Ao anunciar a manutenção da Taxa Referencial Selic em 2% ao ano em sua reunião encerrada no dia 9 de dezembro, o Comitê de Política Monetária (Copom) confirmou todas as expectativas do mercado. Até as pedras de granito que forram o piso da entrada do Banco Central (BC), em Brasília, sabiam que a Selic encerraria 2020 no nível historicamente baixo alcançado em agosto, devido tanto à desaceleração da economia quanto aos impactos negativos da pandemia sobre as expectativas do mercado.

No entanto, se o Comunicado sobre a decisão, divulgado na própria quarta-feira, apenas confirmou as expectativas, a Ata da reunião, publicada pelo BC na terça-feira (15) trouxe alguns pontos inesperados. Entre eles, a percepção de que a entidade parece estar muito mais tolerante com a inflação do que estava havia alguns anos. Em seus 22 parágrafos, escritos na tradicional linguagem neutra e desassombrada dos banqueiros centrais, a Ata mostra também que o BC não está muito otimista com a recuperação da economia em 2021. Isso indica que, além de permanecerem baixos, os juros vão demorar mais do que o esperado para voltar a subir.

Essa convicção surge logo no segundo parágrafo do documento. “A incerteza sobre o ritmo de crescimento da economia [brasileira] permanece acima da usual, sobretudo para o período a partir do final deste ano, concomitantemente ao esperado arrefecimento dos efeitos dos auxílios emergenciais.” E se repete no parágrafo 12: “Os dados recentes continuam refletindo uma recuperação desigual da atividade econômica [brasileira]. Prospectivamente, a pouca previsibilidade associada à evolução da pandemia e ao necessário ajuste dos gastos públicos a partir de 2021 aumenta a incerteza sobre a continuidade da retomada da atividade econômica”.

Em vários trechos da Ata, o Comitê descarta os riscos de inflação. “Apesar da pressão inflacionária mais forte no curto prazo, o Comitê mantém o diagnóstico de que os choques atuais são temporários”, consta do parágrafo 6. “As expectativas de inflação permanecem ancoradas”, está claro no parágrafo 12.

ÍNDICES DE PREÇO Isso ocorreu apesar de alguns índices terem surpreendido o mercado. Na terça-feira (15) a Fundação Getulio Vargas (FGV) divulgou o IGP-10 de dezembro, que registrou aumento de preços de 1,97%. No ano, entre janeiro e dezembro, a inflação acumulada foi de 24,16%, o maior resultado acumulado para um ano gregoriano desde os 24,68% de 2002, em que o dólar disparou. E na edição do boletim Focus de 14 de dezembro, a projeção de inflação medida pelo IPCA era de 4,13%. Apenas quatro semanas antes, a estimativa dos bancos era de 3,25%, quase um ponto percentual menos.

Para encerrar, no parágrafo 11 o Copom mostra que o cenário internacional não é dos melhores. “No curto prazo, a ressurgência da pandemia e o aumento do distanciamento social em algumas das principais economias devem interromper a recuperação da demanda”, apesar de o Copom não descartar uma recuperação mais robusta no médio prazo, dependendo dos resultados da vacinação.

O que esperar? Segundo os economistas do Itaú Unibanco o Copom só poderia descartar sua orientação de manter os juros baixos quando voltar o foco de suas atenções para 2022. Para o banco, isso só deverá ocorrer na reunião do Copom agendada para maio do ano que vem. No caso de as expectativas de inflação piorarem mais, isso poderia ser antecipado para março. No entanto, dadas as projeções do banco, a alta de juros só deverá começar em agosto, para encerrar o ano em 3,5%. Para o economista Alexandre Almeida, da corretora CM Capital, a Ata do Copom é clara ao sinalizar que os juros vão demorar para subir, apesar do aumento dos preços no encerramento de 2020. “A alta da inflação tende a ser muito mais decorrente de um choque temporal nos preços da alimentação e da energia em dezembro, mas esses choques vão passar”, disse ele.

Como a principal tarefa do Copom é manter a inflação dentro da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), não se espera aumento dos juros no curto ou mesmo no médio prazo. “As expectativas do próprio BC para a inflação oficial, medidas pelo IPCA, ainda estão dentro da meta até 2022”, disse Almeida. “Não há motivos para esperar uma alta de juros no curto prazo.” Atualmente em mirrados 2% ao ano, a Selic ainda vai demorar para crescer e aparecer.