Neste momento, em que passamos por uma crise mundial de saúde pública e com o isolamento social, muitas reflexões e mudanças estão acontecendo na vida das pessoas e empresas. Os desafios em meio aos conflitos econômicos e sociais têm feito com que indivíduos e corporações tomem iniciativas que vão contribuir no curto e no longo prazo e quem sabe mudar hábitos e costumes, tanto no âmbito pessoal, quanto no empresarial, e, principalmente, no modo de agir e pensar de cada um.

Nas grandes capitais do Brasil, a maioria das empresas passaram a trabalhar em home office, comércios estão fechados, somente aquele varejo dito fundamental funcionando, escolas e universidade se adaptando para aulas on-line, pequenas e médias empresas se adaptando para sobreviver, profissionais liberais buscando alternativas e apoios governamentais e bancários, empresas gigantes doando de tudo o que se possa imaginar. Nunca a filantropia e o investimento social privado, que tenho chamado de Responsabilidade Social e Ambiental 1.0 (RSA 1.0), foi tão forte e divulgado.

Eu tinha planejado fazer uma lista de atividades das empresas e suas ações beneficentes durante este período para este artigo, mas é quase impossível, pois cada dia recebo de duas a três novas notícias de solidariedade empresarial. Os alunos e alunas me trazem notícias diariamente com estas grandes e médias empresas, sempre com a pergunta: mas professor, eles estão fazendo isso porque acreditam ou porque querem aparecer? Ou é uma estratégia de mercado? E ainda tem muita empresa doando produtos: será que é sampling (distribuir amostra grátis para o futuro consumidor testar)? É por acreditar na melhoria das pessoas ou é simplesmente para ter mais mercado e lucro?

Perguntas que realmente fazem a gente refletir o quanto estas ações são mercadológicas, ideológicas, midiáticas, se são para as empresas se livrarem do estoque, ou filantrópicas e alinhadas com a missão, visão e valores da empresa.

Para ilustrar o quanto já foi doado, a Associação Brasileira de Captação de Recursos (ABCR), no Monitor das Doações da COVID-19, neste início de abril apresentou R$ 1 bilhão de reais doados para enfrentar a pandemia, juntando doações empresariais, pessoais e familiares. Além das várias vaquinhas virtuais e campanhas institucionais de ONGs. Se você analisa a lista, grande parte é de empresas e fundações empresariais. Só um grande banco anunciou esta semana a doação de mais R$ 1 bilhão de reais.

Só para termos uma ideia de valores, o GIFE, associação dos investidores sociais do Brasil, sejam eles institutos, fundações ou empresas, que possui cerca de 160 associados (dados de 2018, os maiores investidores do país), investiu um valor aproximado de R$ 3,24 bilhões. Veja o censo dos associados com todos os dados aqui.

A resposta que dou para essa pergunta dialética – que pode se tratar de causa social ou financeira, “marqueteira” ou solidária, pornográfica ou romântica – é: não importa. Não é hora de polarizar até isso! O que temos que fazer agora é o possível para ajudar as pessoas, temos que mostrar as marcas, os componentes, os potenciais de cada companhia! Temos que fazer a economia e a solidariedade girar.

Um conceito já difundido por John Elkington, há mais de 25 anos, sobre o tripé da sustentabilidade diz: o ambiental, o social e o econômico têm que andar juntos. O pensamento tem que ser sinérgico e não antagônico. Sim, é difícil e para alguns, até utópico pensar neles todos juntos. Tenho vários colegas da área financeira que acham isso uma “viagem” ou uma “brisa” (como dizem os mais novos). Porém, é o novo paradigma que teremos que trabalhar, pesquisar e ao qual devemos nos adaptar. Pois estamos globalizados, ligados uns aos outros e impactando todos a todo momento.

A Rede Brasil do Pacto Global da ONU divulgou uma figura de como crise global da saúde afetará todos os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Pacto Global/Divulgação

Entendo essas relações da figura como mais um desafio para podermos superar, uma forma de termos propósitos e causas (palavras que estão na moda) para as empresas e organizações. Não devemos polarizar e sim usar todo o conhecimento que temos para mudarmos para um pensamento que não seja o lucro pelo lucro, mas sim com um fundamento e impacto positivo socioambiental.

Espero que as empresas comecem a repensar os produtos e serviços para que, efetivamente, tenham um desenvolvimento real da sociedade.

Aproveitemos este momento para refletir e mudar!

* Marcus Nakagawa é professor da ESPM; coordenador do Centro ESPM de Desenvolvimento Socioambiental (CEDS); idealizador e conselheiro da Abraps; e palestrante sobre sustentabilidade, empreendedorismo e estilo de vida. Autor dos livros: “Marketing para Ambientes Disruptivos” e “101 Dias com Ações Mais Sustentáveis para Mudar o Mundo” (Prêmio Jabuti 2019). www.marcusnakagawa.com / @ProfNaka / @marcusnakagawa