Independência. É a isso que cheira a captação de 750 milhões de euros (US$ 914 milhões) feita pelo Brasil na quarta-feira 8. Com a emissão de títulos no exterior ? a quarta realizada em 2004 e, de longe, a mais bem-sucedida ?, o País cumpre antecipadamente sua meta de captações para este ano, estimada em US$ 4 bilhões. Como a demanda por títulos brasileiros se mostrou aquecida de um modo que há anos não se via, a tendência é o governo voltar ao mercado internacional de bônus, já pensando em construir reservas para 2005. Resumindo, criou-se um colchão financeiro que oferece proteção para vôos mais altos da economia. Deste modo, pelo menos em tese, o País liberta-se de uma das mais tenazes amarras ao crescimento: a vulnerabilidade externa e a suposta necessidade de manter a taxa de juros na estratosfera (ou mesmo elevá-la) para atrair capitais estrangeiros. Demonstrou-se na quarta-feira que, se o investidor internacional não vem ao Brasil, o Brasil já tem condições de ir até ele ? em plena Europa, onde não se captava um tostão desde o início de 2002. A desconfiança dos mercados internacionais, ao que tudo indica, ficou para trás. O risco-país encontra-se em seu menor nível desde o início de 1998: 496 pontos. Quase nada para quem estava na casa dos 2.400 pontos há exatos dois anos. O dólar estabilizou-se abaixo dos 3 reais e tem sua menor cotação em cinco meses: R$ 2,90. No acumulado do ano, o superávit comercial é de US$ 21,951 bilhões ? um recorde histórico. Diante dessas evidências, o discurso que aponta a crise cambial como alternativa inevitável ao aperto monetário soa, no mínimo, obtuso.

Dadas as condições da operação da quarta-feira, pode-se dizer que o governo captou dinheiro relativamente barato. O País vai pagar juros de 8,7% ao ano por um empréstimo de oito anos. Em 2002, em emissão semelhante, o governo teve de aceitar uma taxa anual de 11,55% e um prazo de sete anos. Na mesma quarta-feira, nos Estados Unidos, a Petrobras captou US$ 600 milhões, elevando o saldo do dia a quase US$ 1,5 bilhão. De acordo com especialistas, há ambiente para um lançamento de títulos federais, em dólares, com prazo de vencimento superior a 10 anos. ?O governo tem duas formas de elevar as reservas internacionais do País: comprar dólares no mercado interno ou emitir papéis no exterior?, observa Alexandre Póvoa, diretor da Modal Asset Management. ?No momento, a segunda opção é mais vantajosa?, avalia. Por conta das instabilidades recentes, o Brasil tem um dos níveis mais baixos de reservas entre os países emergentes. São apenas US$ 22 bilhões em caixa, contra algo em torno de US$ 50 bilhões de potenciais concorrentes como México e Turquia. Corrigir esta discrepância e aumentar o estoque de munição à disposição do País para enfrentar possíveis crises externas são uma preocupação das mais legítimas.

Colaborou Paula Pavon

US$ 600 milhões é o valor da captação de
recursos feita pela Petrobras na quarta-feira 8