Acordar, tomar um belo café da manhã, escovar-se, fazer as unhas, ficar pronta para o trabalho. Depois do almoço, mais uma rodada de obrigações. No fim do dia, relaxar sob os efeitos de uma massagem. Por fim, jantar e dormir o sono dos justos. Olívia faz isso diariamente.

32.jpg
Vida boa: Cavalo passeia pelo Clube Hípico de Santo Amaro (SP): 
atividade consta do treinamento diário

Nada de mais, se Olívia não fosse uma égua da raça alemã holsteiner. Ela e os cavalos hospedados nas 436 baias do Clube Hípico Santo Amaro, em São Paulo, são tratados a pão de ló. Esses animais fazem parte da realeza de uma tradicional modalidade do hipismo, o salto, e cumprem uma agenda digna de príncipes, além de terem um grupo de funcionários ao seu dispor.

 

Manter esses nobres equinos –  e os melhores estarão participando do Athina Onassis International Horse Show, de 26 a 29 de agosto – na estica e dentro da performance esperada custa, em média por mês, R$ 2,5 mil por cavalo, entre taxa de estalagem, alimentação, treinador e apetrechos para o dia a dia. 

 

Fora o investimento inicial de R$ 78 mil, que inclui cavalo jovem, até 4 anos (custo de R$ 10 mil a R$ 40 mil), o título de um clube hípico (que varia entre R$ 30 mil e R$ 90 mil) e os paramentos para treino e provas do cavalo e do cavaleiro (leia quadro). 

 

33.jpg

Animais de salto têm regalias de fazer inveja até à realeza. Por isso custam tanto para seus donos

 

 

No caso de o futuro cavaleiro não querer investir em um título de clube, existe a opção do manège, um centro de treinamento com hospedagem. O custo médio mensal nesses lugares é 20% mais caro que nos clubes hípicos.  

 

Tratados como filhos pródigos por seus donos, que neles investem seu rico dinheiro e expectativas, os cavalos usados nas competições de alto nível recebem cuidados diários e mantêm uma rotina regrada, com hora para tudo: até para acordar, passear e dormir. 

 

“Eles ‘acordam’ com a chegada dos tratadores na baia, por volta das 6h30, e vão dormir perto das 18h”, conta Karina Smith, proprietária de uma loja de artigos de selaria, diretora técnica de salto do Clube Hípico de Santo Amaro e da Federação Paulista de Hipismo e dona de três cavalos: os machos Fly With Me, puro-sangue inglês, e Oiti, BH (brasileiro de hipismo), e a égua holsteiner Olívia. 

 

31.jpg

 

Depois que o tratador chega, ele retira a serragem suja da noite e coloca uma nova e limpinha. Os cavalos tomam o café da manhã (ração) e são preparados para o primeiro trabalho do dia: treinar com o seu cavaleiro na pista de obstáculos.  O dia segue recheado de atividades e mordomias, que incluem passeios, treino no piquete, no andador, na esteira (como a das academias), massagem, acupuntura e fisioterapia. Entre os custos mensais mais altos estão a taxa de estalagem (inclui o tratador), que varia de R$ 800 a R$ 1.000, e do treinador, que custa entre R$ 500 e R$ 1.000. 

 

Muitas vezes, o treinador faz o trabalho do cavaleiro, de movimentar o cavalo diariamente – o animal não pode ficar parado e, se seu dono não pode ir à hípica, alguém tem que realizar o treino. Em torno de R$ 400 é o que será gasto mensalmente na alimentação. Aliás, a dieta deles é um capítulo à parte. Composta de ração, alfafa, feno e coast cros (um capim específico para a alimentação de cavalos de alta performance), inclui também o famoso torrão de açúcar. 

 

34.jpg

Alta performance: Saltar sobre obstáculos duas vezes ao dia, treinar no piquete e correr na esteira fazem parte da rotina de um cavalo de salto 

 

Sim, aquela imagem romântica, tão propagada pelos filmes, da preferência dos cavalos por torrões é verdadeira. “Eles adoram, bem como cenoura, maçã e até rapadura. O torrão é o chocolate deles”, explica Karina. Claro que realizar essa vontade – e é difícil resistir ao pedido deles – traz consequências para o bolso do dono. Uma embalagem de torrões de açúcar, de 1 kg, custa R$ 20, mas gasta-se na consulta do veterinário para fazer a retirada do tártaro em média R$ 350, informa a veterinária Priscila Azevedo. 

 

30.jpg

 

Além do dentista, existem outros cuidados médicos a serem contabilizados por quem pretende entrar no mundo das cocheiras estreladas. Uma das principais preocupações que se tem com a saúde do cavalo é relacionada à cólica estomacal. Se uma pessoa pode perder uma boa noite de sono por causa desse incômodo, em uma égua ou cavalo a situação é bem mais complicada. 

 

Na verdade, o episódio é o maior terror para eles e para seus donos, pois pode levar à morte – os cavalos não conseguem colocar pra fora o que lhes incomoda e o intestino pode se contorcer de uma maneira irreversível. Por isso, garantir o monitoramento das baias, com câmeras ou a ronda de um segurança treinado para identificar os sintomas – inquietação, bater com a pata no chão ou ficar toda hora olhando para a barriga, entre outros sinais –, é essencial. 

 

“Um atendimento de emergência para tratar cólica custa cerca de R$ 800. E, em média, R$ 5 mil uma cirurgia para a correção do mesmo problema”, revela Priscila. Também, assim como as mulheres, as éguas têm TPM. “No caso das éguas mais arredias, é preciso medicar. Elas tomam anticoncepcionais”, diz Karina.  

 

Além desses gastos, ainda há toda a parafernália da “beauté equina”: o xampu (R$ 25, o litro), o repelente (R$ 20, 500 ml), o desodorante (R$ 25, 500 ml – na verdade é um produto que limpa o efeito do suor do cavalo), escova (R$ 25), raspadeira  (R$ 30 – para a sujeira mais profunda do pelo) e a pedicure (cortar e lixar o casco e ferrar o cavalo, que tem custo mensal de cerca de R$ 200). Quem pensou que a vida de cavalo é fácil? Quer dizer, a dele até que é. Já a do dono…