Durante três dias, de segunda-feira 18 a quarta 21, Belém do Pará recebeu o Fórum Mundial de Bioeconomia. Lançado em 2018, essa é a primeira vez que o evento acontece fora da Finlândia. A escolha do Brasil como sede aconteceu há dois anos durante uma conversa de Jukka Kantola, fundador do Fórum, com Marcello Brito, presidente da Associação Brasileira da Agropecuária (Abag), e surpreendeu. Primeiro pela postura abertamente contrária a qualquer agenda pró-ambiental do governo Bolsonaro. Segundo, por ter sido articulada por uma entidade que representa o agronegócio, setor pintado como vilão do meio ambiente pela comunidade internacional. Só o fato de ter sido em território nacional, nesse contexto reputacional, já foi muito positivo. Mas para que a discussão ganhe desdobramentos efetivos ainda precisa atrair a atenção de um agente fundamental: o capital.

Para ter dimensão da distância que existe, durante as mais de 30 horas de palestras e discussões listadas na programação oficial, a participação de assuntos relacionados direta e exclusivamente ao financiamento sustentável não chegou a 10%. Não é necessariamente demérito dos organizadores do evento, mas é uma evidência de quanto o tema é periférico para o setor financeiro. Vale lembrar aqui que, como disse Janaina Dallan, sócia da Carbonext e presidente da Aliança Brasil em Soluções Baseadas em Natureza, nas Páginas Azuis desta edição (ver página 10), o engajamento dos líderes mundiais no Acordo de Paris e suas metas para a redução do aquecimento global só aconteceu “quando Larry Fink, CEO da Blackrock, escreveu uma carta aos seus clientes [janeiro de 2020] alertando que, para garantir a perpetuidade do negócio, os executivos deveriam passar a avaliar as questões climáticas como riscos de negócio.”

O não interesse do capital tem suas justificativas. O termo bioeconomia é muito amplo e — talvez em decorrência desse fato — o setor sofre com a falta e a desorganização de dados. Sem dados precisos, o capital não trabalha. Exemplo básico são as estimativas de receita já movimentadas pela atividade no Brasil que vão da casa de alguns milhões até a de trilhões de reais, como a divulgada pelo BNDES durante o evento que aponta para R$ 1,77 trilhão. Ao ano. No Brasil. E ainda que se chegue a um dado razoavelmente crível sobre a receita, as novas frentes da bioeconomia — separando as grandes indústrias já estabelecidas como papel e celulose, plantio de commodities e produção de gado que, sim, são consideradas bioeconomia — as provenientes da floresta em pé são pouco escaláveis e dependem do ciclo da natureza para serem produzidas. Tudo isso traz pulverização e pouca previsibilidade de receita recorrente, ingredientes capazes de gerar choque anafilático ao mercado financeiro.

REPERCUSSÃO Ainda que os desafios existam, a realização do evento no Pará é significativa, mesmo sem qualquer envolvimento do presidente da República, Jair Bolsonaro. A opinião é do diretor-executivo do WWF-Brasil, Maurício Voivodic. “As iniciativas da sociedade e dos governos subnacionais têm potencial de preparar o Brasil para que, quando tivermos um governo alinhado às questões climáticas, as ações ganhem velocidade e escala”, afirmou à DINHEIRO. A participação dos governos estaduais, segundo Carolina Genin, diretora do programa de Clima do WRI Brasil, traz outras vantagens como o respeito aos diversos biomas. “O Brasil é tão biodiverso que não dá para tratar a bioeconomia de São Paulo da mesma forma como a da Amazônia”.

Para o Embaixador José Carlos da Fonseca, diretor-executivo da Indústria Brasileira de Árvores (Ibá) que ao lado da Abag foi parceira do evento, a realização do Fórum no Brasil aproximou a comunidade internacional do real contexto amazônico e demonstrou à comunidade internacional o que o brasileiro de fato almeja. “Queremos contribuir para que esse ciclo danoso que pode levar o planeta a um ponto de não retorno seja interrompido.” Só precisa alinhar com o chefe da nação.