Ping: Sérgio Abranches, cientista político e escrito

1. Mudanças de postura e auxílio emergencial podem explicar o aumento da base de apoio a Bolsonaro?

O auxílio emergencial durante a pandemia produziu algum alívio, mas esta é outra armadilha que ele terá de desarmar. Ele não tem recursos fiscais para manter o nível de transferência de renda para não criar decepção e frustração quando o auxílio emergencial acabar. A sustentação desse apoio tem a ver com apoio material. Pode ser um grande problema no futuro, por isso ele quer furar o teto (de gastos). Ainda não sabemos se esse apoio material pode se transformar em voto, por exemplo.

2. Episódios como a debandada do Ministério da Economia, a saída de Moro e a aproximação com o Centrão põem em xeque o discurso que Bolsonaro fez na eleição?

O governo finalmente tirou todas as máscaras que usou na campanha. Bolsonaro não contribuiu para qualquer tipo de reforço na legislação anticorrupção, não foi contra a política fisiológica tradicional e não demonstrou aptidão para a política não tradicional. Com isso, ele teve que fazer ajustes no governo para conseguir o que quer. (Aquelas bandeiras) eram incompatíveis com Bolsonaro.

3. A distribuição de cargos para o Centrão mostra mudança de rumos?

O presidente Bolsonaro se deu conta de que a ideia de que poderia governar sem uma aliança era inviável. Ele não se aproximou do Congresso, mas da parte mais fisiológica do Centrão. Deu mais espaço para determinadas lideranças, com isso o Centrão se fragmentou, se dividiu. Bolsonaro está com o Centrão minoritário. No Brasil, estas alianças (como a feita pelo presidente), por não serem feitas em termos programáticos e, sim, fisiológicos, não são compromissos de apoio integral.

4. Bolsonaro é o presidente com mais vetos derrubados pelo Congresso. Vê alguma chance de a relação com o Legislativo melhorar com essa aliança com o Centrão?

Acho pouco provável. O contexto está cheio de armadilhas, como ultrapassar o teto de gastos, a volta de impostos. De um lado, ele é refém do Centrão fisiológico. Do outro, precisa atender o que setores responsáveis do ponto de vista fiscal querem. Atender responsabilidade fiscal e fisiologismo do Centrão ao mesmo tempo é incompatível. Ou resolve isso perdendo apoio do Centrão ou desses setores do mercado. Não há solução conciliatória. Estas alianças de Bolsonaro têm implícito um acordo de preservação de impunidade e de imunidade que faz com que seja mais uma aliança de cumplicidade para fazer coisas avançarem, do que uma coalizão. Não há desejo do Bolsonaro de se comprometer integralmente com a sua base.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.