A economia brasileira experimentou nos últimos dias uma divisão entre dois mundos, o real e o especulativo. No primeiro, as notícias recentes apontavam sinais favoráveis: superávit fiscal em alta, saldo da balança comercial em US$ 2,9 bilhões, inflação em baixa e uma retomada, ainda que gradual, dos níveis de produção. No segundo, o dólar continuava em disparada, beirando R$ 2,90, e o risco País voltava, de forma irracional e grotesca, a superar o da Nigéria. Enquanto o Brasil de quem produz reagia, o mundo dos chacais do mercado financeiro vendia a tese de que o País seria a nova vítima de uma profecia auto-realizável. De tanto se falar em crise, a crise se instalaria com toda a força e os especuladores que colocaram o Brasil na linha de tiro colheriam seus lucros. É uma escolha de alto risco. Tudo indica que essas apostas serão fracassadas. ?O nervosismo irá passar porque não tem qualquer contato com a economia real?, avalia José Roberto Mendonça de Barros, consultor da MB Associados e ex-secretário de Política Econômica. Ou seja: trata-se de uma profecia, tão-somente, condenável. Nada além disso.

Mas o fato é que a onda de tensão obrigou os dois principais timoneiros da política econômica a assumir, novamente, o papel de bombeiros. Na terça-feira 25, o ministro Pedro Malan foi ao Senado para tratar da crise. ?Só quem não conhece Brasil e Nigéria é capaz de comparar as duas economias.? Malan explicou aos senadores como é calculado o índice de risco País. É um resultado da cotação dos papéis da dívida externa, os C-Bonds no caso brasileiro. Quando os papéis caem no mercado, como agora, diante de incertezas eleitorais, o risco sobe, mesmo que nada mude na economia real. ?Isso deveria se chamar índice de desvalorização dos títulos da dívida, só isso?, disse Malan.

Na outra ponta, Armínio Fraga embarcou para a Europa para ter contatos pessoais com investidores, olho no olho, em Londres e Paris. No Brasil, sua equipe também desferiu duros golpes contra os especuladores. O Banco Central aumentou o recolhimento compulsório feito pelos bancos nas cadernetas de poupança de 15% para 20% e, em seguida, elevou a taxa sobre depósitos a prazo de 10% para 15%. Com isso, retirou de circulação R$ 12 bilhões, até então disponíveis para movimentos especulativos. Na quinta-feira 17, a reunião do Conselho Monetário Nacional terminava com o anúncio da ampliação da margem de variação da meta de inflação para dois e meio pontos porcentuais, acoplada à elevação para 4% da inflação prevista para 2003. Num dos pólos do Brasil real, a Federação das Indústrias de São Paulo, ouviram-se aplausos. ?É, claramente, uma manobra para possibilitar uma redução nas taxas de juros em breve?, disse à DINHEIRO a diretora do Departamento de Pesquisa e Economia, Clarice Messer. ?As medidas adotadas pelas autoridades durante esta fase de turbulência cambial têm sido acertadas. Neste rumo, o Brasil tem todas as condições para dar a volta por cima e retomar o crescimento.?

Mesmo na arena internacional, o Brasil colheu elogios. Tanto representantes do Fundo Monetário quanto do Banco Mundial saíram a campo para dizer que a crise financeira não tem qualquer relação com os fundamentos econômicos. O FMI chegou até a divulgar uma nota em apoio ao Brasil e às demonstrações emitidas pelo PT, que se comprometeu com a estabilidade monetária e fiscal numa carta dirigida ao País. Em Kananaskis, no Canadá, onde acontece a reunião do G-7, os países mais ricos do mundo, os sinais dos líderes mundiais vieram nas mesma direção. A única exceção coube ao fanfarrão George Soros. O megaespeculador disse textualmente que o mundo correrá grandes riscos, se não preparar um grande plano de ajuda internacional de ajuda ao Brasil. Ele só se esqueceu de que o Brasil, com US$ 43 bilhões em reservas para honrar pagamentos externos e R$ 52 bilhões em caixa para administrar a dívida interna, não precisa de ajuda alguma. Só precisa do silêncio de profetas que falam e agem em causa própria.