república da chantagem.”

O impasse com o Congresso é só o primeiro passo de uma tensão que poucos anos atrás derrubou a presidente. Esse receio, inclusive, já foi sinalizado por interlocutores de Guedes, que vê chance de a Câmara prejudicar projetos como o de autonomia do BC e as PECs emergencial e dos fundos públicos só para atingir o governo.